MARCOS AUGUSTO GONÇALVES, Folha de S.Paulo, 1/4/2013
Cidade de São Paulo volta à taxa de homicídio de 2007 e dá a impressão de que o "potencial" chegou ao limite
Se não fomos vítimas, todos podemos certamente contar uma história de violência que aconteceu ao redor. Ou com amigos ou na rua onde moramos ou no restaurante que conhecemos ou no edifício que já visitamos.
Os caras que invadiram a casa e fizeram roleta russa com a dona na frente dos amigos amarrados; os policiais que pegaram o rapaz, puseram na viatura e o estupraram; o moleque que eu vi apanhando de pau na frente do bar; os manos encostados contra o muro-pelourinho nas noites escuras e humilhantes do centro da cidade. E eu não moro na Vila Brasilândia onde moram pessoas que conheço -e com muito medo de morar.
São Paulo, não obstante, tem os melhores índices de violência do país. Ou os menos piores. A medição que se tornou consagrada é o número de homicídios -se estuprou mas não matou, a violência não amentou. Mas, vá lá. O valor maior é a vida e esse é um critério internacional.
A taxa de homicídios da capital, acima de 11 por 100 mil habitantes, é o o dobro da de Nova York. Mas -ufa- é metade da média nacional. Cidades de regiões mais precárias, como o Nordeste, registram índices de áreas conflagradas. A tradição oligárquica do mandar matar, a fragilidade das instituições e o MMA da sobrevivência no ambiente hostil da urbanização selvagem conspiram a favor de estatísticas sombrias, mesmo num quadro de aumento do emprego e da renda -prova de que as relações entre violência e economia são mais complicadas do que alguns imaginam.
São Paulo começou a reduzir os homicídios no finalzinho dos anos 1990. Entre 1999 e 2005, passou de 35,3 ocorrências por 100 mil habitantes para 17,7. Em 2008 chegou a 10,8 -e de lá para cá os índices ficaram nessa faixa. Desde meados do ano passado, porém, as estatísticas são ascendentes.
Os dados recém-divulgados mostram que São Paulo voltou ao ano de 2007, quando o Estado atingiu 11,7 homicídios por grupo de 100 mil. Com os dados de fevereiro, foi justamente essa (11,67) a taxa média apurada para os últimos 12 meses.
Esse cenário nos faz pensar em questões que vão além do perfil ideológico da gestão da segurança pública, se mais "fascista" ou mais "direitos humanos".
A dificuldade de reduzir o patamar atingido há seis anos sugere que São Paulo pode ter chegado ao limite do "potencial" de redução da violência dentro das condições dadas. Aumento de investimentos, melhores meios para as polícias, aperfeiçoamento tecnológico e política de aprisionamento em massa deram resultado. E podem dar em outros Estados e cidades, como o Rio, onde a queda das taxas contribui para uma percepção social otimista, embora os índices mantenham-se acima dos paulistas.
Não é demais lembrar que antes da política de UPPs a cidade do capitão Nascimento convivia com a barbárie escancarada, a guerra a céu aberto -uma situação extrema e inaceitável. O Rio caminha agora para a "normalidade". Quem sabe estacionará perto das taxas de São Paulo e nos daremos todos conta da distância que continuará a nos separar dos padrões civilizados.
Talvez estejamos presenciando na segurança pública paulista um fenômeno análogo ao que se observa em outras áreas, como o trânsito ou a própria economia: a caixa de ferramentas disponível já deu o que tinha que dar.
É preciso encontrar instrumentos novos, que permitam mudanças estruturais. Investir em puxadinhos não vai mais gerar mudanças significativas. Permaneceremos na zona entorpecida da mediocridade, com êxitos que mais parecem suaves fracassos.
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