(Artigo)
Há duas semanas, o Mundo debate a Brexit - a saída do Reino Unido da União Europeia: uma fuga do futuro, opção pelo passado, cuja prova é a votação expressiva dos idosos a favor da saída, e dos jovens pela permanência. A nós, brasileiros, isso não deveria espantar, porque há décadas preferimos o passado, no lugar do futuro. Em 2015, gastamos R$ 450 bilhões com o Regime Geral da Previdência Social e R$ 300 bilhões para a Educação de Base. Preferimos Olimpíadas e Copa a gastos com ciência e tecnologia.
Vivemos em um mundo cuja prosperidade assenta-se no conhecimento e na capacidade de inovação e, como escreveu o analista de planejamento Denis Barros, não seremos uma nação desenvolvida enquanto não tivermos um sistema público de ensino de qualidade, capaz de oferecer igualdade de oportunidade para todas as crianças, independentemente do seu endereço ou da renda de seus pais.
Por isso, precisamos dar início às transformações necessárias na educação básica para destravar e permitir o desenvolvimento de todo o potencial de nossas crianças e adolescentes. Não podemos mais conviver com indicadores que nos envergonham e nos deixam para trás.
Temos cerca de 2,8 milhões de crianças e adolescentes fora da escola, sendo mais de meio milhão vítimas do trabalho infantil. Metade de nossas crianças terminam a 4ª série do ensino fundamental sem saber ler e escrever corretamente; grande parte de nossas escolas não possuem bibliotecas qualificadas ou projetos de leitura. Não é de se admirar, portanto, que mais de 500 mil candidatos tenham obtido nota zero na redação do Enem. Apenas 54% das crianças que ingressam no ensino fundamental conseguem concluir o ensino médio até os 19 anos.
Denis Barros lembra que a baixa qualidade do ensino básico também se reflete no desempenho comparado entre os adolescentes brasileiros e os adolescentes de outros países que participam do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), que avalia estudantes de 15 anos em leitura, matemática e ciências.
O Brasil segue entre os últimos colocados (56ª posição) nesse ranking que conta com a participação de 65 países. Igualmente grave: este atraso na média ocorre com uma imensa desigualdade na educação, conforme a renda dos pais da criança.
O magistério segue desvalorizado não apenas quando comparado a outras carreiras, mas também na comparação com economias de mesmo porte. Entre os países membros da OCDE, a média salarial do professor é três vezes o salário do professor brasileiro.
A carreira do magistério hoje não é capaz de atrair nossos melhores talentos para sala de aula. Hoje, observa-se um crescimento no número de vagas ociosas nos cursos de licenciatura no país, o que mostra o desprezo do Brasil pelo futuro de nosso povo. A última estimativa do MEC apontou uma carência de 170 mil docentes nos níveis fundamental e médio no País.
Temos uma grande deficiência em infraestrutura. Entre os itens mais críticos estão laboratórios de ciências - presente em apenas 8,6% das escolas públicas de ensino fundamental e 43,9% de ensino médio - e quadras esportivas - presentes em apenas 31% de todas as escolas públicas. Fatores básicos, como acesso à água tratada e esgoto sanitário, ainda não são universais, sendo verificados, respectivamente, em 91,5% e 37,9% das escolas públicas.
Conforme o levantamento feito pelo movimento Todos pela Educação, com base no Censo Escolar de 2015, apenas 0,6% das escolas apresenta uma infraestrutura considerada completa e avançada, com sala de professores, biblioteca, laboratório de informática, quadra esportiva, parque infantil, além de laboratório de ciências e dependências adequadas para atender a estudantes com necessidades especiais.
O Brasil investe pouco mais de 6% do seu PIB em educação, pouco mais do que a média dos países da OCDE. O valor gasto anualmente por estudante ainda é baixo, pouco mais de R$ 6 mil por aluno. Isso equivale a 1/3 da média do gasto realizado pelos países da OCDE. Ademais, o gasto com educação básica no Brasil equivale a 1/4 do gasto por estudante realizado com a educação superior.
