5 de fevereiro de 2017

Meninas brilhantes

EDITORIAL, Folha de S. Paulo

05/02/2017 

Em seus 115 anos de existência, os prêmios Nobel foram conferidos a 881 pessoas. Nessa lista distinta aparecem os nomes de apenas 48 mulheres —uma delas, Marie Curie, ganhadora duas vezes, com a láurea de Física em 1903 e a de Química em 1911.
Curie representa o típico ponto fora da curva: cientistas, escritores e ativistas do sexo feminino raramente recebem o Nobel, em particular os de... Física e Química.
Além dela, só Maria Goeppert Mayer foi agraciada na primeira categoria. Na segunda, apenas outras três (Ada Yonath, Dorothy Hodgkin e Irène Joliot-Curie).
Uma única mulher foi escolhida para o Nobel de Economia, Elinor Ostrom. As demais 42 figuram nas listas de Medicina, Literatura e Paz.
Esses números dizem muito do lugar subalterno reservado a intelectos femininos nas ciências com forte componente matemático. A explicação padrão rezava que mulheres tinham menos aptidão para as abstrações desse campo de conhecimento, mas hoje se aceita que há aí mais ideologia que fatos.
Estereótipos, no entanto, adquirem a condição de realidades concretas quando se espalham e se alojam, como se fatos inquestionáveis fossem, nas mentes das pessoas. Pior ainda quando os próprios prejudicados se convencem de que sua natureza coincide com aquilo que a cultura lhes atribui.
Meninas, enfim, se afastam das carreiras em que sua alegada inaptidão para a matemática, ou uma suposta falta de inteligência em geral, traria grande desvantagem.
Estudo recente das universidades de Illinois, Nova York e Princeton publicado na revista "Science" mostrou algo preocupante: a passagem dos 5 para os 6 anos de idade parece decisiva para garotas introjetarem a noção de serem menos "brilhantes" que meninos.
Até os 5 anos, ao serem requisitadas a associar fotos de homens e mulheres com pessoas "muito inteligentes", elas atribuíam a característica indistintamente aos dois sexos. Acima disso, passou a manifestar-se um viés significativo em favor das figuras masculinas.
Atribui-se a Albert Einstein o dito de que é mais fácil romper um átomo do que um preconceito. Mas ele não disse que seja impossível, e aí está o exemplo da iraniana Maryam Mirzakhan —primeira mulher a receber a medalha Fields, considerada o "Nobel da Matemática", em 2014— para provar que não é, de fato e de direito.
Precisamos falar mais para as garotas de hoje sobre Mirzakhan, Curie e outras meninas que não acreditaram na explicação convencional e se determinaram a brilhar.

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