A conclusão da educação básica
entre os jovens de
18 a 29
[9 anos]
Rovena Rosa Agência Brasil
Em 2014, 14,7 milhões de jovens entre 18 e 29 anos não concluíram o ensino médio, a etapa final da educação básica e obrigatória no Brasil. Uma parte deles continua estudando no ensino fundamental e médio, mas a maioria abandonou a instituição escolar. É o que demonstra pesquisa realizada pelo Cenpec, que analisa dados oficiais sobre o tema no período entre 2005 e 2014.
A investigação ainda mostra que a baixa renda familiar, que impulsiona esses jovens a ingressar mais cedo no mundo do trabalho, deve ser considerada como um elemento importante, ao lado de outros, para compreender o abandono da escola. Mostra, além disso, que as relações étnico-raciais e de gênero também fazem parte desses elementos que podem explicar a evasão escolar dos jovens, pois ela é maior entre os negros e os estudantes do sexo masculino.
Para discutir essas conclusões, este informe:
- apresenta os dados que evidenciam a existência de um grande contingente de jovens que vem encontrando dificuldades para concluir a educação básica no País;
- mostra como parte do problema tem origem na própria ineficiência do sistema de ensino, evidenciado por suas altas taxas de distorção idade-série, resultantes, por sua vez, de uma forte cultura da repetência;
- traça um perfil que distingue esses jovens do restante da população;
- procura, com base nesse perfil, explorar elementos que podem auxiliar na apreensão de alguns dos entraves que os jovens encontram para a conclusão da escolaridade básica e obrigatória;
- finaliza, com base nos procedimentos de análise anteriores, com a discussão de subsídios que podem colaborar com o debate sobre políticas públicas para combater as formas de exclusão que caracterizam o abandono do ensino médio por parcela tão expressiva da juventude brasileira.
14,7 milhões
de jovens entre 18 e 29 anos não concluíram o Ensino Médio
!
Entre 2005 e 2014, aumentou o número de jovens de 18 a 29 anos que concluiu o ensino médio: ele passou de 18,8 para 23,7 milhões. Esses totais correspondem, respectivamente, a 46,8% e a 61,8% da população na faixa de idade.
Apesar desse avanço, ainda estamos longe de garantir o direito à conclusão da educação básica obrigatória para todos, marcada pelo término do ensino médio. É que partimos, em 2005, de um patamar muito baixo. Nesse ano, menos da metade dos jovens de 18 a 29 anos concluíam a educação básica. Em 2014, apenas um pouco mais da metade: cerca de 62% terminam a escolaridade básica e obrigatória. Isso significa que ainda quatro em cada 10 jovens na faixa etária não possuem o certificado de ensino médio (ver infográfico ao lado).
Dentre esses jovens, que não concluíram o Ensino Médio, há dois grupos:
- o daqueles que abandonaram a escola;
- o daqueles que continuam a estudar, seja no ensino médio, seja no fundamental.
A evolução de ambos os grupos entre 2005 e 2014 pode ser visualizada na Figura 1. Ela mostra que o grupo que abandonou a escola subiu 5 pontos percentuais (de 74% para 79%), e soma, atualmente, cerca de 14,7 milhões de pessoas. Proporcionalmente, mais jovens estão deixando de estudar.
Figura 1: Percentual da população de 18 a 29 anos que não concluiu a educação básica, e continua a estudar ou abandonou a escola (2005 e 2014)
Fonte: Elaborado pelo Cenpec com dados da Pnad/IBGE.
Dentre os não concluintes que continuam estudando, a distribuição da matrícula é a seguinte:
Figura 2: Nível de ensino cursado por jovens de 18 a 29 anos que não concluíram a educação básicaem 2014 e ainda estudam
Essas taxas de matrícula de jovens de 18 a 29 anos em níveis de ensino abaixo da faixa etária mostram que as escolas enfrentam problemas de baixa eficiência e qualidade, pois são altas as taxas de distorção idade-série encontradas nos níveis fundamental e médio, resultantes, sobretudo, da repetência. De acordo com dados do Inep (2016), essas taxas chegaram, no ensino fundamental, a 28,6%, em 2006, e a 20,0%, em 2014; no ensino médio, alcançaram 44,9%, em 2006, e 28,2%, em 2014.
