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Marcos Cintra, economista da FGV e presidente da Finep |
Investir em ciência, tecnologia e inovação é fundamental para o desenvolvimento econômico. Não há dúvidas que, em meio à crise, o ajuste fiscal é necessário: porém, conforme fica claro no editorial "Ciência à míngua", publicado em 14 de agosto nesta Folha, é essencial que ambos caminhem juntos. Do contrário, o resultado será a estagnação de setores estratégicos, fundamentais para a economia.
É preciso rever a ideia de cortes lineares, prejudicando diretamente tais segmentos. Estudos recentes mostram que o retorno social dos gastos em áreas como ciência e tecnologia supera o de todas as outras.
Assim como saúde e educação, pesquisa e desenvolvimento são cruciais para o futuro do país. A necessidade de reduzir despesas é inegável, assim como a importância de se fazer escolhas entre as áreas a serem afetadas.
O orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), ao qual a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) é vinculada, é o menor desde o início do século.
Descontada a inflação, o valor autorizado para 2017, de R$ 3,2 bilhões, corresponde a apenas 37% do disponibilizado em 2010. Inserido no orçamento do MCTIC está o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que tem a Finep como secretaria-executiva e é historicamente a principal fonte de recursos para financiamento de pesquisas tecnológicas no Brasil.
O orçamento do Fundo, que já chegou a R$ 4 bilhões em anos anteriores, foi reduzido a R$ 1,2 bilhão este ano –sendo que o limite de execução autorizado é de metade deste total (cerca de R$ 630 milhões).
Uma das alternativas para retomarmos as atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) é a transformação do FNDCT —hoje fundo contábil— em fundo financeiro, de modo que seus valores, quando contingenciados, sejam capitalizados para usos futuros em ciência e tecnologia. Hoje eles são apropriados pelo Tesouro Nacional e utilizados para o pagamento da dívida pública e para o superávit fiscal.
Se essa medida tivesse sido implantada há 15 anos, com todos os contingenciamentos ocorridos nesse período, o FNDCT teria hoje um saldo acumulado de R$ 45 bilhões.
A Finep propôs uma mudança na lei que regula o Fundo, na tentativa de amenizar os graves impactos da crise sobre os investimentos públicos em pesquisa.
Atualmente, a Finep tem recursos para pagar os projetos de inovação já assinados no passado, mas não consegue investir em novos.
Como parte desse esforço, o MCTIC enviou recentemente à Casa Civil uma proposta que, se aprovada, faria o FNDCT começar 2018 já com R$ 9 bilhões em patrimônio e, até 2030, acumular R$ 50 bilhões, tornando-se, assim, uma fonte de investimentos em pesquisa totalmente autossustentável.
Com recursos do FNDCT, foi possível apoiar projetos estruturantes para o país, como o Reator Multipropósito Brasileiro (RMB) —no qual a Finep já investiu R$ 148 milhões—, que dará ao Brasil autonomia em radiofármacos; o Projeto Sirius de Luz Síncroton, que recebeu R$ 314 milhões da Finep e permitirá pesquisas de alto nível em temas como agronegócio, saúde, energias alternativas e novos materiais; e a infraestrutura de teste de propulsores de satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que contou com um aporte de R$ 6,3 milhões da Finep.
O tempo é precioso quando se fala de ciência e tecnologia. O investimento constante é necessário para que não nos afastemos da fronteira do conhecimento, independente do momento atual. Parar agora é ficar para trás. E o futuro não irá esperar pelo Brasil.
MARCOS CINTRA é doutor em economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular da Fundação Getulio Vargas. É presidente da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos)
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