E talvez a maior vergonha e prova do desprezo ao futuro, em pleno século 21: 13 milhões de adultos em nosso país ainda são analfabetos, incapazes de reconhecer a própria bandeira por não saberem ler ao menos o lema "ordem e progresso".
O Brasil fez sua opção pelo passado, sua Braxit.
Cristovam Buarque - Professor emérito da UnB e senador pelo PPS-DF
Vivemos em um mundo cuja prosperidade assenta-se no conhecimento e na capacidade de inovação e, como escreveu o analista de planejamento Denis Barros, não seremos uma nação desenvolvida enquanto não tivermos um sistema público de ensino de qualidade, capaz de oferecer igualdade de oportunidade para todas as crianças, independentemente do seu endereço ou da renda de seus pais.
Por isso, precisamos dar início às transformações necessárias na educação básica para destravar e permitir o desenvolvimento de todo o potencial de nossas crianças e adolescentes. Não podemos mais conviver com indicadores que nos envergonham e nos deixam para trás.
Temos cerca de 2,8 milhões de crianças e adolescentes fora da escola, sendo mais de meio milhão vítimas do trabalho infantil. Metade de nossas crianças terminam a 4ª série do ensino fundamental sem saber ler e escrever corretamente; grande parte de nossas escolas não possuem bibliotecas qualificadas ou projetos de leitura. Não é de se admirar, portanto, que mais de 500 mil candidatos tenham obtido nota zero na redação do Enem. Apenas 54% das crianças que ingressam no ensino fundamental conseguem concluir o ensino médio até os 19 anos.
Denis Barros lembra que a baixa qualidade do ensino básico também se reflete no desempenho comparado entre os adolescentes brasileiros e os adolescentes de outros países que participam do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), que avalia estudantes de 15 anos em leitura, matemática e ciências.
O Brasil segue entre os últimos colocados (56ª posição) nesse ranking que conta com a participação de 65 países. Igualmente grave: este atraso na média ocorre com uma imensa desigualdade na educação, conforme a renda dos pais da criança.
O magistério segue desvalorizado não apenas quando comparado a outras carreiras, mas também na comparação com economias de mesmo porte. Entre os países membros da OCDE, a média salarial do professor é três vezes o salário do professor brasileiro.
A carreira do magistério hoje não é capaz de atrair nossos melhores talentos para sala de aula. Hoje, observa-se um crescimento no número de vagas ociosas nos cursos de licenciatura no país, o que mostra o desprezo do Brasil pelo futuro de nosso povo. A última estimativa do MEC apontou uma carência de 170 mil docentes nos níveis fundamental e médio no País.
Temos uma grande deficiência em infraestrutura. Entre os itens mais críticos estão laboratórios de ciências - presente em apenas 8,6% das escolas públicas de ensino fundamental e 43,9% de ensino médio - e quadras esportivas - presentes em apenas 31% de todas as escolas públicas. Fatores básicos, como acesso à água tratada e esgoto sanitário, ainda não são universais, sendo verificados, respectivamente, em 91,5% e 37,9% das escolas públicas.
Conforme o levantamento feito pelo movimento Todos pela Educação, com base no Censo Escolar de 2015, apenas 0,6% das escolas apresenta uma infraestrutura considerada completa e avançada, com sala de professores, biblioteca, laboratório de informática, quadra esportiva, parque infantil, além de laboratório de ciências e dependências adequadas para atender a estudantes com necessidades especiais.
O Brasil investe pouco mais de 6% do seu PIB em educação, pouco mais do que a média dos países da OCDE. O valor gasto anualmente por estudante ainda é baixo, pouco mais de R$ 6 mil por aluno. Isso equivale a 1/3 da média do gasto realizado pelos países da OCDE. Ademais, o gasto com educação básica no Brasil equivale a 1/4 do gasto por estudante realizado com a educação superior.
E talvez a maior vergonha e prova do desprezo ao futuro, em pleno século 21: 13 milhões de adultos em nosso país ainda são analfabetos, incapazes de reconhecer a própria bandeira por não saberem ler ao menos o lema "ordem e progresso".
O Brasil fez sua opção pelo passado, sua Braxit.
Cristovam Buarque - Professor emérito da UnB e senador pelo PPS-DF
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