Desse modo, as taxas de matrícula dos jovens de 18 a 29 anos evidenciam ainda que, apesar de terem excedido o limite etário da escolaridade obrigatória dos 04 aos 17 anos e das repetidas reprovações – que diferentes pesquisasmostram ser um fator que conduz a mais fracasso no aprendizado e mais distorção idade-série – os jovens tendem a ver sentido em permanecer na escola, nela insistem em ficar – . e as razões dessa insistência precisam ser mais bem pesquisadas.
São essas taxas de distorção idade-série que explicam, em grande parte, que jovens maiores de 18 anos ainda estejam matriculados, seja no ensino fundamental, seja no médio. Dito de forma direta, parte dos estudantes de 18 a 29 anos não conclui o ensino médio porque é retida pelas elevadas taxas de reprovação. Essas taxas são, predominantemente, a expressão da ausência de medidas – desenvolvidas pelas redes de ensino ou pelas próprias escolas – de prevenção dos problemas de ensino-aprendizado, bem como de recuperação do aprendizado. São também a expressão de uma forte cultura da reprovação, que considera a repetência uma solução para o aprendizado – apesar de a literatura sobre o tema mostrar que se trata de medida prejudicial ao processo de ensino-aprendizado, e que gera mais reprovação e insucesso escolar .
Quem são esses jovens que não concluíram o ensino médio?
Na maioria são homens, negros, trabalhadores e com baixa renda familiar
O perfil dos jovens que não concluíram o ensino médio e não voltaram a estudar aponta para uma maioria do sexo masculino (56,8%), negra (67,3%), de baixa renda (41,1% entre os 25% mais pobres, considerando a renda domiciliar) e de trabalhadores (65,8%).
Como também mostra estudo do Instituto Unibanco (2015), entre 2005 e 2014, aumentou a parcela de negros e pobres entre os que terminam a educação básica. Mesmo assim, quando se comparam as características dos que concluíram o ensino médio em 2005 e 2014 com aquelas dos que não concluíram, as relações entre as desigualdades escolares e as desigualdades sociais saltam aos olhos:
- Menos homens que mulheres concluem a educação básica: os percentuais de conclusão entre as mulheres são de cerca de 54% nos dois anos analisados;
- os concluintes possuem as mais altas taxas de emprego (formal ou informal) – em torno de 70% –; aqueles que não concluíram, mas ainda estudam, alcançam taxas de 45%; já os que abandonam a escola, alcançam taxas de 66%;
- apesar de as taxas entre os concluintes e os que abandonaram a escola serem próximas, os rendimentos auferidos pelo emprego são maiores para os primeiros, como se verá mais à frente;
- aumentou, entre os que não estudam ou entre os que estão matriculados, o percentual de jovens do sexo masculino: no caso dos que não estudam, era de 54,06% em 2005; alcançou 56,80% em 2014;
- no caso dos negros, cresceu tanto o percentual dos que abandonaram a escola (de 60,65% para 67,31%), como daqueles que, embora não tenham concluído a educação básica, ainda permanecem na escola (de 62,43% para 65,41%);
- entre os que concluíram o ensino médio e já fazem parte da população ativa, estar empregado é um benefício associado à conclusão do ensino médio: perto de 70% dos formados estão empregados. No caso dos que ainda estudam, exercer uma ocupação é um ônus, pois esse exercício é realizado concomitantemente à frequência à escola – o que obriga à difícil conciliação entre trabalho e estudo; é um ônus ainda maior para os que deixaram a escola sem concluí-la, pois dificulta o retorno a ela;
- a conciliação entre trabalho e estudo é muito difícil para a maior parte dos jovens, pois acabam por deixar a escola: 67,60% dos que não estudavam em 2005 eram trabalhadores, em ocupações formais ou informais; em 2014, eram 65,84%; entre os jovens que estudam e trabalham esses percentuais eram 53,31% em 2005 e 44,81% em 2014.
A baixa melhoria dos dados entre 2005 e 2014 mostra que o sistema educacional brasileiro segue reproduzindo desigualdades entre brancos e negros e entre ricos e pobres
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Tabela 1: Percentual de jovens de 18 a 29 anos que concluíram ou não o ensino médio por
gênero, relações étnico-raciais, emprego e total da população na faixa de idade
2005 e 2014 – Brasil
gênero, relações étnico-raciais, emprego e total da população na faixa de idade
2005 e 2014 – Brasil
Fonte: Elaborada pelo Cenpec com dados da Pnad/IBGE.
