Tenho falado aqui nesse espaço sobre a necessidade de reduzir desigualdades educacionais, e há uma razão para isso: os indicadores mostram que os resultados em educação são extremamente díspares quando saímos das médias e os olhamos, por exemplo, de acordo com o nível socioeconômico das famílias dos alunos – já comentamos como ele explica, em parte, esses resultados. Os dados mais recentes mostram que:
- No quartil (25%) mais rico da população, 51% das crianças de 0 a 3 anos estão em creches. No quartil mais pobre, apenas 22%.
- Dentre os jovens de 15 a 17 anos do quartil mais rico, 85% estão no ensino médio, idade adequada para a etapa, enquanto dos jovens do quartil mais pobre, apenas 50%.
- A diferença na proficiência em língua portuguesa atingida pelos 20% do nível socioeconômico mais baixo e os 20% do nível mais alto, no 5º ano do ensino fundamental, foi de 20 pontos em 2005 e aumentou para 42 pontos em 2013.
Entretanto, a desigualdade socioeconômica não pode jamais ser uma desculpa para aceitar que alunos mais pobres tenham resultados piores. Em vez disso, essas diferenças devem chamar nossa atenção para a necessidade de ações de longo prazo que tenham o compromisso de reduzir, anular ou compensar os efeitos negativos da pobreza.
É aí que entra a educação integral como política pública: uma forma de dar mais educação para quem parte de um patamar de desvantagem.
De forma geral, o que tem nas escolas de tempo integral que não tem nas escolas de jornada simples? Mais tempo exposição dos estudantes às situações de ensino.
Esse modelo, porém, não torna a educação, de fato, integral. De acordo com oCentro de Referências em Educação Integral, a educação é por definição integral quando:
- Atende a todas as dimensões do desenvolvimento humano.
- É articulada intersetorialmente
- Prevê a integração das mais diferentes frentes: esporte, cultura, assistência social, habitação, transportes, planejamento, etc.
Ou seja, além garantir os conhecimentos curriculares das disciplinas, a educação integral também deve apoiar o desenvolvimento dos estudantes nas dimensões ética, emocional, de relacionamentos, de habilidades importantes na escola e na vida.
Se nem toda escola em período integral pode ser considerada de educação integral, dificilmente vamos viabilizá-la com apenas quatro horas por dia – tempo que a maioria das crianças fica por dia na escola no Brasil.
Então, deveríamos priorizar a oferta de educação integral para as famílias mais pobres, certo?
Porém, de acordo com pesquisa recém divulgada pelo Cenpec e comentada por Maria Alice Setúbal em sua coluna no UOL, são os jovens com nível socioeconômico mais altos que tendem a ser matriculados nas escolas de educação integral. E isso não acontece apenas no Brasil. De acordo com a OCDE – organização que congrega países desenvolvidos e também alguns países em desenvolvimento – estudantes com nível socioeconômico mais alto têm mais acesso a aulas extras de matemática do que os alunos com nível socioeconômico mais baixo, e ficam duas horas a mais por semana fazendo lição de casa, por exemplo.
E por que é importante saber sobre esse assunto? Para cobrar do poder público mais ações contra a desigualdade. E por que ser fanático por equidade? Porque com isso ganhamos todos, eu, você, nossos amigos, nossos vizinhos, e, principalmente, as crianças, os jovens e o desenvolvimento do nosso País.
Até semana que vem!
PRISCILA CRUZ
Priscila Cruz é fundadora e presidente-executiva do movimento Todos Pela Educação. Graduada em Administração (FGV) e Direito (USP), mestre em Administração Pública (Harvard Kennedy School), foi coordenadora do ano do voluntariado no Brasil e do Instituto Faça Parte, que ajudou a fundar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário