15 de março de 2017

Cada dólar investido na pré-escola pode se multiplicar por sete


Raquel Cunha - 27.jul.15/Folhapress
JARINU - SP - BRASIL - 27.07.2015 - Creche de crianças de 1 até 6 anos. Crianças entre 3 e 4 anos brincam com celular. (Foto: Raquel Cunha/Folhapress, SUP-ESPECIAIS) ***EXCLUSIVO***
Crianças em creche em SP; investimento em educação infantil aumenta empregabilidade futura
O investimento em pré-escolas públicas de qualidade traz ganhos enormes não apenas para as crianças de baixa renda atendidas e suas famílias mas para a sociedade como um todo.
É o que tem mostrado, incansavelmente, o americano James Heckman, Prêmio Nobel de Economia em 2000, com pesquisas realizadas ao longo da última década.
Em um estudo recente, o economista fez uma análise minuciosa dos retornos de dois programas de educação infantil adotados nos Estados Unidos na década de 1970, o Carolina Abecedarian Project (ABC) e o Carolina Approach to Responsive Education (Care).
Ele e seus três coautores concluíram que cada dólar investido nos dois projetos gerou US$ 7,3 em benefícios que incluíram desde a maior empregabilidade —e, portanto, menor dependência de serviços sociais— dos beneficiários já na vida adulta até seu menor envolvimento com crimes.
As meninas atendidas aumentaram em 13 pontos percentuais sua probabilidade de terminar uma graduação quando comparadas a outras garotas de origem familiar parecida que não participaram do programa. A chance de estar empregados aos 30 anos aumentou entre 11 e 19 pontos percentuais no caso dos meninos beneficiados.
Em ambos os grupos, fatores como menor envolvimento com drogas e melhores indicadores de saúde também foram identificados.
Embora envolva a realização de cálculos e estimativas complexos, esse tipo de análise tem se tornado viável em países onde é comum que beneficiados por projetos sociais sejam acompanhados ao longo de sua vida.
Os registros servem de insumo para que pesquisadores como Heckman se debrucem sobre os dados e cheguem a conclusões úteis do ponto de vista de política pública e, algumas vezes, até surpreendentes.
O próprio Nobel de Economia descobriu que outro projeto, criado na década de 1960, em Michigan, atirou no que viu e acertou no que não viu.
O chamado Perry Preschool tinha como meta principal aumentar o QI das crianças socialmente vulneráveis atendidas. Para a frustração de seus idealizadores, isso até aconteceu num primeiro momento, mas poucos anos depois não eram mais encontradas diferenças significativas no coeficiente de inteligência das crianças participantes quando comparadas a outras, vindas de contextos parecidos, que tinham ficado de fora do Perry.
Apesar disso, quando cresceram, as meninas e os meninos participantes começaram a exibir indicadores impressionantes de sucesso tanto escolar quanto pessoal e profissional em relação aos demais.
Heckman descobriu que os efeitos positivos do Perry vinham de traços de personalidade que o programa ajudou as crianças a desenvolver, como curiosidade, autocontrole e facilidade de relacionamento com os demais.
Essas habilidades, normalmente chamadas de socioemocionais, também são trabalhadas no ABC e no Care, que buscam estimular a resolução de conflitos entre as crianças e sua capacidade de tomar decisões.
Achados acadêmicos nem sempre conversam com a realidade cotidiana, as dificuldades e as barreiras que formuladores de políticas públicas e educadores encontram no dia a dia.
Contextos culturais, sociais e econômicos diversos também podem dificultar a replicação de experiências bem-sucedidas.
Mas isso não significa que pistas e conclusões de pesquisas como as de Heckman não devam ajudar a nortear decisões.
No Brasil, em meio ao limite imposto à expansão dos gastos do governo nos próximos anos, talvez seja necessário repensar prioridades.
Nossos investimentos públicos no ensino superior ainda são quase o dobro do que na educação infantil (como proporção do Produto Interno Bruto). Embora decrescente ao longo da última década, a diferença de gasto por aluno no ensino universitário ainda é 3,7 vezes maior do que por criança na pré-escola.

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