5 de julho de 2013

MOISÉS NAÍM Fora com todos eles!


A experiência mostra que derrubar líderes corruptos e ineptos pode ser a parte mais fácil do desafio
Nos anos 90, italianos, russos e venezuelanos estavam tão cansados de seus políticos quanto os brasileiros atuais. A corrupção, que existia havia muito, subitamente tornou-se intolerável. As pessoas também perderam a paciência com a inépcia burocrática e os maus serviços públicos.
"Fora com todos eles" tornou-se o grito que exprimia o sentimento predominante. "Eles", é claro, eram todos os que detinham o poder.
Na Itália, o escândalo de corrupção Tangentopoli, deflagrado por subornos pagos por construtoras, levou a imensas mudanças. Mais da metade do Legislativo foi indiciada.
Os cinco partidos que haviam governado o país desde 1947 desapareceram. As pessoas saíram avidamente em busca de caras novas e, especialmente, de líderes honestos.
Silvio Berlusconi ofereceu seus serviços à nação e, em 1994, três meses após lançar seu partido, tornou-se premiê. Virou o chefe de governo mais longevo da Itália do pós-guerra.
Vladimir Putin era outra dessas "caras novas". Subiu ao poder como resultado de um súbito surto de indignação popular quanto aos políticos, à corrupção e à percepção de que a Rússia estava a caminho de um declínio humilhante.
Como o magnata da mídia Berlusconi, Putin, ex-agente da KGB, explorava os atrativos de se apresentar como "não político". Foi indicado como primeiro-ministro em 1999 pelo presidente Boris Ieltsin, doente e fragilizado politicamente.
Naquele mesmo ano, Ieltsin renunciou e, graças a uma eleição na qual conquistou 55% dos votos, Putin tornou-se o primeiro presidente democraticamente eleito da Rússia. E não saiu mais do Kremlin.
Enquanto isso, na Venezuela, algo surpreendentemente parecido acontecia. Em 1998, o país elegeu uma "cara nova" como líder. Uma vez mais, a corrupção e a exasperação diante do mau estado da economia e dos maus políticos conduziram a uma desesperada ansiedade por "alguém novo".
Hugo Chávez satisfez aquela ansiedade. Como Putin, chegou ao palácio presidencial para ficar. Manteve-se no poder por 14 anos e, quando percebeu que estava doente demais para governar, apontou um sucessor, Nicolás Maduro.
Berlusconi, Putin, Chávez e os três países não podiam ser mais diferentes. Mas os paralelos são notáveis.
Eram todas sociedades cansadas de elites havia muito tempo no poder. Inevitavelmente, encontraram "caras novas", que, depois de eleitas, concentraram poderes, pulverizaram a oposição e governaram por muito tempo.
É triste dizer que Itália, Rússia e Venezuela são sociedades muito doentes hoje. As "caras novas" não fizeram um grande trabalho governando seus países. E a corrupção continua intocada.
A lição não é que líderes que tolerem corrupção e inépcia administrativa não devam ser derrubados. A lição é que derrubá-los pode ser a parte mais fácil do desafio.
Dar poder a um líder que ofereça apenas uma cara nova e retórica sedutora é o verdadeiro perigo. Quando as caras novas chegam ao poder, elas nunca partem. Cuidado.
Folha de S.Paulo, 5/7/2013

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