Notas: * Consideram-se como economicamente ativas no período de referência especificado (neste boletim, a semana) as pessoas ocupadas e desocupadas nesse período. O IBGE considera como ocupada no período de referência especificado a pessoa que tinha trabalho durante todo ou parte desse período. São incluídas também como ocupadas as pessoas que não exerceram o trabalho remunerado que tinham no período especificado por motivo de férias, licença, greve etc. Desocupadas são as pessoas sem trabalho que tomaram alguma providência efetiva de procura de trabalho no período de referência.
Como se indicou anteriormente, entre os estudantes da faixa etária aqui analisada que não concluíram o ensino médio, mas ainda frequentam a escola – cerca de 82% cursam o médio; 17% o fundamental; e 1% a alfabetização de jovens e adultos.
Entre os que não concluíram e abandonaram a escola, metade deles ainda precisa voltar ao ensino fundamental e a outra metade para o ensino médio. Isso pode se relacionar com políticas de correção do fluxo escolar, mais intensas nos anos iniciais do ensino fundamental e mais tímidas nos anos finais e no ensino médio. É que boa parte das medidas de correção de distorção idade-série tende a se concentrar no final dos três primeiros anos do ensino fundamental, muitas vezes identificado como Ciclo de Alfabetização, assim como nos momentos em que muda o modo de organização da escola de nível fundamental, como na passagem do 5º para o 6º ano.
O que dificulta a conclusão da educação básica?
É interessante notar dois dados aparentemente contraditórios: por um lado, os rendimentos recebidos do trabalho por aqueles que não concluíram o ensino médio e abandonaram a escola são maiores em relação aos que estudam e trabalham – porém, a renda mensal domiciliar do grupo dos primeiros – que deixaram a escola – é menor (veja a Tabela 2).
É possível inferir, então, que o trabalho desse jovem talvez seja importante para o sustento de toda a família e isso tanto estimularia o abandono da escola (pois seria necessário complementar a renda familiar), como dificultaria o retorno a ela (pois os jovens perderiam seus rendimentos – superiores aos dos que conciliam escola e trabalho). É o que se pode verificar analisando o rendimento mensal médio dos jovens de 18 a 29 anos.
Tabela 2: Distribuição dos jovens de 18 a 29 anos pela frequência à escola e rendimento
2005- 2014 - Brasil
2005- 2014 - Brasil
Fonte: Elaborada pelo Cenpec com dados da Pnad/IBGE.
À dimensão econômica, devem-se acrescentar duas de natureza social: uma relacionada às relações de gênero e outra às relações étnico-raciais. Elas parecem se combinar para criar uma situação que, por um lado, se organiza em torno do mito (e do estigma) da violência dessa juventude masculina e negra; por outro lado, não é sem frequência que uma cultura juvenil entre os jovens homens – muito pouco compreendida pela escola e que se faz marcar por certa exacerbação do masculino – está baseada em atitudes de confronto ou de oposição à cultura escolar, a sua linguagem, a sua autoridade.
Combinados ou não, esses elementos – sempre ligados à ineficiência do próprio sistema de ensino – parecem se conjugar para a construção do fracasso que recai sobre esses jovens. Aliás, um de fracasso, ao que tudo indica, do tipo misto, que conjuga características de estágios mais antigos dos sistemas de ensino com estágios mais atuais. Por um lado, esse fracasso se dá por formas explícitas de exclusão, cuja origem parece se encontrar tanto nas ineficiências do sistema, em suas elevadas taxas de repetência, como nas condições de vida dos jovens. Elas, ao que tudo indica, os pressionam muito cedo a ingressar no mundo do trabalho, a conciliar estudo e trabalho e a abandonar a escola. Por outro lado, porém, essas formas explícitas de exclusão parecem estar associadas a novos tipos de exclusão, denominadas pelos sociólogos Pierre Bourdieu e Patrick Champagne (1990), como formas “brandas” ou “suaves”, que se anunciam tardiamente, já no final da escolaridade básica, sem negação de matrícula ou expulsão.
Ao contrário: aparentemente, todas as chances foram dadas a esses jovens. Isto é, não lhes foram negadas explicitamente oportunidades de acesso e permanência na escola, mas foram excluídos no próprio interior da escola: pelo estigma que pesa sobre a juventude negra e masculina; pelas culturas que parcelas da juventude masculina constroem no quadro das relações de dominação masculina e que tendem a oferecer uma resistência à escola e à sua cultura. Diante dessa resistência, a instituição escolar tem respondido, muitas vezes, ora com indiferença, ora com violência, raramente com estratégias para modificar o sistema de crenças que sustenta essas culturas.
