Seguindo a tendência mundial, o Brasil tem passado por um processo meteórico de expansão do ensino superior. Mas a crescente universalização tem um efeito colateral grave: a queda da qualidade, de acordo com Liz Reisberg, do Boston College (Estados Unidos). Segundo Reisberg, nesse contexto, a formação de professores qualificados passa a ser a prioridade número um para países como o Brasil.
Pesquisadora do Centro para Educação Superior Internacional (CIHE, na sigla em inglês) do Boston College, Reisberg é considerada uma das principais especialistas em questões relacionadas à internacionalização, acesso, equidade e qualidade e na reforma do ensino superior na América Latina. Sua experiência no continente teve início durante o doutorado, sobre novas estratégias para aprimorar a qualidade do ensino superior na Argentina.
Consultora de diversas universidades, governos e agências internacionais, Reisberg foi coautora do relatório Tendências Globais da Educação Superior: rastreando uma revolução acadêmica, publicado em 2009 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Entre os dias 18 e 21 de julho, Reisberg participou da organização e das atividades da 1ª Escola Zeferino Vaz de Educação Superior (eZVes), realizada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O evento reuniu dirigentes do ensino superior e alguns dos principais especialistas do mundo na área, com a finalidade de analisar e debater as tendências e desafios desse setor educacional. Confira a entrevista publicada na Agência Fapesp.
Agência Fapesp - O que caracteriza de forma mais marcante as tendências globais do ensino superior?
Liz Reisberg - À medida que passamos de uma sociedade de trabalhos manuais para uma sociedade tecnológica, o ensino superior ganhou mais importância e mais responsabilidade em relação à inovação e ao desenvolvimento econômico. Aumentou muito a mobilidade de estudantes e pesquisadores e a cooperação internacional entre as instituições. Mas talvez a característica mais marcante dessas mudanças, especialmente na última década, seja uma tendência à expansão e universalização do ensino superior. Países como Brasil, Índia e China estão no centro das atenções, porque são sociedades que se modernizaram e ganharam muita importância na economia internacional, gerando uma demanda muito grande de mão de obra qualificada. O ensino superior nesses países se tornou uma prioridade urgente e a expansão das universidades nesses lugares tem sido imensa, especialmente no Brasil. Só que essa expansão gerou também um grande problema: inserir mais gente no ensino superior tem um impacto importante nos custos e na qualidade desse ensino.
É possível conciliar expansão e qualidade?
Liz Reisberg - É muito difícil. Acesso, custo e qualidade são fatores estreitamente correlacionados, não se pode alterar um deles sem ocorrer impactos sobre os outros. É preciso encontrar um equilíbrio, mas isso não tem acontecido. Brasil, Índia e China expandiram muito rapidamente e a qualidade caiu demais. É muito fácil controlar o equilíbrio entre expansão, custo e qualidade quando só se tem 5% ou 6% da população com idade universitária inserida no sistema de ensino superior. Mas quando se está na situação de grande parte dos países hoje, com 40% ou 50% dos jovens nas universidades, a dificuldade para encontrar esse equilíbrio se torna um pesadelo. No Brasil o que se tem feito é expandir, em primeiro lugar, enquanto a preocupação com a qualidade vem a reboque.
Esse impacto da expansão na qualidade se deu tanto no campo do ensino como no campo da pesquisa?
Liz Reisberg - Estou me referindo ao lado educacional. A pesquisa está restrita a um número muito pequeno de instituições. Apesar da enorme expansão universitária, o Brasil provavelmente não aumentou seu número de pesquisadores no mesmo ritmo. O país tem um grupo de elite produzindo pesquisa de classe mundial, um grupo concentrado, e muito poucas universidades. Mas não acho que a qualidade da pesquisa está afetada pela expansão. O país precisa ainda aumentar o número de pesquisadores.
Por que a expansão exerce tanto impacto negativo na qualidade do ensino? Há falta de professores?
Liz Reisberg - É muito mais fácil expandir o número de estudantes que aumentar o número de professores qualificados. Para produzir um professor novo, é preciso pelo menos seis anos, normalmente oito anos, às vezes dez anos. É um processo muito longo. Podemos aumentar muito o número de estudantes em um ano, com uma decisão política. Acho que por trás do problema da qualidade - em particular no Brasil, China e Índia - temos um lapso entre o número crescente de estudantes e o número de professores qualificados. É um imenso desafio. Vejo o programa Ciência Sem Fronteiras como uma tentativa de aumentar o número de professores qualificados, mas é preciso mais. A China está fazendo algo semelhante, mas não na mesma escala, o que é surpreendente, porque eles precisam ainda mais de professores qualificados.
O que poderia ser modificado na maneira como são formados os professores?
Liz Reisberg - Acho que há algumas soluções criativas que o Brasil não está aproveitando. Uma delas é abrir mais espaço para professores que tenham apenas o mestrado, mas não doutorado, formando equipes com apenas um professor doutor, que trabalharia como mentor. Esse professor sênior poderia, ao mesmo tempo, dirigir e avaliar a atuação dos outros docentes em sua atividade de ensino e ajudá-los a capacitá-los como pesquisadores. Até onde sei, o Brasil não está usando esse recurso. Além de enviar gente para fora do país ou para programas de doutoramento, é importante investir na capacitação dos professores que já têm mestrado, usando a qualificação dos professores doutores como guia.
É possível elevar a qualidade do ensino ao nível da pesquisa feita no Brasil?
Liz Reisberg - Sim, contanto que as prioridades sejam repensadas. Todo sistema de ensino superior tem pesquisadores, mas não é correto pensar que todos os professores precisam ser excelentes pesquisadores. Eles precisam ter boas habilidades de pesquisa apenas para transmitir essas habilidades aos alunos, mas não é todo professor que precisa necessariamente fazer pesquisa importante. O que precisamos é ter bons professores. Ter bons professores é mais importante que ter bons pesquisadores.
Por quê?
Liz Reisberg - Um dos problemas que discutimos no workshop na Unicamp foi que a maior parte das pessoas que vão à universidade, no Brasil, está apenas em busca de inserção em uma carreira profissional. Formam-se muito mais profissionais do que pesquisadores. Esses estudantes precisam de ensino de excelência. Só que no Brasil o sistema recompensa apenas os bons pesquisadores, mas não recompensa nem incentiva os bons professores. Na maior parte dos países ocorre o mesmo: os docentes são avaliados pela quantidade de pesquisa que produzem. Esquecem que a maior parte dos alunos precisa exatamente de excelência no ensino. Repito: nem todos os professores precisam ser ótimos pesquisadores. É preciso dar mais ênfase em cultivar a excelência no ensino. Esse é um novo movimento no mundo, uma tendência.
Para estimular a excelência do ensino, então, é preciso repensar todo o sistema de ensino superior?
