12 de outubro de 2011
Educação no Brasil | O Globo | Opinião | BR
A crise entre os estudantes e o governo chileno é, de certa forma, uma consequência do sucesso das políticas aplicadas nas últimas três décadas, e que ensejaram o desenvolvimento econômico e social, a redução da pobreza e a melhoria dos padrões éticos, embora persistam desigualdades.
Para Sérgio Bittar, ex-ministro nos governos Pinochet, Ricardo Lagos e Michelle Bachelet (os dois últimos após a redemocratização), trata-se de uma "crise de expansão da sociedade chilena", já que houve "o desenvolvimento de uma grande classe média, ciente de seus direitos, com maior nível de renda e sem medo".
O ensino é claramente um ponto de ruptura nesse modelo que, no geral, tem sido muito bem-sucedido. Manifestações estudantis pela adoção de ensino gratuito e de melhor qualidade começaram há cinco meses e resultaram num impasse. No Chile, só a educação básica é de graça. No nível médio, as escolas podem cobrar. Desde a ditadura de Pinochet, não há universidades gratuitas, e mesmo as públicas cobram tarifas. O governo concede bolsas de estudo, o que não impediu que um expressivo número de famílias tenha se endividado para pagar os estudos dos filhos.
O governo Sebastián Piñera ofereceu ampliar as bolsas para abarcar 40% dos estudantes mais pobres e 20% dos de classe média. Não houve acordo, e os dois lados radicalizaram, rompendo incipientes negociações. O governo reagiu prevendo a adoção de penas de até três anos de prisão pela ocupação de espaços públicos. Os estudantes, que contam com o apoio dos professores, exortaram os colegas a não voltar às aulas neste segundo semestre, além de marcarem uma greve geral para os dias 18 e 19. Hoje, 90% das universidades estão paradas, e cerca de 400 colégios do ensino médio estão ocupados e paralisados.
Os estudantes sustentam que o Estado pode financiar a totalidade do ensino e sugerem para isso três caminhos: a nacionalização da indústria de mineração - a maior fonte de receita do país -, uma grande reforma tributária que taxe os mais ricos e a redução dos gastos militares. As propostas não têm boa acolhida no governo.
O impasse causa enorme desgaste político a Piñera, o primeiro presidente de direita a governar o país desde a era Pinochet. Pesquisas mostram que as demandas estudantis têm apoio de 89% da população, e que apenas 22% aprovam o desempenho do presidente no caso. Há claramente uma dificuldade do governo em entrar em sintonia com a opinião pública no embate com os estudantes. Os chilenos não veem mais a educação universitária como um privilégio, mas como um direito. Terá contribuído para o endurecimento da posição oficial o fato de as autoridades terem enfrentado, nos últimos meses, nada menos do que 37 protestos estudantis maciços.
A crise chilena mostra que o crescimento econômico, mesmo com redução dos índices de pobreza, não significa que esteja tudo resolvido. É necessário adotar mecanismos de participação mais eficazes e reduzir a rigidez do sistema político com reformas que atendam aos novos anseios da sociedade.
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Governo está fora de sintonia com sociedade, que apoia demandas estudantis
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