5 de maio de 2011

Por que na escola? Violencias nas escolas


05 de maio de 2011
  O Globo | Opinião | BR

MARCELO BAUMANN BURGOS Por que no templo sagrado da República? Esta pergunta não pode ser contornada. Quando um ato de loucura com essas proporções procura o espaço público para se manifestar não pode deixar de ser tomado como uma denúncia, e seu significado precisa ser decifrado. O assassinato premeditado de estudantes na sala de aula da escola de Realengo coloca em cena, inevitavelmente, a fragilidade institucional da escola pública. Não que ela explique a barbárie, mas existem nexos entre a situação institucional da escola e a dramatização contida no gesto insano do assassino que precisam ser estabelecidos. Afinal, por que na escola?
Ironicamente, a escola talvez tenha sido a única instituição secundária na vida do assassino. Duplo sinal, de presença e ausência: a escola é central para o mundo popular de uma sociedade que só recentemente conseguiu universalizar o acesso ao ensino fundamental, e que tem combatido a entrada precoce no mundo do trabalho - lugar que historicamente desempenhava a tarefa de introduzir as crianças das classes populares na vida adulta; mas essa centralidade da escola só faz acentuar a percepção da sua fragilidade.
Para muitas famílias, a escola é quase tudo, afirmando-se, cada vez mais, como passagem obrigatória para a mobilidade e para a inclusão social de seus filhos. A escola está no centro dos desejos, das expectativas e dos sonhos das grandes massas. Mas a força da escola em nosso projeto de sociedade é incompatível com sua fraqueza.
De um modo geral, sua situação administrativa - não apenas no Rio de Janeiro - é muito precária. A proporção entre crianças e adultos é inaceitável: escolas com mais de mil alunos têm, se tanto, três ou quatro profissionais responsáveis pela gestão, e dois ou três funcionários de apoio.
Há mais de cinco anos tenho pesquisado escolas públicas, e em 2010 coordenei um estudo com pais de alunos. Com base nessa experiência, posso afirmar que a escola pública é hoje um espaço atravessado por conflitos e sentimentos que frustram os projetos pessoais e as melhores expectativas de seus profissionais, de seus alunos e de suas famílias. Não seria exagero afirmar que poucos ambientes institucionais são tão difíceis como a escola pública.
Apesar disso, a rotina escolar é invisível. O rumor de seu cotidiano permanece no interior dos muros.
Nada disso explica a loucura do assassino, mas há algo nela que denuncia o descompasso entre o que a escola pública promete e o que ela efetivamente cumpre. Assim, para além do esforço que se vem fazendo para melhorar o desempenho escolar, com novas estratégias curriculares e a rotinização da avaliação, é urgente incorporar o problema da qualidade do ambiente escolar ao centro da agenda das reformas educacionais.
MARCELO BAUMANN BURGOS é sociólogo e professor da PUC-Rio.

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