Liz Reisberg - Não necessariamente. Muita coisa pode ser feita isoladamente. Por exemplo, durante o workshop em Campinas, o professor Peter Dourmashkin falou sobre a experiência de ensinar Física no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). Eles perceberam que muitos estudantes no primeiro ano fracassaram, ou simplesmente desistiram da carreira, alegando dificuldades. Peter e seus colegas descobriram que o problema não era que a física era muito difícil, mas que estava sendo mal ensinada. Tiveram que mudar completamente a maneira de ensinar e obtiveram sucesso. Tratava-se de uma situação pela qual todos já passamos: temos um excelente pesquisador ensinando ciência, mas talvez ele seja um péssimo professor. Isso desilude muitos estudantes. No MIT, uma das principais instituições científicas do mundo, eles admitiram: não estamos fazendo um bom trabalho de ensino. Ensinar, para mim, é de maneira geral uma atividade criticamente subvalorizada nas universidades, mas reconhecer o problema já é um grande passo.
A senhora disse que nem todo professor precisa ser um grande pesquisador. Todas as boas universidades precisam se dedicar à pesquisa?
Liz Reisberg - Precisamos parar de pensar que todas as universidades se tornem instituições de excelência em pesquisa e começar a pensar em um sistema de classe mundial. Precisamos desenhar sistemas nacionais para abordar uma gama mais ampla de necessidades para a educação superior. Nem é preciso que o Brasil invista só em universidades. Seria importante investir também em um nível universitário mais técnico, de curto prazo. No Brasil, acho, há um grande lapso entre a escola secundária e a universidade. Se tivéssemos mais desses programas, talvez fosse possível atenuar essa lacuna e dar a esses jovens as habilidades que eles não tiveram na escola secundária.
Qual sua opinião sobre o vestibular como sistema de acesso à universidade?
Liz Reisberg - É problemático, mas não conheço nenhum país que resolveu isso. O Enem poderia ser uma solução interessante, mas o problema é que acaba privilegiando os estudantes de escolas privadas, que têm melhor qualidade. É um padrão de qualidade interessante para selecionar os alunos, mas gera um problema de equidade. A China tem um exame nacional com foco no mérito, o que resolve o problema da equidade. Mas a competição é tão acirrada e o estresse é tão grande - os candidatos chegam a estudar 13 horas por dia - que o fracasso muitas vezes leva ao suicídio. Não acho que seja uma boa ideia. É justo em relação ao mérito, mas destrói a saúde mental das pessoas. É realmente muito difícil pensar em uma alternativa. Gosto muito do que a Unicamp está fazendo como o ProFis [Programa de Formação Interdisciplinar Superior].
Por que a senhora admira o ProFis?
Liz Reisberg - Trata-se de um curso piloto voltado para estudantes que cursaram o ensino médio em escolas públicas de Campinas. Os estudantes são selecionados pelas notas do Enem e recebem uma visão integrada das várias áreas, por dois anos. Os que obtêm sucesso podem ingressar na Unicamp sem vestibular. É um experimento muito interessante. É uma maneira de diminuir a lacuna entre a escola secundária e a universidade também. Acho que não é perfeito, mas dá mais acesso à oportunidade de entrar uma universidade de qualidade. É uma alternativa muito inovadora que não requer diminuição da qualidade.
A privatização, a terceirização, a cobrança de taxas e mensalidades em universidades públicas foram consideradas pelo relatório da Unesco como tendências. No Brasil há grande resistência a isso. Qual sua opinião sobre essa tensão?
Liz Reisberg - É uma questão internacional e ninguém tem uma resposta ideal para isso também. Achamos que, em longo prazo, ter um bom sistema de educação superior gratuito não é algo sustentável. É inviável manter esse sistema para sempre, especialmente com a expansão. No Brasil, há uma forte cultura contrária à cobrança. A gratuidade é vista como um direito que não pode ser retirado. Mas não se trata, nesse caso, de um dogma neoliberal: é uma concepção equivocada afirmar que a universidade tem que ser gratuita, pelo simples fato de que nada é gratuito. A questão é quem está pagando. A ideia da gratuidade é uma armadilha. Adoraria que a educação fosse gratuita, mas isso é insustentável do ponto de vista econômico.
Dos sistemas existentes, qual poderia ser apontado como modelo?
Liz Reisberg - Como eu disse, nenhum é ideal. Mas a Austrália tem um sistema do qual eu gosto muito. Os estudantes são bastante subsidiados, mas pagam algo de acordo com a renda familiar. Ou podem conseguir um empréstimo e pagar de volta. Mas, diferentemente dos Estados Unidos - onde todos precisam ressarcir o investimento no final, com juros -, na Austrália o pagamento é mensal e nunca pode superar 4% da renda do indivíduo.
As universidades têm buscado a internacionalização. Há algo que pode ser feito para potencializar esse esforço?
Liz Reisberg - Reconheceu-se que é impossível hoje viver em um universo restrito ao local e aumentaram muito as cooperações internacionais e intercâmbio de estudantes e pesquisadores. Uma tendência, a partir de agora, é investir em experiências internacionais de período mais curto. Desenvolver programas que possibilitem participações rápidas em programas no exterior. Pode ser por duas semanas, ou um mês, durante as férias. Para um estudante norte-americano, por exemplo, há uma grande diferença entre estudar antropologia em um livro e passar duas semanas no meio da floresta peruana. É algo que tem um custo, mas não se compara ao dos programas mais longos. Acho que o Brasil poderia investir mais nessa dimensão da internacionalização.
Com as novas tecnologias o acesso à informação ficou muito fácil e isso poderia abrir espaço para uma mudança no conteúdo do que é ensinado na universidade. Essa mudança está ocorrendo?
Liz Reisberg - Começa a ocorrer, mas está ainda muito longe do que seria satisfatório. No Brasil, me parece que há uma ênfase grande demais no conteúdo. O professor quer passar tudo o que sabe sobre física, psicologia, matemática. É o modelo que fazia sentido há 100 anos. O professor passava, na classe, essa informação que não podia ser conseguida em outro lugar. Agora, podemos encontrá-la no Google. As pessoas andam com seus computadores no bolso. Por que gastar horas de aula com esse tipo de informação? Seria melhor dedicar esse tempo ao aprimoramento do espírito crítico, à análise, incentivar criatividade, pensamento, colaboração. Dependendo da área, calcula-se que pelo menos 20% do que você aprende na graduação já está obsoleto quando você chega à pós-graduação. Falamos muito nisso no seminário e aparentemente esse movimento já começou no Brasil.
Sobre a questão da avaliação da pesquisa na universidade: como encontrar o equilíbrio entre a quantidade de publicações e a qualidade?
Liz Reisberg - Há uma grande pressão por publicar em alguns países, incluindo o Brasil. Se só recompensamos as pessoas pelo número de artigos publicados, estamos estimulando a pesquisa de baixa qualidade e até mesmo estimulando a fraude dos periódicos que aceitam pagamento para publicar. Trata-se de uma perversão do sistema, semelhante à questão do equilíbrio entre ser bom pesquisador e ser bom professor. Precisamos nos preocupar em que atitude o sistema está recompensando e como essa escolha influencia a qualidade.
Para melhorar a qualidade da pesquisa é preciso criar bons mecanismos de avaliação. Como fazer isso?
Liz Reisberg - Se eu tivesse essa resposta, sem dúvida ganharia o prêmio Nobel.
