21 de junho de 2012

O boletim de notas no Rio, artigo de Jeffrey D. Sachs




 
Jeffrey D. Sachs é professor de economia e diretor do Instituto Terra, da Columbia University e assessor especial do secretário-geral das Nações Unidas no tema das Metas de Desenvolvimento do Milênio. Artigo publicado no Valor Econômico de hoje (21).

A "Nature", uma das publicações científicas de maior destaque do mundo, acaba de lançar um vergonhoso boletim de notas sobre desenvolvimento sustentável, em antecipação ao encontro de cúpula Rio+20 de desenvolvimento sustentável. O grau de adoção dos três principais tratados assinados na primeira Cúpula da Terra no Rio de Janeiro, que ficou conhecida como Eco-92, recebeu as seguintes avaliações: Mudanças Climáticas - nota "F"; Diversidade Biológica - nota "F"; e Combate à Desertificação - nota "F". Será que a humanidade ainda pode evitar ser "expulsa" da sala?

Sabemos há pelo menos uma geração que o mundo precisa corrigir seu rumo. Em vez de alimentar a economia mundial com combustíveis fósseis, precisamos fazer um uso muito maior de alternativas de baixa emissão de gás carbônico, como as energias eólica, solar e geotérmica. Em vez de caçar, pescar e desmatar terras sem preocupação com o impacto sobre outras espécies, precisamos controlar o corte de árvores e nossa produção agrícola e pesqueira em conformidade com a capacidade de nosso ambiente. Em vez de deixar as pessoas mais vulneráveis do mundo sem acesso a planejamento familiar, educação e assistência médica básica, precisamos acabar com a pobreza extrema e reduzir os elevados índices de fertilidade que ainda existem nas partes mais pobres do mundo.

Em resumo, precisamos admitir que nossa capacidade coletiva de destruição dos sistemas de suporte à vida no planeta chega a níveis sem precedentes com as atuais 7 bilhões de pessoas e as 9 bilhões, projetadas para a metade do século, todas interconectadas em uma economia mundial de alta tecnologia e alto consumo de energia. As consequências de nossas ações individuais, no entanto, ficam tão afastadas de nossa consciência diária que podemos estar nos dirigindo à beira do penhasco sem mesmo saber disso.

Por todo o mundo cresce o clamor para que o desenvolvimento sustentável fique no centro da mentalidade e das ações mundiais, para ajudar as pessoas a solucionar o desafio: bem-estar econômico, ambiente sustentável e inclusão social - que vai definir sua era.

Quando ligamos nossos computadores ou acendemos as luzes, estamos alheios às emissões de gás carbônico resultantes dessas ações. Quando comemos nossas refeições, estamos alheios ao desmatamento resultante da agricultura insustentável. E quando bilhões de nossas ações combinam-se para criar fome e enchentes do outro lado do mundo, afetando as populações mais pobres em países propensos à seca como Mali ou Quênia, somos poucos os que têm mesmo uma ligeira noção das perigosas armadilhas das interconexões mundiais.

Há 20 anos o mundo tentou enfrentar essas realidades por meio de tratados e da lei internacional. Os acordos que emergiram em 1992 no primeiro encontro no Rio eram bons: ponderados, previdentes e concentrados nas prioridades mundiais. Ainda assim, não nos salvaram.

Esses tratados ficaram nas sombras de nossas políticas, de nossa imaginação e dos ciclos dos meios de comunicação no dia a dia. Ano após ano, diplomatas convergiram aos trancos para conferências tentando colocar esses acordos em vigor, mas os principais resultados foram negligência, atrasos e bate-bocas por detalhes legais. Passados 20 anos, o que temos para mostrar são apenas três notas "vermelhas".

Há alguma maneira diferente de agir? O caminho da lei internacional envolve advogados e diplomatas, mas não engenheiros, cientistas e líderes comunitários que estão nas linhas de frente do desenvolvimento sustentável. É um caminho repleto de informações técnicas, conhecidas por poucos, sobre monitoração, compromissos obrigatórios, países do anexo-I e países fora do anexo-I e milhares de outros legalismos. Um caminho que não conseguiu dar à humanidade uma linguagem para discutir nossa própria sobrevivência.

Temos milhares de documentos, mas somos incapazes de nos comunicar abertamente uns com os outros. Queremos salvar a nós mesmos e a nossas crianças? Então, por que não o dizemos?

Na Rio+20, temos de dizê-lo, de uma forma clara e decisiva, de uma forma que resulte em ações e na resolução de problemas, e não em brigas ou atitudes defensivas. Como os políticos seguem a opinião pública em vez de liderá-la, é preciso que o público exija sua própria sobrevivência, e não as autoridades eleitas, que supostamente deveriam nos salvar de alguma forma, apesar de nós mesmos. Há poucos heróis na política; esperar pelos políticos seria esperar demais.

O resultado mais importante no Rio, portanto, não será um novo tratado, cláusulas obrigatórias ou compromissos políticos. Será uma convocação global por ações. Por todo o mundo, cresce o clamor para que se coloque o desenvolvimento sustentável no centro da mentalidade e das ações mundiais, especialmente para ajudar as pessoas mais jovens a solucionar o desafio triplo - bem-estar econômico, sustentabilidade ambiental e inclusão social - que vai definir sua era. A Rio+20 pode ajudá-los a fazer isso.

Em vez de um novo tratado, adotemos na Rio+20 um conjunto de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que inspirem as ações de uma geração. Assim como os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio abriram nossos olhos para a pobreza extrema e promoveram ações mundiais sem precedentes para combater a aids, tuberculose e malária, os ODS podem abrir os olhos da atual juventude para as mudanças climáticas, perda de biodiversidade e desastres da desertificação. Ainda podemos salvar os três tratados do Rio, colocando as pessoas na dianteira dos esforços.

Os ODS para acabar com a pobreza extrema; descarbonizar o sistema de energia; desacelerar o crescimento populacional; promover o fornecimento de alimentos sustentáveis; proteger oceanos, florestas e terras secas; e reparar as desigualdades de nossa era podem estimular uma resolução de problemas que valerá gerações. Magos da engenharia e tecnologia por todo o mundo, do Vale do Silício a São Paulo, de Bangalore a Xangai, têm ideias em suas mangas para salvar o mundo.

Universidades por todo o mundo são lar de legiões de estudantes e professores empenhadas em solucionar problemas práticos em suas comunidades e países. As empresas, pelo menos a boas, sabem que não podem prosperar e motivar seus funcionários e consumidores a menos que façam parte da solução.

O mundo está pronto para agir. A Rio+20 pode ajudar a desencadear uma geração de ações. Ainda há tempo, muito pouco, para transformar as notas "Fs" em "As" e para a humanidade conseguir passar em seu exame definitivo.

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