3 de julho de 2015

HÉLIO SCHWARTSMAN Redução de danos


SÃO PAULO - Também sou contra a redução da maioridade penal e entendo a frustração da chamada ala progressista com a manobra de líderes que fez avançar, apenas 24 horas após uma rejeição, a proposta de emenda constitucional que permite julgar jovens de 16 anos como adultos. Parece-me bobagem, porém, apegar-se a minúcias regimentais para tentar barrar a medida.
Estamos numa democracia e não há muita dúvida de que a expressiva maioria da população é favorável à redução. A última pesquisa Datafolha sobre a matéria mostra que nada menos do que 87% dos brasileiros desejam encarcerar jovens infratores. A posição média dos deputados --67% dos presentes à sessão votaram a favor da PEC-- revela-se até surpreendentemente antipopular.
Assim, a menos que consideremos a fixação da maioridade aos 18 uma cláusula pétrea da Constituição, algo que me parece juridicamente difícil de sustentar, é questão de tempo até que a maioria consiga impor a mudança desejada. Se não for já, acabará sendo na próxima legislatura. A essa altura, acho que seria mais sábio admitir que a derrota é iminente e tentar negociar para que a emenda cause menos estragos.
No que diz respeito ao mérito da redução, ela me parece ruim porque representa um passo atrás em relação a um dos principais feitos da humanidade no período pós-iluminista. Considerada a escala histórica, que é a relevante, nossa espécie logrou reduzir dramaticamente os índices de violência nas sociedades ao mesmo tempo em que diminuiu também a severidade e o alcance das penas impostas a infratores, como mostra uma já vasta literatura que inclui autores como Steven Pinker e Michael Shermer. Para mudar o vetor de uma política que vem dando certo, seria conveniente pelo menos dispor de evidências empíricas, que não foram apresentadas. Mas a democracia, outra conquista histórica da espécie, tem dessas coisas mesmo.

Folha de S. Paulo, 3/7/2015

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