10 de novembro de 2015

A pobreza dos alunos justifica maus resultados na escola?

Opinião: 

09 de novembro de 2015
"Ao focar em demasia apenas o papel da escola, há o risco de criar um ambiente de pressão por resultados que não estão sob inteiro controle de professores e diretores", afirma Antônio Gois

Fonte: Blog do Antônio Gois - O Globo Online



A divulgação de novos resultados frustrantes a respeito do desempenho de alunos americanos no principal exame nacional de lá, o Naep, reacendeu o debate naquele país a respeito do impacto da pobreza no desempenho escolar. Como ocorre também aqui, grupos opostos procuram culpados para os maus resultados. Um dos argumentos mais citados por educadores mais à esquerda é que a crescente pobreza dos Estados Unidos é um dos fatores que mais explicam os resultados insatisfatórios, junto com a política, na opinião deles equivocada, de apostar numa cultura de testes e cobrança por melhores resultados em cada escola. Do outro lado, outros culpam a resistência de sindicatos e professores pelas mudanças mas, principalmente, argumentam que a pobreza não pode ser utilizada como desculpa.

Neste artigo publicado na revista Education Next, os pesquisadores Michale Petrilli e Brandon Wright, do instituto Thomas Fordham, se posicionam contrários ao argumento de que a pobreza é a principal explicação no caso americano. Um dos principais argumentos utilizados por eles é que os jovens de famílias mais ricas e escolarizadas nos Estados Unidos também têm desempenho inferior aos estudantes de mesmo perfil em outros países desenvolvidos quando comparados no Pisa, principal exame internacional de aprendizado, organizado pela OCDE. Ou seja, alunos do sistema educacional americano que não são afetados pela pobreza também ficam muito atrás dos jovens de outros países ricos.

Por coincidência, este assunto foi bastante debatido aqui no blog há duas semanas por causa de uma coluna sobre indicadores de escolas privadas brasileiras. Assim como os americanos, nossos jovens deelite também ficam muito abaixo dos demais alunos de nível socioeconômico semelhante em outros países.
Essa constatação, seja no caso brasileiro ou no americano, não significa que a pobreza seja desprezível. Pelo contrário, o que sabemos a partir de inúmeros estudos científicos é que seus impactos são brutais no desempenho de um aluno. Essa influência não é negada por nenhum dos lados sérios do debate. No artigo citado na Education Next, os autores começam por reafirmar o óbvio: a pobreza importa. “Isso não significa que crianças pobres não podem aprender, mas sim que há uma forte relação entre o aprendizado dos alunos e o nível socioeconômico das famílias”.

Ao menos entre os debatedores mais especializados, também não há ninguém, de um lado ou de outro, que diga que a pobreza apenas seja a responsável pelos maus resultados. No livro Reign of Error (sem tradução no Brasil), a historiadora Diane Ravitch, talvez a voz mais ouvida entre os críticos americanos da cultura de testes e responsabilização de escolas por maus resultados, escreve num capítulo em que lista inúmeras evidências de como a pobreza impacta o aprendizado que há “um falso dilema” na questão se o país deveria primeiro atacar a pobreza ou trabalhar antes para melhorar as escolas. Diz ela: “Nunca ouvi ninguém dizer que nossa sociedade deveria acabar com a pobreza antes de melhorar as escolas. As pessoas mais interessadas em ajudar as crianças e suas famílias falam em fazer as duas coisas ao mesmo tempo”.

O debate, ao menos aquele que acontece em mais alto nível, não acontece entre os que negam por completo o efeito da pobreza e os que dizem que tudo é explicado por ela. A diferença está na intensidade com que cada lado enfatiza o papel da escola ou dos fatores externos. Ao focar em demasia apenas o papel da escola, há o risco de criar um ambiente de pressão por resultados que não estão sob inteiro controle de professores e diretores. Por outro lado, se quase tudo se resume à pobreza e fatores externos, o que esperar das escolas? O argumento, levado ao extremo, pode dar margem a questionar que, se há muito pouco a fazer no âmbito escolar, por que investir para melhorar salários e condições de trabalho, dimensões que exigem mais recursos do poder público?

O desafio nessa discussão _como em qualquer outra que desperta paixões_ é achar um ponto de equilíbrio que reconheça as sérias limitações impostas às escolas por fatores externos sem criar um ambiente de conformismo e paralisia com resultados insatisfatórios. Para esse debate, não há respostas simples nem consensuais.

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