26/09/2016 06:00
Os péssimos indicadores do ensino médio no Ideb serviram de justificativa para o MEC apresentar, via medida provisória, uma reforma no setor. Os dois números mais citados para justificar a prioridade dada a esta etapa de ensino são o baixo aprendizado e a alta evasão. Quanto à primeira dimensão, há alguns indicadores que reforçam o argumento de que o problema é mesmo urgente e mais grave nesta etapa do ensino, o que não significa dizer obviamente que não ele não exista nas etapas anteriores.
A série histórica do Sistema de Avaliação da Educação Básica mostra que as médias dos alunos que terminam o ensino médio em matemática e português foram menores em 2015 do que em 1995. Ou seja, alunos que se formam hoje aprendem menos do que aqueles que estavam na escola há 20 anos. Testes não medem tudo, mas não faltam outros indicadores a apontar que temos sim sérios problemas, como demonstram pesquisas de opinião feitas com jovens, estatísticas de reprovação, e indicadores coletados já fora da escola.
No caso da evasão, porém, o diagnóstico da maior gravidade no ensino médio é equivocado ou, no mínimo, impreciso. Um número comumente divulgado para tratar do problema da falta de atratividade é o registrado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE, que indica que há 1,65 milhão de jovens de 15 a 17 anos fora da escola. O erro mais comum na interpretação deste número é deduzir que todo o problema está no ensino médio, já que esta é a faixa etária em que os jovens deveriam estar matriculados no antigo segundo grau.
Uma análise mais cuidadosa revela que uma parte deste problema é, na verdade, uma boa notícia. No universo de 1,65 milhão fora da escola dos 15 aos 17 anos, há 316 mil jovens que já concluíram o ensino médio. Não são, portanto, adolescentes que evadiram, mas sim um seleto grupo que terminou esta etapa adiantado ou na idade certa.
Tirar esse grupo da conta da evasão do ensino médio é necessário, mas não acaba com o problema, afinal, ainda restam cerca 1,3 milhões de jovens fora da escola dos 15 aos 17 anos. Só que quase dois terços (64%) desses 1,3 milhão de jovens que não mais estudam nessa faixa etária abandonou a escola antes de completar o ensino fundamental. São, portanto, 862 mil adolescentes que sequer ingressaram no ensino médio. Resumindo, o que os números relativos a essa faixa etária indicam é que a grande evasão desse grupo está concentrada no segundo ciclo do ensino fundamental (o que não significa que o problema também não exista no ensino médio). Por melhor ou pior que seja a reforma do ensino médio proposta pelo MEC, o indicador de abandono da escola até os 17 anos de idade será muito pouco afetado se não olharmos com bastante atenção também ao que acontece antes.
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Em 17 de setembro de 2007, ao abrir um seminário na Câmara dos Deputados, o então ministro da educação Fernando Haddad afirmou que o ensino médio vivia uma “crise aguda”. O diagnóstico não era novo, mas naquele dia o MEC sinalizava que era preciso discutir um novo currículo e uma nova estrutura. É triste constatar que não fomos capazes nesse tempo todo de construir pelas vias mais democráticas possíveis um novo modelo, que já estivesse em vigor. Mas é triste também que uma reforma sobre um assunto tão importante quanto este tenha sido implementada via Medida Provisória.
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Sobre alguns temas da base e o formato da MP, veja aqui comentário que fiz para a rádio CBN na sexta. Meu ponto mais importante na conversa foi alertar para o risco de tentar fazer uma reforma dessa via MP. Também argumento que ainda há muita coisa a definir. E lembro que a proposta de flexibilização já constava do projeto de lei que tramitava no Congresso. E que há outros riscos que não são desprezíveis.
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