Trata-se, assim, de uma forma de exclusão que combina elementos internos e externos, tanto aqueles advindos das condições de vida dos jovens e de sua inserção no mundo, como da própria escola, de sua ineficiência, mas também do modo como se relaciona com o próprio jovem e com seu modo de estar no mundo.
Pontos para um debate público
Também o fato de que são os desistentes aqueles que pertencem a famílias com renda mais baixa e que – podemos deduzir – são precocemente direcionados para o mercado de trabalho para aumentar essa renda mostra o quão são necessárias políticas focalizadas para essa faixa da população para retê-la na escola. Entre a necessidade de responder à urgência dos desafios colocados pelas precárias condições de vida, de um lado, e um futuro relativamente distante e incerto prometido pela escola, é uma “escolha forçada” que se impõe a esses jovens: a entrada no mundo do trabalho. Dessa dedução, duas importantes direções para essas políticas focalizadas: esses jovens precisam de recursos para permanecer na escola; por outro lado, essa escola precisa estar articulada ao mundo do trabalho de uma forma muito estreita, permitindo que os estudantes possam gerar renda sem pôr em risco seus estudos e sem que – como experimentamos no passado – esses estudos impliquem a terminalidade de sua formação e o abandono de suas aspirações.
Algo semelhante se passa com o ensino noturno. Evidentemente, não é a melhor forma de cursar uma etapa da educação básica. Pensando, porém, a curto e médio prazo, é certo essas escolas são necessárias para os alunos que trabalham ou que intuem que, em algum momento de sua escolarização, essa necessidade virá. Infelizmente, a escola noturna que temos é, na maior parte das vezes, uma reprodução da escola de período diurno sem as necessárias condições de funcionamento da anterior. É preciso criar um novo modelo de escola noturna, que atenda às peculiaridades do aluno trabalhador, que utilize de modo adequado os tempos e o espaço e que tenha uma proposta que guarde sua especificidade, mas, ao mesmo tempo, esteja integrada ao ensino médio em geral e às possibilidades de continuidade dos estudos.
Algo de semelhante se dá com a Educação de Jovens e Adultos. Muitos viveram a ilusão de que a EJA estaria condenada à extinção, com a diminuição do analfabetismo e uma suposta crescente melhoria da eficiência do ensino regular. Estes se enganaram duas vezes: primeiro, porque as mudanças no mundo contemporâneo cada vez mais exigem uma educação permanente e o fortalecimento das instituições encarregadas de promovê-la; em segundo lugar, porque a esperada aposta na eficiência de nosso sistema educacional não se realizou na velocidade esperada e continuamos – ainda que com avanços – a excluir – do interior mesmo da escola – novos excluídos, de um tipo pior, porque aparentemente tiveram acesso à matrícula, à frequência, a todas as oportunidades de sucesso, mas supostamente fracassaram – ao contrário do que mostra a análise aqui realizada – por sua própria culpa. Assim, a Educação de Jovens e Adultos, sob novos paradigmas, é um campo de ação a ser explorado, ao lado dos elencados anteriormente, para não somente concluir a escolarização e a capacitação desses jovens, mas também resgatar a dignidade que nossa sociedade, com a contribuição de nosso sistema de ensino, lhes negou.
Além disso, estamos diante de estigmas e preconceitos que agem duplamente sobre a vida escolar desses jovens, tanto na escola como fora dela: nossa sociedade busca forçá-los a um aprendizado que implica a internalização de uma suposta inferioridade e incapacidade. Por serem homens, devem aprender a se comportar como tais: fundamentalmente, a recusar tudo que, em nossa cultura, possa estar associado ao feminino. Não somente a escola, que se oporia à vida livre da rua, do trabalho, do grupo, da turma, de uma cultura do risco e do perigo – mas também a própria linguagem que a sustenta e organiza o conhecimento que ela busca transmitir –, ela seria certa demais, excessivamente correta, daria preferência aos eufemismos, em detrimento da língua crua da rua e dos homens. A leitura, a escrita, a letra bem feita, o capricho, a organização, a obediência a regras, as restrições ao questionamento e à discussão – tudo seria “feminino” demais para esses jovens que vivem numa sociedade, como a brasileira de hoje, que interdita, até mesmo no interior da própria escola, o debate sobre as relações de gênero, seu papel na dominação masculina e, especialmente, o peso e as restrições que essa dominação exerce sobre os próprios homens, sobretudo sobre os jovens. Por último, por serem negros, devem, com a conivência ou não com os não negros, aprender seu lugar: não serem aqueles chamados para dar respostas às perguntas dos professores; não serem aqueles valorizados no cotidiano escolar; e assim acostumarem-se à invisibilidade do sucesso e à confirmação do fracasso.
