3 de setembro de 2010

Os contrastes entre o desenvolvimento e o subdesenvolvimento na Índia



"Uma característica marcante da ciência indiana é a concentração da atividade científica em institutos especializados, e não nas universidades"

Wanderley de Souza é professor titular da UFRJ e diretor de Programas do Inmetro, ex-secretário Executivo do MCT e ex-secretário de Estado de Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro. Artigo publicado no "Monitor Mercantil":

Nada melhor do que visitar a Índia com certa frequência e participar das atividades de Ciência e Tecnologia em suas instituições para se ter uma melhor ideia do processo de desenvolvimento pelo qual passa o país.

Antes de tudo, é importante assinalar a maneira carinhosa com que o indiano trata os brasileiros. Os mais cultos procuram sempre lembrar os laços históricos que nos ligam, sobretudo a partir da cidade de Goa. Bastar visitar uma loja de frutas em Bangalore e encontrar a fruta de conde, caju, jaca, manga, banana, entre outras, para lembrar as aulas de história que falavam "do caminho das Índias". O mesmo se aplica a dezenas de flores.

Por tudo isto, apesar da diferença linguística significativa, é fácil se comunicar com os indianos. Mesmo após várias semanas do final da Copa ainda é possível verificar a presença de bandeiras do Brasil em casas e em carros que circulam pelas cidades indianas. Por tudo isto, é mais do que acertada a decisão do Ministério de Ciência e Tecnologia do Brasil em priorizar as relações científicas entre os dois países.

É sempre bom lembrar alguns dados para deixar mais claro o interesse estratégico que devemos ter em relação à Índia. Com um PIB da ordem de US$ 785 bilhões e crescendo em torno de 7,4% ao ano, ocupa a posição de 12ª economia mundial. É o sétimo país em área geográfica, o segundo em população (atualmente de 1,1 bilhão de habitantes, mas crescendo e com projeção de ultrapassar a China em 2020), é o quarto em poder de compra.

Áreas de grande riqueza convivem lado a lado com áreas de grande pobreza, o que assusta alguns acostumados com separações geográficas mais nítidas em outros países. O tráfego confuso, onde predomina o barulho das buzinas e a convivência pacífica nas ruas de automóveis, carroças, bicicletas, tuk-tuk, riquixás, vacas e até camelos, caracteriza uma cidade indiana.

O sistema científico indiano é responsável pela publicação de cerca de 3,2% de todos os trabalhos científicos publicados em revistas científicas internacionais, ocupando a décima posição no mundo (cabe lembrar que o Brasil ocupa hoje a 13ª posição).

A ciência indiana tem grande tradição e vários dos seus pesquisadores gozam de grande prestígio internacional. Menciono apenas Chandrassekhara Raman, que mostrou que a energia de um fóton pode sofrer transformação parcial quando interage com a matéria, e que foi agraciado com o Prêmio Nobel de Física de 1930.

Cabe lembrar que a independência da Índia ocorreu apenas em 1947. Jawaharlai Nehru, que governou o país entre 1947 e 1964, deu grande impulso à atividade científica, criando várias instituições responsáveis pela formação de milhares de pesquisadores de excelente qualidade.

Mais recentemente, o primeiro-ministro Manmohan Singh vem ampliando significativamente o apoio à atividade científica e os recursos para esta área devem passar de 1% para 2% do PIB em três anos.

Um amplo programa que conta com cerca de um 1,6 milhão de bolsas está sendo implementado em diferentes níveis para estimular a juventude indiana a se interessar pela atividade científica.

A participação do eminente e ativo químico indiano C.N. Rao como presidente do Comitê Assessor de Ciência e Tecnologia do primeiro-ministro é a garantia de um crescimento da atividade de C&T indiana com foco nas principais áreas da ciência contemporânea e vinculação direta com o desenvolvimento econômico e social do país.

Uma característica marcante da ciência indiana é a concentração da atividade científica em institutos especializados, e não nas universidades. Mudar este perfil é fundamental para um crescimento mais rápido, já que a universidade é o local mais dinâmico no processo de formação de recursos humanos qualificados.

(Monitor Mercantil, 25/8)

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