(Agência Fapesp)
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31 de julho de 2012
Com expansão, formação de professores é prioridade para universidades , Liz Reisberg
Não é só crise de confiança, é a sobrevivência em jogo - JOSEPH E. STIGLITZ
de conteudo livre
Como um condenado no corredor da morte, o euro teve novamente sua execução adiada no último minuto
Como um condenado no corredor da morte, o euro teve novamente sua execução adiada no último minuto. Sobreviverá um pouco mais. Os mercados estão celebrando, como fizeram após cada uma das quatro reuniões de cúpula anteriores dedicadas à eurocrise — até compreender que os problemas fundamentaisainda têm de ser enfrentados.
Houve boas notícias na última: os líderes europeus finalmente entenderam que a operação pela qual a Europa empresta aos bancos para salvar os Estados, e aos Estados para salvar os bancos, não funcionará. Da mesma forma, eles agora reconhecem que os fundos para resgate que dão ao novo emprestador prioridade sobre os demais credores pioram a posição dos investidores privados, que simplesmente demandarão taxas de juros ainda mais elevadas.
É profundamente perturbador que tenha levado tanto tempo para os líderes europeus verem algo tão óbvio (e evidente mais de uma década e meia atrás na crise da Ásia). Mas o que está faltando no acordo é ainda mais significativ do que o que está nele. Há um ano , os líderes reconheceram que a Grécia não poderia se recuperar sem crescimento e que ele não poderia ser conseguido apenas com austeridade. Ainda assim, pouco foi feito.
O que se propõe agora é a recapitalização do Banco Europeu de Investimentos, parte de um pacote de desenvolvimento de US$ 150 bilhões. Mas os políticos são bons em reempacotamento e, segundo algumas versões, o dinheiro novo é uma pequena fração desse montante, e mesmo aquele não entrará no sistema imediatamente. Em resumo: o remédio — pouco demais, tarde demais — se baseia em diagnóstico errado e em políticas econômicas erradas.
A esperança é que os mercados recompensarão a virtude, a austeridade. Mas os mercados são mais pragmáticos: se, como quase certamente é o caso, a austeridade enfraquece o crescimento econômico, e dessa forma solapa a capacidade de pagar a dívida, os juros não cairão. De fato, o investimento declinará — uma espiral descendente viciosa na qual Grécia e Espanha já embarcaram. Os eurobônus e um fundo solidário poderiam promover o crescimento e estabilizar as taxas de juros pagas pelos governos em crise. Taxas mais baixas liberariam fundos de forma que mesmo países com fortes limitações orçamentárias poderiam gastar mais em investimentos que impulsionem o crescimento.
As coisas são piores no setor bancário.
O sistema bancário de cada país é apoiado por seu próprio governo; se a capacidade dos governos de apoiar os bancos se reduz, assim também a confiança nos bancos. Até mesmo sistemas bancários bem administrados poderiam enfrentar problemas numa recessão da magnitude da grega e da espanhola; com o colapso da bolha imobiliária da Espanha, seus bancos correm risco ainda maior.
Em seu entusiamo por criar um “mercado comum”, os líderes europeus não reconheceram que os governos dão um subsídio implícito aos bancos. É a crença que, se surgirem problemas, o governo socorrerá os bancos, o que cria a confiança neles; e, quando alguns governos estão em posição muito mais forte que outros, o subsídio implícito é maior para esses países.
Na ausência de condições equitativas de concorrência, por que o dinheiro não foge dos países mais frágeis, procurando instituições financeiras nos mais fortes? De fato, é notável que não tenha havido mais fuga de capital. Os líderes europeus não reconhecem esse perigo crescente, que poderia ser facilmente evitado por uma garantia comum, que simultaneamente corrigiria a distorção do mercado decorrente do diferencial do subsídio implícito.
O euro é falho desde o início, mas estava claro que as consequências disto só se tornariam aparentes numa crise. Política e economicamente, foi criado com as melhores intenções. O princípio do mercado único supostamente promoveria eficiente alocação de capital e trabalho.
Mas detalhes são importantes. A competição tributária significa que o capital pode não ir para onde seu retorno social é mais alto, mas para onde ele consiga o melhor negócio. O subsídio implícito aos bancos significa que os bancos alemães estão em vantagem sobre os de outros países. Os trabalhadores podem deixar a Irlanda ou a Grécia não porque sua produtividade é mais baixa, mas porque, ao irem embora, podem escapar da dívida deixada por seus pais. O mandato do Banco Central Europeu é para assegurar a estabilidade dos preços, mas a inflação está longe de ser o mais importante problema macroeconômico da Europa hoje.
A Alemanha teme que, sem estrita supervisão de bancos e orçamentos, ela terá de abrir o cofre para seus vizinhos perdulários. Mas isto deixa escapar o ponto principal: Espanha e Irlanda e muitos outros países em dificuldades tinham superávit orçamentário antes da crise. Esta causou os déficits, e não o contrário.
Se esses países erraram, foi apenas, como a Alemanha hoje, por acreditarem excessivamente nos mercados. Então eles (como os EUA e muitos outros) permitiram que uma bolha crescesse sem controle. Se políticas eficazes forem implementadas e instituições melhores estabelecidas — o que não quer dizer apenas mais austeridade e melhor supervisão de bancos, orçamentos e déficits — e o crescimento restaurado, esses paísesserão capazes de pagar suas dívidas e não será necessário recorrer às garantias. Além disso, a Alemanha está no fio da navalha: se o euro ou as economias na periferia entrarem em colapso, os custospara o país serão elevados.
A Europa tem muitos pontos fortes. Sua fraqueza hoje reflete principalmente políticas e arranjos institucionais falhos. Isto pode ser mudado, mas apenas se suas fragilidades fundamentais forem reconhecidas — tarefa muito mais importante do que reformas estruturais nos países. Mesmo que estas tenham enfraquecido a competitividade e o crescimento em alguns países, não foi isso que desencadeou a crise. A abordagem temporizadora da Europa em relação à crise não funcionará indefinidamente. Não é só a confiança na periferia europeia que está minguando. A sobrevivência mesma do euro está sendo posta em dúvida.
Joseph E. Stiglitz é prêmio Nobel de Economia e professor da Universidade de Colúmbia (EUA).
Como um condenado no corredor da morte, o euro teve novamente sua execução adiada no último minuto. Sobreviverá um pouco mais. Os mercados estão celebrando, como fizeram após cada uma das quatro reuniões de cúpula anteriores dedicadas à eurocrise — até compreender que os problemas fundamentaisainda têm de ser enfrentados.
Houve boas notícias na última: os líderes europeus finalmente entenderam que a operação pela qual a Europa empresta aos bancos para salvar os Estados, e aos Estados para salvar os bancos, não funcionará. Da mesma forma, eles agora reconhecem que os fundos para resgate que dão ao novo emprestador prioridade sobre os demais credores pioram a posição dos investidores privados, que simplesmente demandarão taxas de juros ainda mais elevadas.