É somente quando nossas redes de ensino enfrentarem sem falsa pudicícia e com grande seriedade as questões ligadas às relações étnico-raciais e de gênero, por meio de uma política clara e articulada, sabendo comunicar o problema à sociedade e assumindo o caráter laico de sua escola pública, que poderemos começar a enfrentar essa situação que condena tantos ao fracasso na escola e a um futuro menor.
Há, ainda, o currículo. É certo que, proximamente, teremos uma Base Nacional Comum Curricular. Mas, como o nome bem diz, trata-se de uma base. Ela é um ponto de partida para que as unidades da Federação façam seus documentos curriculares, e as escolas, seus projetos pedagógicos. É especialmente no caso desses projetos que os currículos passam a ganhar vida, pois é então que um conjunto de conhecimentos gerais, de natureza comum, vai, em primeiro lugar, associar-se a conhecimentos e saberes de natureza específica. Por um lado, são conhecimentos que fazem parte de uma demanda local – originada de uma história, de uma conjuntura, de uma busca de saber, ganhando uma perspectiva política, econômica, cultural e pedagógica. É esse horizonte que, em parte, permite para os jovens (mas também para os docentes) que conteúdos curriculares ganhem sentido. Em segundo lugar, por outro lado, cada escola ou grupo de escolas está firmemente ancorado num território social, cultural, político – imerso numa cultura a ela preexistente. Cabe à escola também não meramente valorizar essa cultura, mas contribuir para tornar esse conjunto de saberes parte dos saberes sistematizados à luz das disciplinas científicas, linguísticas e artísticas, a fim de que também integrem o patrimônio não somente dessa comunidade, mas do próprio País (para compreender como o Cenpec se posiciona sobre a Base Nacional Comum e vê sua especificidade, bem como suas relações com os documentos curriculares estaduais e municipais e com os projetos pedagógicos das escolas, vejanosso Posicionamento).
Por último, os projetos pedagógicos dão vida aos currículos porque dão mais um e fundamental passo no processo educacional: se os currículos em geral elencam o resultado de um consenso em torno de conhecimentos relevantes para a formação humana, resta fazer um poderoso trabalho sem o qual a transmissão pedagógica se quebra: associar esses conhecimentos à experiência prévia dos alunos, bem como à ampliação de suas perspectivas de futuro. É somente assim que um currículo pode começar a fazer sentido para um jovem ou aluno: quando ele integra o campo de suas experiências passadas e de suas expectativas futuras.
Sobre o estudo
Este boletim é parte de uma pesquisa mais ampla desenvolvida pelo Cenpec, com apoio da Fundação Tide Setubal. Intitulada “Políticas para o ensino médio no Brasil: os casos do Ceará, Pernambuco, Goiás e São Paulo (2005-2014)”, a investigação tem por objetivo apreender as principais características das políticas voltadas para esse nível de ensino implantadas no País, suas repercussões para a qualidade e a equidade, bem como as respostas que elas dão a escolas localizadas em regiões de alta vulnerabilidade social.
Desenvolvida sob a coordenação do Cenpec, foi realizada conjuntamente com equipes de pesquisadores que desenvolveram o trabalho de campo e análise de dados nos quatro estados considerados.
Neste boletim, o Cenpec escolheu olhar para a população entre 18 e 29 anos porque, apesar de o País ter avançado na última década, ainda há um número significativo de jovens que não termina a educação básica na idade considerada adequada (até os 17 anos).
Além disso, há uma taxa maior de desemprego (12,2%) entre as pessoas de 18 a 29 anos do que as que estão entre os 30 e 49 anos (4,6%) ou com 50 anos ou mais (2,4%), segundo dados da Pnad/IBGE. O maior desemprego entre jovens, especialmente entre 15 e 24 anos, parece ser um fenômeno estrutural da economia brasileira e se associa com a baixa escolaridade desses indivíduos, o que por sua vez também dificulta a obtenção de emprego formal (CORSEUIL et al., 2012).
