30 de dezembro de 2011 Mapa da Violência | Correio Braziliense | Opinião | BR Professor e pesquisador do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ O que aconteceu em 2011 no mundo do crime, da violência, da prevenção e da repressão? Há algo de novo na segurança pública? Há. Depois de décadas de relativa estabilidade na ordem das regiões do país nas taxas de homicídio, sendo o Sudeste a mais violenta e o Nordeste e o Norte as menos violentas, há alguns anos foi iniciado duplo processo em direções opostas: descenso no Sudeste e crescimento no Norte e no Nordeste. O ano passado cimentou as tendências. Hoje poucos duvidam das mudanças. Em 2000, a taxa de homicídios por 100 mil era 30 no Sudeste, 21 no Nordeste e 20 no Norte. Na última década, observamos uma explosão de violência no Nordeste e no Norte. Alagoas passou ser o estado mais violento do país; o Pará passou de 21º para 3º; a Paraíba, de 20º para 6º; a Bahia, de 23º para o nada invejável 7º lugar entre os estados brasileiros. É possível contrariar essa tendência e Pernambuco o fez. Do lado virtuoso, São Paulo foi o estado pioneiro, o primeiro a conseguir reduções nas taxas de homicídio, que duraram muitos anos. As primeiras políticas públicas inteligentes foram tomadas ainda no governo de Mario Covas, em 1999. Essas medidas permitiram mudanças posteriores nas taxas que, primeiro, pararam de crescer e, depois, decresceram de forma acelerada a partir de 2001. O movimento não foi estritamente linear: houve zigue-zagues, mas a tendência era clara. Na capital, a redução foi sensacional, de 65 em 2000 para 13 em 2010. Minas Gerais foi protagonista de mudanças. Era um dos estados menos violentos do país, mas suas taxas de homicídios e de crimes violentos aumentaram aceleradamente e, em 2002, já figurava na metade mais violenta. Monteiro de Castro, Alves da Silva, Assunção e Beato mostraram que a taxa decresceu de 1980 até 1988, em níveis baixos (8,7 para 6,7), aumentando moderadamente até 1994 e rapidamente a partir daí. Na Região Metropolitana de Belo Horizonte, os homicídios explodiram entre 1994 e 2002, e a taxa mais do que triplicou (11,5 para 39,4). Em 2003 entraram em ação políticas inteligentes e, inicialmente, pararam de crescer e, depois, começaram a cair. Entre 2004 e 2010, segundo o Mapa da Violência 2012, houve redução de 20% nas taxas de homicídio. Uma diminuição sólida mas modesta, que não foi, apenas, o reflexo de uma tendência nacional, pois a redução no Brasil como um todo foi de perto de 3%. O Rio de Janeiro também teve zigue-zagues. Na capital, houve queda de 56,5 em 2000 para 24,3 em 2010. Não obstante, a taxa da cidade como um todo é ficção: há bairros e outras subdivisões da cidade, com taxas muito maiores do que outras. Essa desigualdade interna não é fenômeno recente. Em 1994, o centro da cidade teve taxa de homicídios superior a 160 por 100 mil habitantes, mais de cinco vezes a da Zona Sul e Tijuca. Na década de 2000-2010, o Rio de Janeiro registrou queda na taxa de homicídios de 43%, segundo o Mapa da Violência. Em 2011, a redução nos homicídios parece ter continuado: de janeiro a setembro, houve 297 homicídios dolosos e 37 latrocínios a menos. A mudança na distribuição espacial dos homicídios entre as regiões era questionada há poucos anos a despeito da apresentação de dados obtidos e elaborados de maneira independente por José Maria Nóbrega e por mim. A suspeita de que a redução das taxas no Sudeste e o seu crescimento no Norte e no Nordeste fossem fenômenos passageiros, de um ou dois anos, foi abandonada devido ao fato de que dura vários anos. Outro ponto de destaque em 2011 foi a reabertura de importante questão metodológica referentes às mortes violentas com causalidade indeterminada (ou desconhecida). Esses erros resultam do descaso e da incompetência de policiais em preencher os boletins de ocorrências, com o descuido conivente dos legistas. Trata-se de fenômeno típico dos países em que a polícia ainda é rudimentar. Essas mortes diferem do total de mortes em vários aspectos. Muitos procuraram estimá-las. Uma proposta foi subdividi-las de acordo com a mesma distribuição das conhecidas, que foi seguida por mim e melhorada por Cano e Santos, Cano e Borges, entre outros. Porém, em 2011, Daniel Cerqueira recebeu o prêmio dado à melhor tese de doutorado em economia, no Brasil, no ano, concedido pela Associação de Pós-Graduação em Economia. A tese de Cerqueira é sobre as mortes com intencionalidade desconhecida, sendo claro avanço sobre as estimativas anteriores porque se baseia nos fatores associados com os homicídios, usando o conhecimento sobre os dados conhecidos para estimar os desconhecidos. As mortes tinham duas características: 1) decresceram depois da ditadura militar e 2) o Rio de Janeiro tinha um número desproporcionalmente alto delas. O preocupante, como mostra Cerqueira, é que esse número, que havia decrescido muito no Rio de Janeiro, voltou a subir nos últimos anos, o que implica redução nos avanços contra os homicídios durante esses anos. Em 2011 e anos recentes, pesquisadores mostraram que a realidade mudou e continua a mudar. Parodiando Weber, a criminologia tem o dom da eterna juventude porque, quando se termina de pesquisar uma realidade, ela já mudou. |
Nenhum comentário:
Postar um comentário