É profundamente perturbador que tenha levado tanto tempo para os líderes europeus verem algo tão óbvio (e evidente mais de uma década e meia atrás na crise da Ásia). Mas o que está faltando no acordo é ainda mais significativ do que o que está nele. Há um ano , os líderes reconheceram que a Grécia não poderia se recuperar sem crescimento e que ele não poderia ser conseguido apenas com austeridade. Ainda assim, pouco foi feito.
O que se propõe agora é a recapitalização do Banco Europeu de Investimentos, parte de um pacote de desenvolvimento de US$ 150 bilhões. Mas os políticos são bons em reempacotamento e, segundo algumas versões, o dinheiro novo é uma pequena fração desse montante, e mesmo aquele não entrará no sistema imediatamente. Em resumo: o remédio — pouco demais, tarde demais — se baseia em diagnóstico errado e em políticas econômicas erradas.
A esperança é que os mercados recompensarão a virtude, a austeridade. Mas os mercados são mais pragmáticos: se, como quase certamente é o caso, a austeridade enfraquece o crescimento econômico, e dessa forma solapa a capacidade de pagar a dívida, os juros não cairão. De fato, o investimento declinará — uma espiral descendente viciosa na qual Grécia e Espanha já embarcaram. Os eurobônus e um fundo solidário poderiam promover o crescimento e estabilizar as taxas de juros pagas pelos governos em crise. Taxas mais baixas liberariam fundos de forma que mesmo países com fortes limitações orçamentárias poderiam gastar mais em investimentos que impulsionem o crescimento.
As coisas são piores no setor bancário.
O sistema bancário de cada país é apoiado por seu próprio governo; se a capacidade dos governos de apoiar os bancos se reduz, assim também a confiança nos bancos. Até mesmo sistemas bancários bem administrados poderiam enfrentar problemas numa recessão da magnitude da grega e da espanhola; com o colapso da bolha imobiliária da Espanha, seus bancos correm risco ainda maior.
Em seu entusiamo por criar um “mercado comum”, os líderes europeus não reconheceram que os governos dão um subsídio implícito aos bancos. É a crença que, se surgirem problemas, o governo socorrerá os bancos, o que cria a confiança neles; e, quando alguns governos estão em posição muito mais forte que outros, o subsídio implícito é maior para esses países.
Na ausência de condições equitativas de concorrência, por que o dinheiro não foge dos países mais frágeis, procurando instituições financeiras nos mais fortes? De fato, é notável que não tenha havido mais fuga de capital. Os líderes europeus não reconhecem esse perigo crescente, que poderia ser facilmente evitado por uma garantia comum, que simultaneamente corrigiria a distorção do mercado decorrente do diferencial do subsídio implícito.
O euro é falho desde o início, mas estava claro que as consequências disto só se tornariam aparentes numa crise. Política e economicamente, foi criado com as melhores intenções. O princípio do mercado único supostamente promoveria eficiente alocação de capital e trabalho.
Mas detalhes são importantes. A competição tributária significa que o capital pode não ir para onde seu retorno social é mais alto, mas para onde ele consiga o melhor negócio. O subsídio implícito aos bancos significa que os bancos alemães estão em vantagem sobre os de outros países. Os trabalhadores podem deixar a Irlanda ou a Grécia não porque sua produtividade é mais baixa, mas porque, ao irem embora, podem escapar da dívida deixada por seus pais. O mandato do Banco Central Europeu é para assegurar a estabilidade dos preços, mas a inflação está longe de ser o mais importante problema macroeconômico da Europa hoje.
A Alemanha teme que, sem estrita supervisão de bancos e orçamentos, ela terá de abrir o cofre para seus vizinhos perdulários. Mas isto deixa escapar o ponto principal: Espanha e Irlanda e muitos outros países em dificuldades tinham superávit orçamentário antes da crise. Esta causou os déficits, e não o contrário.
Se esses países erraram, foi apenas, como a Alemanha hoje, por acreditarem excessivamente nos mercados. Então eles (como os EUA e muitos outros) permitiram que uma bolha crescesse sem controle. Se políticas eficazes forem implementadas e instituições melhores estabelecidas — o que não quer dizer apenas mais austeridade e melhor supervisão de bancos, orçamentos e déficits — e o crescimento restaurado, esses paísesserão capazes de pagar suas dívidas e não será necessário recorrer às garantias. Além disso, a Alemanha está no fio da navalha: se o euro ou as economias na periferia entrarem em colapso, os custospara o país serão elevados.
A Europa tem muitos pontos fortes. Sua fraqueza hoje reflete principalmente políticas e arranjos institucionais falhos. Isto pode ser mudado, mas apenas se suas fragilidades fundamentais forem reconhecidas — tarefa muito mais importante do que reformas estruturais nos países. Mesmo que estas tenham enfraquecido a competitividade e o crescimento em alguns países, não foi isso que desencadeou a crise. A abordagem temporizadora da Europa em relação à crise não funcionará indefinidamente. Não é só a confiança na periferia europeia que está minguando. A sobrevivência mesma do euro está sendo posta em dúvida.
Joseph E. Stiglitz é prêmio Nobel de Economia e professor da Universidade de Colúmbia (EUA).
O GLOBO
31/07/2012
ROSELY SAYÃO Pai não é professor particular
Folha de S.Paulo, 31/7/2012
Na volta às aulas, dê ao seu filho a chance de se apropriar de seus estudos e de saber que ele dá conta sozinho
A criançada está de volta à escola. Foi bom esse tempo sem rotina, sem horário e sem obrigações escolares. Mas, será bom, também, o retorno a uma vida organizada.
Faz bem para os mais novos saber, pelo menos um pouco, como será o dia seguinte. Dá a eles sensação de segurança, estabilidade.
Nos primeiros dias na escola, é uma alegria para as crianças encontrar os colegas que não viram por quase um mês, contar as novidades, voltar a brincar com os amigos no recreio. Mas, logo depois recomeça, para muitos, uma jornada bem árdua.
Não, não me refiro aqui aos deveres escolares e à tarefa de ter de aprender algo que não sabem -situação que nós sabemos ser bem difícil. Muitas crianças sofrem, de fato, com essas questões.
Custa a elas assumir as pequenas responsabilidades que lhes cabem e custa mais ainda aceitar que não sabem e que precisam aprender para saber. E isso requer esforço e concentração.
Nos tempos atuais, as crianças são iludidas pelas imagens e isso faz com que elas pensem que já sabem a respeito de quase tudo. "Eu sei" é a frase curta que repetem várias vezes ao dia, já reparou?
Mesmo com tais dificuldades, as crianças podem superar os seus desafios escolares e colocar em atos o potencial que têm.
Quando falei em jornada árdua, eu me referia ao envolvimento dos pais, tão requisitado atualmente, na vida escolar dos filhos.
A frase "Se os pais acompanham de perto a vida escolar dos filhos, esses se saem melhor na escola" resume o principal argumento que leva adultos a estudar com as crianças, a fazer as lições de casa junto com elas, a providenciar trabalhos, a coletar informações na internet etc.
A afirmação acima é verdadeira, claro. Qualquer pessoa que tenha ajuda em qualquer coisa se sai melhor. O problema é o equívoco que esse pensamento contém.
