22 de agosto de 2013

Violência no mundo jovem

Participação de dois menores e um rapaz de 18 anos em assassinato no Guará reabre a discussão da crise de valores entre adolescentes. Para especialistas, o desprezo pelo próximo é comum em uma sociedade de consumo como a atual
THAÍS CIEGLINSKI, Correio Brasiliense, 22/8/2013

O episódio em que dois adolescentes -- uma menina de 17 anos e um garoto de 15 -- e um rapaz de 18 confessaram ter queimado vivo, na madrugada de 1º de agosto, o carroceiro Edvan Lima da Silva, reaviva na memória outros casos trágicos que envolveram jovens de classe média da capital, como a morte do índio Galdino de Jesus, em 1997; e os assassinatos dos estudantes Marco Antônio Velasco, em 1993, e João Cláudio Cardoso Leal, em 2002. "Moramos em um lugar muito diferente, em que a pobreza e a riqueza ocupam espaços diferentes. Isso, muitas vezes, pode impedir algumas pessoas de verem o outro como pessoa", analisa a socióloga Miriam Abramovay, que coordena o Setor de Pesquisas da Flacso.
Apesar de a participação dos adolescentes no mundo do crime crescer de forma preocupante no Distrito Federal -- somente nos cinco primeiros meses de 2013, pelo menos 168 cometeram homicídios --, a presença de jovens de famílias com boas condições financeiras e acesso a bens materiais nesse cenário desperta outro tipo de questionamento. Para Renato Barão Varalda, promotor da Infância e da Juventude do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, o envolvimento de filhos da classe média em episódios de tamanha violência é excepcional. "Vivemos, hoje, em uma sociedade de consumo em que as pessoas têm perdido a noção de valores. Em casos assim, precisamos descobrir quais falhas de educação ocorreram", acredita.
A psicanalista Júnia de Vilhena concorda com o promotor e destaca que episódios como o que ocorreram no Guará são, de certa forma, reflexo da sociedade atual, em que um morador de rua é visto como "lixo". Para a especialista, não é possível isentar pais e mães pelo ato cometido pelos filhos. "Trata-se de uma patologia de caráter, e as famílias são responsáveis, pois autorizam esse tipo de comportamento", observa.
Antes de completar 18 anos, Wesley, um dos suspeitos de matar Edvan, foi apreendido por tráfico, roubo, receptação, desacato, desobediência, dano e porte de drogas. O jovem de 15 também já havia enfrentado problemas com a Justiça por ter cometido os seguintes atos infracionais: ameaça, desacato, desobediência, receptação, roubo e porte de drogas. A garota que o acompanhava na noite do crime e confessou ter derramado o combustível nas vítimas era a única com ficha limpa.
Punições
Apesar de terem arquitetado e executado o mesmo crime, os três envolvidos terão punições distintas, conforme prevê a legislação brasileira. O jovem de 18 anos responderá por homicídio qualificado e três tentativas de homicídio e, em caso de condenação, pode pegar até 30 anos de cadeia. Já os adolescentes ficarão sob a tutela do Estado por, no máximo, três anos. De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os dois cometeram um ato infracional análogo ao crime de Wesley. Mas Vicente Faleiros, professor do Departamento de Serviço Social da Universidade de Brasília e coordenador do Centro de Referência, Estudos e Ações Sobre Crianças e Adolescentes, não acredita que isso seja uma indicação de uma punição menor. "O ECA não passa a mão na cabeça de ninguém, ao contrário, pune atos graves imediatamente. Os adultos podem responder ao processo em liberdade, o adolescente, não", observa.
168
Total de homicídios praticados por adolescentes no DF nos cinco primeiros meses de 2013

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