11 de setembro de 2014

Universidade com aspas


No Brasil, instituições de ensino superior com perfis distintos recebem o mesmo nome; rankings devem buscar captar essa diferença

O Ranking Universitário Folha (RUF), na terceira edição, deixa evidente que o sistema de ensino superior brasileiro prossegue esquizofrênico. Por aqui se chamam de universidades instituições com perfis e missões muito díspares.
Universidades existem para produzir conhecimento, e não só reproduzi-lo. Satisfazer tal premissa lhes permite casar pesquisa científica com ensino e, assim, formar pessoas capazes de aplicar o saber em soluções para desafios sociais.
Não é essa a realidade de quase duas centenas de universidades cadastradas no Ministério da Educação (MEC) quando foram coletados os dados do RUF. Das 192 que entraram na lista, 176 (92%) não chegaram a publicar um artigo científico por docente em dois anos.
O contraste com as universidades de elite é marcante. A Unicamp, por exemplo, teve 3,35 publicações por professor em 2010-2011.
Isso não quer dizer que 9 entre 10 universidades sejam inúteis. Nelas estão 7 milhões de pessoas que formarão a elite da mão de obra nas próximas décadas. O ideal seria que houvesse muito mais matrículas. Mas não se expande a educação de terceiro grau no ritmo necessário sem comprometer algo da qualidade --inclusive devido às deficiências no ensino médio.
Os centros de primeira linha, que dão tempo e condições para seus docentes fazerem pesquisas, terão sempre clientela restrita. As três irmãs paulistas (USP, Unicamp e Unesp), responsáveis por 40% das publicações científicas nacionais, reúnem menos de 10% do total de 1,76 milhão de matrículas de graduação no Estado.
O Brasil precisa, sim, de escolas superiores para qualificar a força de trabalho e melhorar a produtividade da economia. Essa é a vocação da maioria das instituições particulares e de tantas públicas, como as várias que têm sido inauguradas pelo governo federal.
Designá-las todas como universidades e delas exigir o cumprimento de quesitos burocráticos mais apropriados a centros de pesquisa (como manter um terço de professores pós-graduados) pode dificultar essa missão, por desviar o foco do ensino propriamente dito.
Além disso, confunde-se o público ao misturar verdadeiras universidades com as que só merecem o título com o acréscimo de aspas.
Nessa confusão apostam as instituições que se esforçam para cumprir apenas o mínimo das exigências do MEC a fim de manter a denominação prestigiosa. Sua motivação está no mercado, não na ciência, e é injusto listá-las na mesma categoria das que se distinguem pela excelência em pesquisa.
O RUF também enfrenta essa dificuldade. Por isso tem modificado sua metodologia, a partir de sugestões e críticas, para tornar essa ferramenta mais útil. Nenhum ranking tem um conjunto inquestionável de critérios --mas isso não desobriga seus responsáveis de aperfeiçoá-lo de maneira contínua.
Folha de S.Pauylo, 11/9/2014

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