30 de agosto de 2017

Culpa de recorde brasileiro em abuso contra professor é nossa


Lucas Correia - 22.ago,17/Agência RBS/Folhapress
 INDAIAL, SC - 22.08.2017: PROFESSORA-SC - Um dia depois de ser agredida por um aluno de 15 anos na unidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA) de Indaial, em Santa Catarina, a professora de Língua Portuguesa Márcia Friggi tem no rosto as marcas da violência sofrida. (Foto: Lucas Correia/Agência RBS/Folhapress) **SOMENTE USO EDITORIAL** *** PARCEIRO FOLHAPRESS - FOTO COM CUSTO EXTRA E CRÉDITOS OBRIGATÓRIOS ***
A professora Marcia Friggi, agredida por aluno em Santa Catarina
Professores, você acham que sua profissão é valorizada pela sociedade?
Na Austrália, 38,5% dos docentes dizem que sim. No Chile, 33,6%. Na Finlândia, 58,6%. No México, 49,5%. Nos EUA, 33,7%.
No Brasil, o percentual cai para 12,6%, menos da metade da média de 34 países pesquisados e o oitavo menor percentual da amostra.
Professores brasileiros que concordam com a frase "eu perco bastante tempo com interrupções dos alunos durante a aula": 50% do total, a fatia mais alta entre o mesmo grupo de nações, 20 pontos percentuais acima da média.
Há muito barulho na turma em que você leciona? De novo, mais da metade dos docentes brasileiros diz que sim, outro recorde e o dobro da média.
Padrão parecido é registrado em perguntas sobre a percepção do esforço dos alunos para criar uma atmosfera agradável na sala de aula (muito baixa no Brasil) e sobre o tempo que os professores demoram para acalmar a turma antes de começar a aula.
E o que dizem os diretores sobre o comprometimento dos professores?
Diretores, os docentes desse estabelecimento chegam tarde pelo menos uma vez por semana?
No Brasil, 29,5% respondem que sim, quase o triplo da média de 10,9% e atrás apenas do Chile (34,5%).
O padrão é parecido em pergunta sobre absenteísmo: 17,6% dos diretores afirmam que os docentes brasileiros faltam pelo menos uma vez por semana, quase o quádruplo da média.
Diante desse cenário, retratado em uma pesquisa da OCDE, não é de espantar que, no Brasil, 12,5% dos diretores digam que professores e funcionários são intimidados ou abusados verbalmente por alunos pelo menos uma vez por semana.
O percentual é recorde entre as 34 nações desenvolvidas e emergentes analisadas no mesmo estudo, que englobou escolas públicas e privadas nos últimos anos do ensino fundamental e foi a campo em 2012 e 2013.
Para ter uma ideia da distância em relação aos demais países: no Chile, 6,3% dos diretores responderam que percebem esse tipo de comportamento agressivo de estudantes contra professores. Na Austrália, 9,7%. Na Finlândia, 3,6%. No México, 3%. Nos EUA, 4,7%.
Dados de um questionário respondido por professores brasileiros, no âmbito da Prova Brasil, compilados pelo movimento "Todos pela Educação" confirmam como a escola pode ser um ambiente hostil no país. Metade dos entrevistados afirmou ter ocorrido agressão —física ou verbal— de estudantes contra docentes ou funcionários no ano anterior.
O desrespeito —que às vezes termina em violência, como no caso da professora Marcia Friggi, agredida por um aluno na semana passada, é, em larga medida, fruto do descaso geral em relação à educação no Brasil.
A culpa não é só de um indivíduo ou de outro, mas da sociedade como um todo.
A pesquisa da OCDE traz evidências contundentes desse descaso.
Por um lado, os professores não se sentem valorizados pela sociedade. Um sinal de que devem estar certos é o mau comportamento dos alunos em sala de aula. Se fossem ensinados em casa sobre o valor da educação e a importância do docente, dificilmente agiriam dessa forma.
Por outro lado, o comprometimento dos próprios professores com a educação deixa muito a desejar, como mostram os números de absenteísmo e atrasos.
Os professores agem assim porque a sociedade não os valoriza? Ou a sociedade não os valoriza porque eles agem assim?
Difícil identificar causa original e consequência, mas certamente chegamos a um ponto em que um fator reforça o outro.
Sem uma mobilização de toda a sociedade pela valorização da educação, dificilmente sairemos dessa armadilha.
Nunca me esqueço do que li em "As Crianças mais Inteligentes do Mundo", da jornalista Amanda Ripley (Três Estrelas, selo editorial do Grupo Folha), sobre a campanha para valorização dos professores na Finlândia há algumas décadas.
Os sindicatos alardeavam: "Um professor finlandês recebeu o mais alto nível de educação do mundo".
Claro que políticas públicas para melhorar a formação dos professores e tornar o magistério mais atraente —como ocorreu no país europeu e em outras nações— são necessárias.
Mas é preciso que a sociedade pressione por isso. O apreço pela educação precisa se transformar num valor.
Um país é retrato das causas que abraça. E, como está mais do que comprovado na história, sem educação não há desenvolvimento econômico possível. 


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