Este estudo utilizou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad/IBGE) de 2005 a 2014 e realizou uma análise descritiva da população de interesse mencionada para apreender as características sociais daqueles que não concluem a educação básica, em comparação com aqueles que concluem. Com isso, buscaram-se levantar elementos para compreender razões que influenciam a não conclusão, para, desse modo, reunir subsídios para a orientação de políticas públicas que auxiliam a enfrentar o problema em sua complexidade.
Para aprofundar
Sobre os impactos negativos da reprovação
ALMEIDA, Aléssio Tony Cavalcanti de. Determinantes dos piores e melhores resultados educacionais dos alunos da rede pública de ensino fundamental no Brasil. Planejamento e políticas públicas, n. 42, p. 147-187, jan./jun. 2014.
SOARES, Sergei Suarez Dillon. A repetência no contexto internacional: o que dizem os dados de avaliações das quais o Brasil não participa? Texto para discussão, n. 1.300, Brasília, IPEA, ago. 2007.
______. Os fatores que determinam o sucesso educacional. Pesquisa e planejamento econômico, v. 32, n. 3, dez. 2002, p. 285-394.
Relações de gênero e estilos de vida
BOURDIEU, Pierre. Você disse popular? Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, Associação Brasileira de Pesquisa em Educação, n.1, p. 16-26, Jan/abr, 1996.
WELZER-LANG, Daniel. A construção do masculino: dominação das mulheres e homofobia. Estudos feministas, n. 2, 2001, p. 461-482.
INSTITUTO UNIBANCO. Quem são os jovens fora da escola. Aprendizagem em foco, São Paulo, Instituto Unibanco, n. 5, fev. 2015.
______. Acesso ao ensino médio melhora, mas níveis de aprendizado são preocupantes. Aprendizagem em foco, São Paulo, Instituto Unibanco, n. 2, nov. 2015.
Currículo
CENPEC. A garantia do direito a uma educação de qualidade e de uma escola mais justa. Posicionamento do Cenpec a respeito da proposta de uma BNCC. São Paulo: Cenpec, 2015. Disponível em: <http://www.cenpec.org.br/wp-content/uploads/2015/08/PosicionamentosCenpecBase.pdf>. Acesso em: 20 Jun. 2016.
CENPEC. Ensino médio, qualidade e equidade: avanços e desafios em quatro estados: CE, GO PE e SP. Informe de pesquisa. Cenpec: São Paulo, 2015. Disponível em: <http://www.cenpec.org.br/wp-content/uploads/2016/02/Informe_Jornalista.pdf>. Acesso em: 20 Jun. 2016.
YOUNG, Michael F. D. Por que o conhecimento é importante para as escolas do século XXI?. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 46, n. 159, p. 18-37, Mar. 2016. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742016000100018&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 20 Jun. 2016.http://dx.doi.org/10.1590/198053143533.
Situação educacional dos jovens brasileiros
SANTOS, Robson dos. Os desafios da meta 8 do PNE: juventude, raça/cor,renda e territorialidade. PNE em movimento,n.2, 2016.
Referências
BOURDIEU, Pierre; CHAMPAGNE, Patrick. Os excluídos do interior. In:______; NOGUEIRA,Maria Alice; CATANI, Afrânio (orgs). Escritos da Educação. Petrópolis: Vozes, 1990. p. 218-227
CORSEUIL, C. H. et al. The effects of a youth training program on youth turnover in Brazil. Working paper n. 42 daReap, jun. 2012. Disponível em: <http://reap.org.br/wp-content/uploads/2012/06/042-The-Effects-of-a-Youth-Training-Program.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2016.
INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUSAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA (INEP). Indicadores educacionais. 2016. Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/indicadores-educacionais>. Acesso em: 2 fev. 2016.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. 2014. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2014/microdados.shtm>. Acesso em: 2 fev. 2016.
INSTITUTO UNIBANCO. Acesso ao ensino médio melhora, mas níveis de aprendizado são preocupantes.Aprendizagem em foco, São Paulo, Instituto Unibanco, n. 2, nov. 2015. Disponível em:<http://www.institutounibanco.org.br/aprendizagem-em-foco/2/>
Realização
Coordenação de Desenvolvimento de Pesquisas e Assessoria de Comunicação
Editoração eletrônica
Alba Cerdeira
Os "informes Educação & Equidade” comunicam resultados de estudos e pesquisas desenvolvidas pelo Cenpec com o objetivo de incidir no debate público, em práticas pedagógicas e políticas educacionais que reduzam as desigualdades e promovam equidade.
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