Na escola, sair-se bem é aprender -e não simplesmente alcançar boas notas. E aprender, caro leitor, é uma tarefa que a criança precisa realizar sem a ajuda dos pais.
Com o estilo de vida que nós adotamos, cada vez mais uma enorme quantidade de pais acredita que precisa acompanhar os estudos do filho e até realiza isso de bom grado. Quer dizer, mais ou menos.
No início, até que a coisa vai bem, mas logo a paciência acaba e a relação entre os pais e o filho fica conturbada. É que os pais cobram esforço, dedicação e lição correta. E não costuma ser isso o que os filhos produzem.
Para muitos desses pais, a tarefa parental se resume a esse acompanhamento da vida escolar e à gestão da vida do filho. A função dos pais é bem maior do que isso: é acompanhar a vida do filho.
A função dos pais é dar ao filho a oportunidade de ele próprio se responsabilizar por sua vida escolar. É estimular no filho a vontade de formular perguntas que envolvem o conhecimento, de dirigi-las aos pais e de ficar interessado nas respostas. É, também, dar ao filho a chance de ele saber que é capaz de enfrentar sua própria batalha sozinho e dar conta dela.
Essas são coisas muito mais importantes para a criança do que ter a mãe ou o pai sempre presente nos trabalhos, nas provas etc.
Neste retorno às aulas, dê chance para que seu filho se aproprie de seus estudos. Isso não significa abandoná-lo. Ele precisa ser lembrado, incentivado, encorajado a assumir suas responsabilidades escolares e a seguir sempre em frente, mesmo com dificuldades e obstáculos.
Mas isso pode ser feito sem que os estudos se tornem mais importantes para os pais do que para ele próprio.
Os pais precisam se lembrar de o que filho já tem professores na escola, que é o local especializado no ensino. Em casa, a criança precisa é de pais, e não de professores particulares ou tutores.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?"
CLÓVIS ROSSI Venezuela e o problema Mercosul
Folha de S.Paulo, 31/7/2012
Caracas agrega quatro Paraguais/Uruguais ao bloco, que precisa decidir o que quer ser
A Venezuela torna-se hoje membro pleno do Mercosul. Bom negócio? Sim, com ressalvas.
Antes das ressalvas, perdão por escrever uma obviedade, mas ela se torna necessária pelas paixões, contra e a favor, que produz o presidente Hugo Chávez: quem se incorpora ao Mercosul é a Venezuela, não Chávez, a menos que se considere que o líder bolivariano é imortal, o que ainda não está provado.
A Venezuela aporta ao bloco US$ 316 bilhões de PIB, o que corresponde a 4,3 vezes a soma das economias de Paraguai e Uruguai, os sócios menores. É um ativo, portanto.
Além disso, o Itamaraty comemora, em nota oficial, o fato de que "a incorporação da Venezuela altera o posicionamento estratégico do bloco, que passa a estender-se do Caribe ao extremo sul do continente. O Mercosul se afirma, também, como potência energética global tanto em recursos renováveis quanto em não renováveis".
Muito bem. Passemos agora às ressalvas. A primeira é institucional.
A Human Rights Watch, respeitada ONG da área de direitos humanos, soltou há pouco relatório crítico em relação ao governo Chávez. Nele, mostra que o presidente vem comendo a democracia pelas bordas, mas ainda não deglutiu o núcleo central.
No Mercosul, a Venezuela está obrigada a respeitar a chamada cláusula democrática, o que significa que Chávez, mesmo se reeleito no fim do ano, não poderá comer o que resta.
Cabe ao Brasil, a principal potência do grupo, exercer efetiva vigilância para evitar novas ações anti-democráticas e, se possível, pressionar Chávez para regurgitar algumas das partes que comeu.
Ou, como escreveu ontem para o "Valor Econômico" o repórter-colunista Sergio Leo, dos melhores analistas de política externa: "O Mercosul como elemento de democratização da Venezuela pode se mostrar um feito memorável. Desde que não se revele mera fantasia".
Segunda ressalva, de natureza comercial: a Venezuela de Chávez não pode se tornar obstáculo para negociações comerciais do Mercosul com outros países/regiões. Uma coisa, legítima, é defesa comercial. Outra, prejudicial, é protecionismo ideológico, em nome do tal "socialismo do século 21".
O Mercosul está estancado há tanto tempo que tudo o que ele não precisa é ficar mais embaçado por posições comerciais besuntadas de uma ideologia que não foi exatamente um grande sucesso de público e de crítica no fim do século 20.
A bem da verdade, a entrada da Venezuela é o menor dos problemas do bloco.
O maior, de longe, é decidir o que quer ser quando crescer: se uma mera zona de livre-comércio, na qual os membros zeram as tarifas de importação entre eles; se uma união aduaneira, em que, além do anterior, estabelecem uma tarifa comum para importações de países não membros; ou um verdadeiro mercado comum, com livre circulação de mercadorias e pessoas.
Por enquanto, o bloco está na fase de união aduaneira, mas com tantos furos que mais parece desunião. Não será o ingresso da Venezuela que permitirá tapar ou aumentar os buracos.
LUIZ CARLOS BALDICERO MOLION Mudanças climáticas e governança global
Folha de S.Paulo, 31/7/2012
Os modelos matemáticos do aquecimento global são meros exercícios acadêmicos. Reduzir emissões é condenar os países subdesenvolvidos à pobreza
Um resfriamento global, com mais invernos rigorosos e má distribuição de chuvas, é esperado nos próximos 20 anos, em vez do aquecimento global antropogênico (AGA) alardeado pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC).
O AGA é uma hipótese sem base científica sólida. As suas projeções do clima, feitas com modelos matemáticos, são meros exercícios acadêmicos, inúteis quanto ao planejamento do desenvolvimento global.
Seu pilar básico é a intensificação do efeito estufa pelas ações humanas emissoras de dióxido de carbono (CO2) e metano (CH4), por meio da queima de combustíveis fósseis e de florestas tropicais, das atividades agrícolas e da pecuária ruminante.
Porém, o efeito estufa jamais foi comprovado, nem sequer é mencionado nos textos de física. Ao contrário, há mais de cem anos o físico Robert W. Wood demonstrou que seu conceito é falso. As temperaturas já estiveram mais altas com concentrações de CO2 inferiores às atuais. Por exemplo, entre 1925 e 1946 o Ártico, em particular, registrou aumento de 4°C com CO2 inferior a 300 ppmv (partes por milhão em volume). Hoje, a concentração é de 390 ppmv.
Após a Segunda Guerra, quando as emissões aumentaram significativamente, a temperatura global diminuiu até a metade dos anos 1970.
Ou seja, é obvio que o CO2 não controla o clima global. Reduzir as emissões, a um custo enorme para a sociedade, não terá impacto no clima. Como mais de 80% da matriz energética global depende de combustíveis fósseis, reduzir emissões significa reduzir a geração de energia e condenar países subdesenvolvidos à pobreza eterna, aumentando as desigualdades sociais no planeta.
