Alguém interessado no desenvolvimento das artes no Brasil certamente se espantará com o fato de não existir um grande compositor nacional.
Por mais que nossa ideologia cultural diga que somos um povo naturalmente musical, que, para nós, a música brota do solo, acolhida pelo ritmo manso de um gozo solar, é difícil esconder o fato de nunca termos produzido um compositor fundamental para a história da música.
Nosso maior compositor do século 20, Heitor Villa-Lobos não era capaz de esconder seu autodidatismo diletante. Se algumas de suas peças de câmara, como os quartetos de corda, são de inegável qualidade, suas peças orquestrais são deficientes.
Não é difícil identificar limitações nos usos de timbres, jogos de intensidade não muito felizes e problemas de orquestração. Uma comparação com Béla Bartok, outro compositor de sua época também marcado por pesquisas folclóricas e nacionais, demonstra, inclusive, seu conservadorismo formal.
Alguns podem julgar despropositado o uso de expressões como "compositor fundamental para a história da música", como se toda tentativa de descrever a racionalidade do desenvolvimento histórico da linguagem musical fosse uma maneira totalitária de impor um cânone tão útil quanto qualquer lista de compras.
Dificilmente, porém, acharemos alguém capaz de afirmar que, por exemplo, Glinka ou Elgar são tão fundamentais para o desenvolvimento da música quanto Wagner ou Debussy.
Se não se pode falar qualquer coisa sobre a história da música, é porque a avaliação do desenvolvimento formal das obras e de sua força crítica em relação às limitações de convenções que se naturalizaram não é simplesmente arbitrária. Ela é fruto da lógica imanente à linguagem musical e suas figuras.
Neste sentido, pode-se dizer que a música brasileira talvez seja vítima da incapacidade em produzir rupturas formais inovadoras por não saber como superar os limites de uma ideologia cultural que vê, na música, a expressão de uma sensibilidade marcada pela proximidade privilegiada com o originário. Ideologia da promessa de uma reconciliação em que tensões e conflitos formais sempre serão anulados por uma harmonia redentora que ignora os problemas postos pelo passado.
Não deixa de ser interessante notar que, ao falarmos de música, tudo se passa como se fôssemos obrigados a descrever as limitações de autocompreensão da própria sociedade brasileira, como se a produção cultural andasse no descompasso da vida social.
E como se estivéssemos à espera do momento no qual, ao contrário, nossa música forneça a imagem avançada daquilo que a sociedade teima em não querer pensar.
Ué, mas que citérios estão sendo usados para definir "relevância"? E como uma colônia que teve sua história de exploração dos seus recursos naturais e humanos poderia produzir, nos termos da Europa, algo "relevante"? Por último, que especialista está sendo consultado para que determine a desqualificação sistemática (mas não justificada) de um compositor como Villa-Lobos, do qual estão sendo reconsideradas tantas opiniões aceitas? Seu auto-didatismo, por exemplo, não se sustenta, sabe-se hoje que ele recebeu sólida formação no conservatório do RJ. Enfim, gostaria de saber em que se baseia a opinião do filósofo, por que dito assim o texto parece um eco do preconceito euro-centrista... Abraço, Luciano Morais
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