Autor do livro "O futuro chegou", falou no Senado sobre o futuro do trabalho
O sociólogo italiano Domenico de Masi, autor do famoso livro "O ócio criativo", é conhecido por fazer do ócio o ponto central de suas reflexões sobre o presente e futuro das sociedades. Ele defende a flexibilização do trabalho e a redução de jornadas como formas de melhorar a produção. Em passagem pelo Brasil, o também professor participou de uma audiência pública realizada pela Comissão Senado do Futuro sobre o tema "Cenários futuros nos próximos 50 anos".
Segundo ele, o futuro já chegou ao Brasil e o país pode oferecer a um mundo confuso, um novo e pouco conhecido modelo de vida. Ele acredita que hoje não há modelos a serem seguidos e, por isso, a civilização está desorientada. "O Brasil não é o melhor dos mundos possíveis, mas é o melhor dos mundos existentes", disse. Para ele, chegou a hora de o País mostrar uma formatação inovadora, uma vez que vem copiando há anos o modelo de trabalho europeu e americano, que agora enfrentam um perigosa crise.
O sociólogo observa que o modelo de vida brasileiro, comparado aos tantos outros, é certamente o mais humano, pois é aquele onde se pode cultivar melhor a amizade, o amor, a brincadeira, a beleza e a sociabilidade. Em sua opinião, essa busca constante pelo conhecimento e pela sabedoria é uma das boas características desse 'modelo brasileiro'. "Com características naturais, econômicas e antropológicas, o Brasil possui as qualidades para elaborar um modelo próprio de vida e para oferecê-lo ao mundo como contribuição à felicidade humana", frisou.
Tempo livre x trabalho - Em sua palestra, Domenico de Masi lembrou que há vários tipos de trabalho. Dos 6 bilhões de habitantes do mundo, somente 1,5 trabalham - o resto não conhece ou não tem acesso ao ritmo pós-industrial de trabalho", contabiliza. "Se a vida média útil de um ser humano tem hoje cerca de 530 mil horas, o tempo médio gasto com trabalho é de apenas 80 mil horas (considerando a jornada universal de 40 horas por semana). Restam 220 mil horas, passadas dormindo, e mais 220 mil horas livres, reservadas para a pessoa fazer o que lhe der na telha. Esse tempo pode ser aproveitado de maneira criativa, saudável e produtiva, no sentido mental e físico", ressaltou.
Quanto ao trabalho criativo, exemplificou, ele não para nunca, pois o intelectual precisa estar sempre atento ao mundo que o cerca. Como regra geral, De Masi defendeu jornadas semanais de 15 horas. "O trabalho é um vício, não uma virtude. Um vício imbuído pela religião, para compensar o pecado original. No paraíso não se trabalha", observou.
Na opinião do italiano o que falta hoje é a 'educação do tempo livre'. "Hoje um jovem de 20 anos deve ter pelo menos uns 70 anos de vida de conhecimento", frisou. Para ele, o futuro é condicionado pelo tempo livre e não pelo tempo trabalhado. "O problema da redução das horas é um fato inexorável. Temos que ficar atentos a isso", acrescentou.
Hoje, a força de trabalho é composta apenas por um terço de operários, outro terço de trabalhadores intelectuais em funções executivas (bancário, recepcionista etc.) e um último terço de funcionários com atividades criativas (jornalista, profissional liberal, cientista, etc.). As tecnologias substituem o trabalho humano: algumas (como um martelo pneumático) substituem o trabalho físico; outras (como o computador), substituem as atividades intelectuais. "Em ambos os casos as tecnologias possibilitam tempo livre, durante o qual o indivíduo se entedia ou se deprime se é inculto, se realiza e se diverte se é dotado de uma cultura adequada e se é educado para viver o tempo livre com interesse. O tempo livre é uma arte, e é preciso muito treinamento para aprender as regras".
Trabalho x atividade Intelectual - Para o sociólogo italiano, sempre utilizamos a palavra trabalho para definir todas as atividades operativas. Ele contou que pensou em um determinado momento em trocar a palavra trabalho. Pensou em dar um nome novo à atividade intelectual, deixando o termo "trabalho" apenas ao esforço físico. "Depois percebi que uma das principais diferenças entre o trabalho físico e a atividade intelectual é que esta possibilita, simultaneamente, trabalhar criando riqueza, estudar criando conhecimento, divertir-se criando o sentimento de bem-estar. Eu acredito que o trabalho é humano apenas se for inteligente e livre; se, enquanto o desenvolvo, divirto-me e aprendo", descreveu.
Futuro - Para Domenico de Masi, o futuro vai se resumir da seguinte forma: o trabalho ocupará apenas um décimo de toda a vida dos trabalhadores. As mulheres estarão no centro do sistema social. O mundo será mais rico, mas continuará desigual. A estética dos objetos e a cortesia nos serviços interessarão mais do que sua evidente perfeição técnica. A homologação global prevalecerá sobre a identidade local.
(Camila Cotta / SBPC)
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