Essa foi, em essência, a mensagem central da carta aberta entregue à presidenta Dilma Rousseff antes da Rio+20 -assinada por 18 cientistas brasileiros, eu inclusive.
A trama do AGA não é novidade e seguiu a mesma receita da suposta destruição da camada de ozônio (O3) pelos clorofluorcarbonos (CFC) nos anos 1970 e 1980.
Criaram a hipótese que moléculas de CFC, cinco a sete vezes mais pesadas que o ar, subiam a mais de 40 km de altitude, onde ocorre a formação de O3. Cada átomo de cloro liberado destruiria milhares de moléculas de O3, reduzindo a sua concentração e permitindo a maior entrada de radiação ultravioleta na Terra, o que aumentaria os casos de câncer de pele e eliminaria milhares de espécies de seres vivos.
Reuniões com cientistas, inclusive de países subdesenvolvidos, foram feitas para dar um caráter pseudocientífico ao problema inexistente, foi criado o Painel de Tendência de Ozônio no âmbito do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e foi elaborado o Protocolo de Montreal (1987), assinado pelos países subdesenvolvidos sob ameaças de sanções econômicas. O Brasil também assinou, para ter sua dívida externa renovada.
Em 1995, os autores das equações químicas que alegadamente destruíam o O3 receberam o Nobel de Química. Porém, em 2007 cientistas do Jet Propulsion Laboratory da NASA demonstraram que as suas equações não ocorrem nas condições da estratosfera antártica e que não são a causa da destruição do ozônio.
O AGA seguiu os mesmos passos, com reuniões científicas, a criação do IPCC, o Protocolo de Kyoto e o Nobel (da Paz?) para o IPCC e Al Gore.
Essas foram duas tentativas de se estabelecer uma governança global. Qual será o próximo passo? A Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas da Biodiversidade e Serviços (IPBES)?
LUIZ CARLOS BALDICERO MOLION, 65, doutor em meteorologia pela Universidade de Wisconsin (EUA), é professor da Universidade Federal de Alagoas
VLADIMIR SAFATLE Zero de conduta (universidades)
Folha de S.Paulo, 31/7/2012
Há mais de dois meses, os professores das universidades federais estão em greve. Após duas propostas consideradas insuficientes pela maioria do corpo docente, o governo parece disposto a endurecer as negociações. No entanto há de estranhar a maneira com que uma questão dessa natureza está sendo tratada.
Ao ganhar as eleições, o governo atual afirmou ser a educação sua prioridade. Mas, por mais que possa parecer uma tautologia, colocar a educação como prioridade significa, entre outros, assumir as demandas que vêm de seus profissionais como prioritárias. O que os professores querem é um salário digno e uma infraestrutura adequada para desenvolver atividades de docência, orientação e pesquisa.
Enquanto algumas pessoas que nada sabem da vida universitária usam espaços na imprensa para afirmar que os professores são a "elite do funcionalismo" e que, por isso, não deveriam reclamar, policiais rodoviários continuam ganhando mais do que docentes.
Os desafios brasileiros passam pelo fortalecimento da universidade pública, com sua capacidade de formação e pesquisa. A experiência de liberalização do ensino universitário por meio da proliferação de universidades privadas foi um retumbante fracasso.
Tudo o que se conseguiu foi produzir levas de profissionais semiformados, assim como instituições nas quais os professores acabam por ser repetidores, por estar afogados em cargas horárias que não permitem o desenvolvimento de pesquisas.
Vez por outra, quando o processo de financiamento das universidades públicas volta à tona, temos de ouvir duas opiniões no limite do caricato. A primeira consiste no argumento etapista tosco que afirma: primeiro, devemos investir na escola básica, depois, nas universidades. Claro.
E, enquanto o investimento da educação básica não chega a um nível adequado, deixemos as universidades serem sucateadas e destruídas. Tais pessoas têm um raciocínio binário incapaz de entender que o investimento em educação deve ser extensivo, caso não queiramos perder completamente o bonde do desenvolvimento social.
A segunda afirma que os professores universitários devem deixar de ser subvencionados pelo Estado e procurar financiamento para pesquisas na iniciativa privada.
Só um exemplo: se um pesquisador em psicologia procurar desenvolver uma pesquisa mostrando a ineficácia de antidepressivos, a quem ele deve pedir financiamento? À indústria farmacêutica?
Ou seja, ou o governo assume o custo de eleger a educação como prioridade ou é melhor não utilizar tal discurso em época de eleição.
Universidade: Missão superior
Editorial, Folha de S.Paulo, 31/7/2012
Universidades federais perdem o foco com greves e cotas, quando deveriam dedicar-se a forjar uma elite de docentes para o país
Sérias ameaças rondam as universidade federais no Brasil. Além de uma greve abusiva, que há mais de dois meses prejudica meio milhão de estudantes, paira sobre elas um projeto autoritário sobre cotas raciais que está para ser aprovado no Senado Federal -e essas são só as ameaças mais urgentes.
O projeto de lei 180/2008 tem origem na Câmara dos Deputados. Reserva metade das vagas das instituições federais de ensino superior para quem tenha cursado todo o ensino médio na rede pública e prescreve que sejam atribuídas a "autodeclarados negros, pardos e indígenas" no mínimo na proporção recenseada pelo IBGE.
Levantamento desta Folha mostrou que mais de 52 mil vagas nas federais já se destinam a cotistas, de um total de cerca de 240 mil ingressantes a cada ano. Para atingir a metade, portanto, esse contingente de vagas reservadas precisaria mais que dobrar.
A proposta tem boa chance de aprovação, pois conta com a simpatia do governo federal; se não sofrer emendas no Senado, segue direto para sanção presidencial. Seria um enrijecimento adicional das já esclerosadas universidades federais, que veriam assim mais um naco de sua autonomia acadêmica sacrificado no altar dos modismos politicamente corretos.
O problema não é o recurso a cotas, que, usadas com parcimônia, podem ser instrumento legítimo de inclusão social na universidade (a Folha defende apenas o critério socioeconômico e recusa o componente racial). Errado é destinar número tão grande de vagas com base em algo diverso da capacidade acadêmica do candidato.
Isso decerto não contribuirá para estancar a perda progressiva de qualidade do ensino superior, que passa no Brasil por um processo acelerado de expansão.
As federais, além disso, sofrem o assédio de grupos sindicais e partidários mais interessados em impor-lhes a agenda corporativa de funcionários e docentes e as fantasias ideológicas de estudantes. Perdem prestígio para as poucas universidades brasileiras, como as estaduais paulistas, que conseguem manter alguma qualidade e frequentar listas internacionais de excelência em ensino e pesquisa, e algumas privadas.
Não fossem essas distrações e a falta de um projeto claro para elas da parte do governo federal, as federais poderiam dedicar-se a construir para si um papel de maior relevância no sistema universitário nacional. Na impossibilidade de todas brilharem no ramo ultracompetitivo da pesquisa de ponta, deveriam escolher a missão -não menos nobre- de formar o exército de excelentes professores universitários de que o país tanto necessita.
