Priscila Cruz é diretora executiva do Movimento 'Todos pela Educação'. Artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo de hoje (22).
Foram divulgados na semana passada os resultados de 2011 do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Trata-se de uma das referências mais importantes para o acompanhamento dos avanços e retrocessos da área no País, combinando resultados de desempenho com fluxo escolar. Ainda que não seja um indicador perfeito, a partir de seus dados é possível avaliar as consequências das políticas e agir para que se ponham em prática os aperfeiçoamentos e as correções necessários.
Como o índice é calculado a cada dois anos desde 2005, já temos uma boa série histórica, com informações para o quinto ano do ensino fundamental (avaliando, portanto, os anos iniciais dessa etapa), o nono ano dessa mesma fase de ensino (anos finais) e o terceiro ano do ensino médio (a última etapa da educação básica). Analisando essas etapas no período, temos, respectivamente, a solução, o nó invisível e a crise.
O Fundamental I (do primeiro ao quinto ano) tem apresentado resultados animadores, os quais apontam um acúmulo de experiências bem-sucedidas que indicam o contínuo avanço dessa etapa. Desde 2005 cresceu 0,4 ponto por edição, saindo de 3,8 para 5 em 2011.
Os Estados do Ceará e do Piauí merecem destaque, com os maiores aumentos, respectivamente, de 3,2 para 4,9 e de 2,8 para 4,4. E também Minas Gerais, por apresentar o maior resultado do País em 2011, com um Ideb de 5,9 - lembrando que a meta do Brasil é chegar a 6 em 2021. O que esses Estados têm em comum? Prioridade para a educação, persistência nas políticas que se mostraram bem-sucedidas, foco na alfabetização e pactuação entre Estado e municípios.
Começamos, porém, a perder o fôlego na etapa seguinte, o Fundamental II (do sexto ao novo ano), na qual está o nó invisível da educação básica. O avanço de 2005 para 2011 foi de uma média de 0,2 ponto por edição, saindo de 3,5 para 4,1.
Essa etapa tem seus problemas de identidade e muito menos atenção do que seus vizinhos mais ilustres. Ela não é nem preponderantemente estadual nem municipal: 56% pertencem às redes estaduais e 44%, às municipais; ou seja, está no meio do caminho na distribuição de responsabilidades entre os entes federados. Também é a mais ignorada pelas políticas públicas, pelo investimento social privado e nos debates da educação.
Os alunos não são mais crianças, mas também não são ainda os jovens do ensino médio. Se estiverem na idade certa, encontram-se no início da adolescência, entre 11 e 14 anos, passando por um período de muitas incertezas e inseguranças. Nessa fase eles têm muito mais professores do que na etapa anterior, em outro tipo de estrutura curricular, muito mais fragmentada. O resultado é menor aprendizagem e aumento da repetência e da evasão.
Como a educação é um processo cumulativo, as lacunas de aprendizagem e o fluxo escolar ruim vão-se intensificando ano a ano, caso não haja políticas em resposta. E é nesse contexto que uma parte dos alunos ingressa no ensino médio. Nessa etapa a evolução foi de apenas 0,1 ponto por edição, a menor de todas, saindo de 3,4 em 2005 para 3,7 em 2011. Mas com um agravante: das 27 unidades da Federação, três - Alagoas, Espírito Santo e Sergipe - tiveram resultados em 2011 piores que os apresentados seis anos antes, em 2005.
Analisando apenas os dados das redes estaduais, uma vez que são elas as responsáveis por 97% das matrículas na rede pública para essa etapa, temos desde o Estado do Amazonas, que avançou 1,2 ponto no período, até Alagoas, cujo Ideb da rede caiu, além de também ter o menor resultado entre todos os Estados. E, talvez não por acaso, é o Estado onde a rede particular mais cresceu entre os demais, 0,5 no período.
No ensino médio, aumentou a desigualdade entre os Estados. Em 2005 a diferença entre o maior e o menor resultado era de 1 ponto no Ideb e em 2011 foi para 1,5. É uma etapa claramente em crise.
Além das desigualdades entre os Estados, outro ponto preocupante, novamente mais ainda no médio, é a desigualdade entre as redes pública e particular. Em 2011, no Fundamental I a diferença entre elas foi de 1,8 ponto no Ideb; no Fundamental II, cresceu para 2,1; e, finalmente, no médio, foi para 2,3. Ou seja, ao longo da trajetória escolar, os alunos estão se distanciando cada vez mais, quando a equidade entre as redes é imprescindível para garantir oportunidades para todos.
E como sair desse círculo vicioso da última etapa de nossa educação básica? Muitos são os possíveis caminhos, mas algumas políticas são urgentes, como repensar a estrutura curricular, reduzir para quase zero a oferta de ensino médio noturno e resolver a escassez de professores, principalmente na área de exatas. Os Estados que mais avançaram também indicam caminhos, como o aumento de escolas em tempo integral, a definição clara e transparente da aprendizagem esperada para cada ano, avaliações realmente utilizadas na gestão da rede, das escolas e da sala de aula, reforço e recuperação dos alunos ao longo do ano, utilização relevante das tecnologias da informação e modernização dos processos de gestão.
Fica aqui um alerta para todos nós, da sociedade, para o Ministério da Educação, para as Secretarias de Educação dos Estados e para os deputados federais que compõem a Comissão Especial do Ensino Médio, que iniciou seus trabalhos este ano na Câmara. Não podemos ignorar os diagnósticos já amplamente conhecidos. Estes resultados, desde o ensino fundamental até o médio, apontam para movimentações importantes que têm ocorrido ou devem acorrer na educação básica.
Portanto, devemos aprender com os resultados do Ideb, buscando entender melhor o que as médias escondem ou nos trazem de aprendizagem para garantir a oferta de uma educação de qualidade para todos, em todo o Brasil.
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