9 de agosto de 2017

Pesquisas apontam educação como 'escudo' contra criminalidade

Estudos elaborados pelo TCE e por professor do Ipea apontam uma relação inversa entre o crime e o ensino. Quanto maiores são as taxas de escolarização, menores são os registros de violência.



Por Cristine Gallisa, RBS TV


Estudos elaborados pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS) e pelo professor Daniel Cerqueira, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), do Rio de Janeiro, apontam uma relação inversa entre o crime e a educação. Quanto maiores são as taxas de escolarização, menores são os registros de violência.
Cerqueira analisou a escolaridade das vítimas de homicídios no Brasil entre 1980 e 2010, e descobriu que quem estuda mais tem menos chances de morrer de forma violenta. Segundo o professor, a cada 1% a mais de jovens entre 15 e 17 anos fora da escola, a taxa de homicídio numa determinada localidade aumenta 2%.
"Percebemos que a chance de alguém que não tem o Ensino Médio sofrer homicídio no Brasil é 15,9 vezes maior do que alguém que tenha nível superior, o que mostra que a educação é um verdadeiro escudo contra os homicídios no Brasil", diz o pesquisador.
Desde esta segunda-feira (7), o RBS Notícias exibe uma série de reportagens sobre a relação da educação com a violência. Confira nesta terça-feira (8) como o governo pode investir no ensino diante da crise.
Na pesquisa do TCE-RS, realizada em municípios com mais de 100 mil habitantes, foram comparadas as taxas de escolarização e os registros de casos de violência. "Em municípios onde tinha maior taxa de abandono do [ensino] fundamental, a taxa de homicídio doloso é maior, e naqueles em que a expectativa de anos de estudo é menor, também havia maior numero de homicídios", explica a auditora pública externa do TCE, Débora Brondani da Rocha.
Números de apenados no estado corroboram a relação. Mais 60% sequer concluíram o ensino fundamental, pois trocaram as salas de aula pelas ruas por volta do quinto ou sexto ano. É justamente nessa fase da vida, aos 12, 13 anos de idade, que os adolescentes podem encontrar no crime a identificação e o acolhimento que deveriam ter sido proporcionados pela escola.
"O maior critério de sucesso educacional seria sabermos quantos alunos não deixamos no meio do caminho", diz o professor.
Na faixa dos quatro aos 17 anos, 151 mil crianças e adolescentes ainda estão fora da sala de aula, segundo o movimento Todos pela Educação. Por trás do abandono, há escolas defasadas e sucateadas, além de problemas sociais que cercam as periferias.
"Você não dissocia a questão da educação da criança da realidade da família. O crime não é uma situação isolada, é uma decorrência. Quando você chega ao sistema prisional, o sistema prisional é a parte final do desastre social brasileiro", afirma o advogado e professor Luiz Marcelo Berger.

Quase 800 escolas a menos

A falta de recursos e de infraestrutura na educação gaúcha é mais um obstáculo na luta contra o crime. Nos últimos 20 anos, 793 escolas foram fechadas no estado, como aponta o Conselho Estadual de Educação.
Neste período, o investimento público em educação no estado passou de quase R$ 6 bilhões em 1997 para R$ 9,7 bilhões em 2015. Ainda assim, o montante é inferior ao previsto em lei. Desde 2001, os governos gaúchos não cumprem a Constituição Estadual, que manda destinar 35% dos impostos para a educação. No ano passado, a proporção ficou em 29,28%.
Berger defende um maior investimento na área em curto prazo para melhorar a situação das escolas no estado. "No mínimo entre cinco a 10 anos, que a gente comece a ter resultado se fizermos investimento a partir de agora. E essa é a pergunta que temos de fazer, se esse investimento vai vir ou não. E nós vamos qualificar esse investimento ou não vamos? Ou seja, vamos analisar se aquilo dá resultado ou não?", questiona.

Verba elevada para segurança

Enquanto falta investimento para educação, o dinheiro dos impostos destinado pelos governos para a segurança deu um salto, chegando a mais de R$ 5 bilhões em 2016. Ainda que o Poder Público não poupe recursos para combater o crime, as estatísticas aumentam, provando que só repressão não diminui a violência.
Desde 2012, o número de presos no Rio Grande do Sul saltou de 29 mil para 34 mil. Para abriga-los propriamente, o estado teria de criar cerca de 9,4 mil vagas, o que acarretaria em gastos de R$ 500 milhões.
"Não há política pública que vai resolver o problema da criminalidade no Brasil em um prazo de dois três anos", diz o professor de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Rogério Maia Garcia.

'Masmorras medievais'

O diretor do Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados, José Vicente Tavares dos Santos, defende a educação em turno integral para evitar que os alunos. "As prisões não servem para nada, só para aumentar a capacidade criminal. As condições das prisões brasileiras, que são masmorras medievais, não ressocializam", disse.
Por cada preso cumprindo pena, o estado gasta hoje R$ 24 mil por ano, valor suficiente para manter três alunos em uma escola estadual. O gasto tem poucos resultados, já que o sistema penitenciário, sucateado e superlotado, recupera muito pouco. Cerca de 70% dos detentos de presídios do estado já haviam sido presos outras vezes.
"O Brasil prende muito, mas ao mesmo tempo prende mal, e se pensar em construir presídios para dar segmento a essa política de encarceramento em massa nós dificilmente vamos conseguir transformar isso em reflexos positivos, no que diz respeito à diminuição dos índices de criminalidade", diz Garcia.

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