30 de julho de 2012
How to Pay Teachers Dramatically More, Within Budget
EducationNext, July 30,2012
There’s been a lot of chatter about increasing teacher pay—even doubling it. With the release of TNTP’s The Irreplaceables, talk about paying teachers more and retaining the best will likely increase. Whether or not your political perspective leaves you thinking this is necessary, most people assume it’s a pipe dream given budget and political realities.
Public Impact’s Opportunity Culture team ran the numbers to determine how much more schools could pay teachers—within budget—just by putting excellent teachers in charge of more students’ learning. We found that schools could free funds to pay excellent teachers in teaching roles up to 40 percent more and teacher-leaders up to about 130 percent more, within current budgets and without increasing class sizes. In some variations, schools can pay all teachers more, while further rewarding the best.
The financial analyses covered three of more than 20+ school models on OpportunityCulture.org that use job redesign and technology to extend the reach of excellent teachers to more students, for more pay—Multi-Classroom Leadership, Elementary Specialization, and Time-Technology swaps.
Here are our findings, or read more here in the Financial Summary:
In the Multi-Classroom Leadership model, excellent teachers with leadership skills lead and develop teams of teachers and paraprofessionals to deliver learning that meets the leader’s standard of excellence to multiple classrooms of students. Our calculations show that schools could increase teacher-leader pay between 67% and 134%.
In the Elementary Subject Specialization model, classroom subject specialists teach one or two core subjects in which they excel to two to four classes of students. Schools relieve them of other instructional and noninstructional duties, in part by providing paraprofessional support staff to supervise students during noninstructional time and complete administrative paperwork. Our calculations show that schools could increase teacher pay up to 43% using this model.
In a Time-Technology Swap—Rotation model, students rotate through portions of digital learning (as little as an hour per day) to free the time of excellent teachers to teach more students and potentially to collaborate with peers. Our calculations show that schools could increase teacher pay up to 41% using this model.
In each of these models, teachers have career opportunities dependent upon their excellence, leadership, and student impact. Advancement allows more pay and greater reach. These models also create collaborative teams and enable stronger professional development by making time available during the school day. We call this an Opportunity Culture, explained in this infographic.
The analyses spell out the savings and costs of the three models. When teachers reach more students, additional per-pupil funds become available to support those teachers’ work. This additional funding, minus new costs for technology and paraprofessional support, can be used for higher pay and other priorities, according to the values, needs, and priorities of each school.
Though the pay increases and savings made possible for any specific school will depend on local factors, these briefs provide a starting point for districts, schools, and teachers to develop their own projections. Even splitting that benefit 50-50 between teachers and schools’ other financial needs, the pay increase potential remains large.
It’s important to remember that by almost any measure, there is a large distribution of teacher performance, and that performance differences matter enormously for students. Top-25 percent teachers produce well over a year of learning annually, on average. Kids who have them consistently can catch up from behind. Those in the middle can surge ahead, becoming honors students. But consistent access to excellent teachers is critical.
We know it is tempting in tough economic times to focus on the financial savings for schools that extending great teachers’ reach produces. But the personal and professional benefits to excellent teachers—and ones on the cusp of excellence who might get there with stronger daily leadership and development—are paramount. Extend teachers’ reach not just to save money, but first and foremost to put and keep excellent teachers in charge of every student’s learning.
Note 1: Figures expressed as percentage more than average pay. Schools save more when starting with higher percentages of non-classroom specialists, because savings are higher per class as these teachers’ positions are shifted back into classrooms.
Note 2: Some portion of savings may be reallocated back to all teaching staff or other priorities, not just excellent teachers. Here we show two examples in Multi-Classroom Leadership in which all teachers earn 10 or 25 percent more.
Note 3: The underlying briefs contain calculations and data sources.
-Bryan Hassel and Emily Ayscue Hassel
'Irreplaceable' Teachers Retained Poorly, TNTP Education Report Finds
Huff
Posted: 07/30/2012 6:51 pm Updated: 07/30/2012 7:30 pm
The high rate of teachers cycling in and out of schools is detrimental to the education profession and worse for students, decades of policy and research asserts. But a newreport from an influential advocacy group makes the case for treating teacher turnover differently.
The study, called "The Irreplaceables," took several years for TNTP (formerly The New Teacher Project) to produce, and asserted that a high rate of teachers moving in and out of the profession isn't necessarily bad.
"The whole basis of federal education policy since the '60s has been the idea that if kids got greater access to opportunity, they would do better, so the main focus of policy should be increasing that sort of equity, access to teachers," TNTP president Tim Daly said in an interview.
Rather, TNTP asserted, a high turnover rate among teachers who are "so successful they are nearly impossible to replace" -- the "irreplaceables" -- is the real problem. "Our analysis suggests that the problem is not the loss of too many teachers, but the loss of the wrong teachers," Daly wrote in an e-mail introducing the report.
Using teacher performance data and surveys in four school districts and a group of charter schools, TNTP found that improving schools without doing a better job at retaining "irreplaceables" is nearly impossible, and that poor retention policies "degrade" the teaching profession by not paying special attention to keeping top-performing teachers. It recommended teaching principals to better hold onto "irreplaceables" and to "counsel out" low performers, and revamping policies around teacher management, such as tenure and seniority. TNTP also recommended dismissing teachers "who cannot teach as well as the average first-year teacher."
TNTP works to place teaching fellows in school districts across the country. The group was carved out of Wendy Kopp's Teach for America and founded by former Washington, D.C., schools chief Michelle Rhee.
The report is bound to affect policy, given TNTP's track record -- and its splashy release Monday with the National Education Association, D.C. schools chief Kaya Henderson, and U.S. Secretary of Education Arne Duncan. "TNTP’s report documents in painful detail that school leaders are doing far too little to nurture, retain, and reward great teachers -- and not nearly enough to identify and assist struggling teachers," Duncan said in a statement. And many cite TNTP's 2009 Widget Effectreport, which revealed the underutilization of teacher evaluations, as a driver of the Obama administration's Race to the Top Competition.
But the report's definition of "irreplaceables" is fuzzy, and varies across the school districts that were surveyed. Matthew Di Carlo, writing on the blog of the Albert Shanker Institute, which is affiliated with the American Federation of Teachers, saidthe "irreplaceables," as defined by the report, are better described as "probably above average."
The politics around the report spotlight the making of education advocacy research. In the report's acknowledgements, TNTP thanked the Bill & Melinda Gates Foundation, the Laura and John Arnold Foundation and the Walton Family Foundation, among others, for support. These organizations pay to push policies known as education reform that make it easier to fire teachers based on students' low standardized test scores -- and reams of research to support that conclusion.
"There's been a massive investment in research to support the reform theory," said Craig Jerald, an independent education consultant who has done research for both Gates and teachers' unions. This research, along with reform advocacy, has forced teachers' unions to express, for the first time, concern with the low performers among their ranks. While the distinction isn't that clear cut, in general, the reformers and unions have different ways of approaching these low performers. Unions stress improving them through professional development. Reformers, including the authors of the TNTP report, want to get them out of the classroom faster. "People who support the development side haven't supported much quantitative research," Jerald said.
