
Assim, meu bom velhinho, volto a lhe escrever. Sei que meus pedidos são complexos em era de incertezas, em sociedade voltada para o consumo, estimulada pela mídia e com o uso inapropriado dos recursos naturais do planeta. Tenho plena consciência de que as transformações para a conquista de uma verdadeira civilização humana são lentas. No entanto, devemos avançar e avançar todos os dias, retroceder nunca.
Por favor, compreenda a minha insistência e dê atenção especial a essa nova carta. Os pedidos anteriores coincidem com o clamor das ruas que revela profunda insatisfação popular, demandando, entre outras coisas, por transporte público decente, educação de qualidade para todos, empregos justos e promoção da saúde de qualidade, sem exclusões e privilégios. Os meus pedidos são legítimos e certamente expressam desejo coletivo. Acrescento a eles dar um pouco de sabedoria aos homens e mulheres para que possamos construir um mundo com paz duradoura, onde o diálogo possa vencer o fanatismo e que a ação cotidiana de cada um seja no sentido de proporcionar felicidade para todos.
A criança que nunca deixei de ser me faz ainda confiar em você. Com o seu poder mágico de realizar os nossos sonhos para transformar a utopia em realidade. Você é a figura central do Natal que é uma data mágica onde podemos sonhar e conspirar em favor da solidariedade, da generosidade e da bondade para conquistarmos convivência virtuosa entre os seres humanos.
No Natal, renasce em nós a esperança de termos um verdadeiro mundo civilizado. Não podemos perder a esperança. O Natal não é data e sim estado de espírito que nos ilumina na escolha de caminhos para que possamos ser realmente humanos. É oportuno lembrar o pensamento de Charles Dickens que honraria o Natal no seu coração para conservá-lo durante todo o ano. Seria tão bom se todos os dias do ano fossem iguais ao Natal. Teríamos todos os dias iluminados pelo afeto e pelo amor. Teríamos as famílias festejando reunidas e amigos se reencontrando.
As mesas seriam fartas para todos. A solidariedade permearia as relações humanas, permitindo convívio harmônico e feliz. Seríamos felizes sem motivo, o que, segundo Carlos Drummond de Andrade, é a mais autêntica forma de felicidade. Meu bom velhinho, desculpe novamente pelos desabafos, desejos e fantasias. Mas, como diz a sabedoria popular, o maravilhoso da fantasia é nossa capacidade de torná-la realidade. Vou ficar observando o céu nas próximas noites, com a esperança de ver uma estrela cadente e ouvir alegre ho-ho-ho, que será o sinal da chegada de melhores dias para o nosso Brasil e para todo o planeta. Esse será o melhor presente de Natal para todos. Espero que a próxima carta seja só de agradecimentos e comemorações.
» ISAAC ROITMAN Professor emérito e coordenador do Núcleo de Estudos do Futuro da Universidade de Brasília e membro da Academia Brasileira de Ciências
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