Jerald said he expects the report's claim that most low-performing teachers don't improve to be its most controversial. "It'll force people who disagree with that to go out there and do some research," he said. "I can't think of any quantitative research that disputes that."
TNTP researchers used value-added measurements -- a widely used metric that is supposed to tease out teachers' effects on students' standardized tests -- based on only one year of teacher performance in some cases. The single-year metric is known to be unreliable. "Using multiple years of classroom observations for teachers will reduce sorting bias in value-added estimates," wrote Cory Koedel, a University of Missouri economist known for his expertise on value-added, in a 2009 report. "This result raises concerns about using single-year measures of teacher value-added to evaluate teacher effectiveness."
Koedel, however, served on the advisory board of experts that helped guide the TNTP paper. He said his concerns about using such measures have been mostly assuaged by a 2011 Harvard study that found that a teacher's single-year value-added measures modestly affect students' earnings later in life. Differences in identifying "irreplaceables" between districts, he said, are "something to be thoughtful about," but don't affect the report's qualitative conclusions. "There's all kinds of studies in academic literature in terms of teacher turnover, a generic thing," Koedel said. "The thing is we want good teachers to stay and bad teachers to leave."
Randi Weingarten, president of the American Federation of Teachers, called the report "puzzling."
"On the one hand it makes the point of the importance of keeping good teachers and what's needed to do that," Weingarten said in a statement. "On the other, it assumes that someone can magically become a good teacher and that school leadership means simply firing bad teachers. What is missing is the work that needs to be done to create continuous development and support systems to help all teachers become great teachers."
Huff Post, Joy Resmovits
Huff Post, Joy Resmovits
Toda iniciativa para a educação é válida', Helena Nader
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Confira a entrevista da presidente da SBPC, Helena Nader, publicada no jornal O Estado de São Paulo de domingo (29).
A 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), considerada o maior congresso científico da América Latina, terminou com um bom debate sobre o Programa Ciência sem Fronteiras, abordado em duas mesas redondas e na conferência do ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp.
No total, foram 11.912 participantes de 700 cidades brasileiras, volume considerado um sucesso pela presidente da SBPC, a professora da Unifesp Helena Bonciani Nader. Nesta entrevista, ela fala sobre os pontos altos do encontro, destaca a presença inédita de um prêmio Nobel e faz sua avaliação do programa Ciência sem Fronteiras. O que a senhora destaca desse encontro?
Um dos destaques foi a presença de Dan Shechtman, prêmio Nobel de Química de 2011. A presença dele foi marcante para os jovens. Eu assisti à apresentação sentada no chão porque não tinha mais lugar e não tinha mais fone para a tradução. O que eu vejo de positivo foi ele ter tocado esses jovens.
E quanto à escolha do tema?
Outra novidade foi que nós, cientistas, sempre discutimos os saberes tradicionais, mas aquele que é o detentor desses saberes não participa. Desta vez, eles estavam sentados nas mesas com os pesquisadores. Teve uma troca de conhecimento inédita, que terá um saldo positivo para o futuro do País. Trouxemos pela primeira vez um ministro do Tribunal de Contas da União. Os pesquisadores precisam entender melhor como funciona esse sistema e aprender a dialogar. É isso que a SBPC pode fazer. Não pode oferecer soluções, mas pode juntar os cientistas, discutir e oferecer propostas.
O que ficou das discussões sobre o Ciência sem Fronteiras?
Desde quando foi lançada a ideia do Ciência sem Fronteiras, fui entrevistada várias vezes para dizer qual era a posição da SBPC. Todas as iniciativas para a melhoria da qualidade da educação e da ciência são válidas. O que foi colocado durante a mesa redonda, até mesmo pelos presidentes do CNPq, Glaucius Oliva, e da Capes, Jorge Guimarães, é que o programa foi criado rapidamente e, como tudo, precisa de ajustes.
Quais seriam esses ajustes?
O que eu vejo como impacto muito importante é o alerta de que o estudante brasileiro tem uma dificuldade no diálogo internacional. A única língua que o nosso estudante fala é o português, mas a língua internacional é o inglês. O programa Ciência sem Fronteiras deu uma cutucada nas nossas universidades, elas estão esquematizando como suprir essa deficiência. A Capes e o CNPq estão pensando em criar um projeto de ensino a distância em inglês que realmente capacite. O programa é bom e está andando.
Há preocupação com o retorno dos estudantes?
A China, que mandou na década de 1980 muitos estudantes para os EUA, trouxe essa turma bem formada de volta de uma forma muito competitiva. Ou seja: oferecendo excelentes condições de trabalho. A garantia que queremos é ter essas condições no Brasil. Por isso a gente insiste: os meninos estão sendo bem formados, então temos de mostrar que terão boas condições na volta.
(O Estado de São Paulo - 29/07)
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The Paradox of Teachers and Technology in the U.S. by larrycuban
Os estados brasileiros com maior violência contra crianças
, Amanda previnelli
O Brasil é o 4º país no mundo com a maior taxa de homicídio de crianças e adolescentes; o estado mais violento é o Alagoas
Atrás apenas de El Salvador, Venezuela e Trinidad e Tobago, o Brasil tem uma taxa de 13 homicídios por 100 mil jovens. Segundo o autor da pesquisa, o professor Julio Waiselfisz, o número absurdo decrimes pode ser explicado, em parte, pelo descaso das autoridades.
“No Brasil e nos países com altas taxas de homicídio, as autoridades acabam explicando as mortes com razões simplistas. Culpam o tráfico de drogas, por exemplo”, diz o professor. A vítima, geralmente dos setores mais vulneráveis (Waiselfisz cita crianças, adolescentes, jovens, idosos, mulheres e negros como exemplos), acaba sendo responsabilizada pela violência, que é tolerada.
No país, o estado mais violento é o Alagoas. São Paulo está entre os que têm menor taxa (perde apenas para o Piauí). Confira o ranking estadual:
Posição | Estado | Taxa (em 100 mil) |
---|---|---|
1 | Alagoas | 34,8 |
2 | Espírito Santo | 33,8 |
3 | Bahia | 23,8 |
4 | Distrito Federal | 22,9 |
5 | Amapá | 22 |
6 | Paraíba | 21,6 |
7 | Pernambuco | 19,3 |
8 | Pará | 19,2 |
9 | Paraná | 18,8 |
10 | Rio de Janeiro | 17,2 |
11 | Ceará | 16,6 |
12 | Goiás | 15,1 |
13 | Rio Grande do Norte | 12,7 |
14 | Rondônia | 12,4 |
15 | Mato Grosso | 12,1 |
16 | Amazonas | 12,1 |
17 | Sergipe | 11,2 |
18 | Mato Grosso do Sul | 11,1 |
19 | Acre | 10,8 |
20 | Minas Gerais | 10,7 |
21 | Rio Grande do Sul | 9,5 |
22 | Roraima | 8,7 |
23 | Tocantins | 8,2 |
24 | Maranhão | 6,8 |
25 | Santa Catarina | 6,4 |
26 | São Paulo | 5,4 |
27 | Piauí | 3,6 |