25 de setembro de 2014

Excelência na educação superior num contexto de mudança global


Lidia Brito destaca a importância da excelência cientifica durante o Simpósio Internacional sobre Excelência na Educação Superior, realizado na ABC
Como se mede a excelência universitária num mundo em transformação? Para a diretora de Ciências Políticas e Capacitação da Unesco, Lidia Brito, pesquisa de alta qualidade envolve certamente, publicações, prêmios e reconhecimento, capacidade de obter financiamento e de atrair bons pesquisadores e estudantes. Mas vai além: tem que gerar conhecimento relevante que possa servir de subsídio para políticas públicas e influenciar nos processos de decisão, priorizando sempre a redução da pobreza e o desenvolvimento das nações. Ela emitiu suas opiniões durante o Simpósio Internacional sobre Excelência na Educação Superior, realizado na Academia Brasileira de Ciências (ABC), de 22 a 24 de setembro.
Excelência é compromisso com a sociedade e empenho em ir além
Doutora em ciência florestal e da madeira pela Universidade do Estado do Colorado (EUA) e professora na Universidade Eduardo Mondlane, a maior de Moçambique, Lidia Brito destaca a importância da excelência cientifica. “Temos que ter capacidade de desenvolver ciência de qualidade, comparável àquela feita em qualquer lugar do mundo. Mas, além disso, é preciso criar uma interface com a sociedade, é preciso ouvir as pessoas e perceber qual a visão delas sobre os desafios de desenvolvimento.”
Para Brito, as instituições de ensino superior têm que assumir esse papel de promover a transformação social. “E para que nossa pesquisa contribua efetivamente para os processos de tomada de decisão, temos que aprender a comunicar nossos resultados de forma diferente para públicos diferentes. E temos que assegurar a legitimidade das políticas globais nos níveis locais e nacionais.”
Os três pilares das universidades de excelência, em sua visão, são a pesquisa, a aprendizagem e o empenho em ir além do esperado. O conceito de ‘ensinar’ deve se transformar em ‘abrir espaços de aprendizagem’. E para tanto, em sua avaliação, não se pode trabalhar com projetos de curto prazo: é preciso ter continuidade e construir redes institucionais, o que é mais difícil do que construir redes de professores, de pesquisadores, de indivíduos. “Só através de redes institucionais vamos poder identificar quais os fatores que realmente afetam os processos de tomada de decisão e teremos, então, capacidade para contextualizar as políticas públicas em nível regional e nacional”, afirmou a palestrante. Mais do que instituições fortes, Lidia Brito vê a importância dos sistemas de excelência fortes, de redes fortes em todos os níveis. “Os centros de excelência devem ser avaliados por sua capacidade de gerar spin offs, centros menores, ou seja, pela sua capacidade de multiplicação do conhecimento”, acentuou Brito.
A ex-ministra da Educação Superior, Ciência e Tecnologia de Moçambique avaliou que as universidades de excelência primam por exercer sua autonomia e “accountability”. “Onde há direitos, há responsabilidades.” E destacou fortemente o papel da liderança. “Esta é uma questão fundamental: a qualidade da liderança. Ela deve ser criativa e inovadora, capaz de antecipar o que vem pela frente, modesta e humilde, com a perspectiva de servir à sociedade.” Para Lidia Brito, gerenciar bem o poder não é só saber dizer não. “É criar alternativas, é dizer sim, mas com capacidade crítica de análise para avaliar se o sim está funcionando e mudar quando necessário”, ressaltou.
Qualidades requeridas tanto para alunos como para professores
Lidia Brito destacou características desejáveis e necessárias aos atores envolvidos em cursos de excelência. Naturalmente, a primeira é a alta qualificação em seus respectivos campos. Mas ela acentuou a importância de outro tipo de qualidade. “É preciso que sejam dinâmicos, inovadores, com capacidade para desaprender e aprender de novo. Capazes de atuar em equipes multidisciplinares, preparados para a transformação pessoal e para transformar o contexto ao seu redor. Isso vale para os estudantes e para os professores também”, reafirmou Brito.
Ela destacou algumas meta-competências que promovem a transformação: a capacidade de observar profundamente a si mesmo e o entorno, de refletir, de ouvir, de compreender diferentes linguagens, de se emocionar, de lidar com o desconhecido. Para Brito, “o indivíduo transformador tem que ter flexibilidade, ser capaz de uma abordagem multidisciplinar. Tem que ser atento politicamente, moralmente responsável e comprometido, envolvido. Não ficar vendo a banda passar, mas dançar junto com a banda”, frisou.
Lidia Brito enfatizou que aprender é uma característica humana natural, mas tem que ser elevada à sua máxima potência na universidade de excelência. E o que é aprendizado? A definição que Lidia mais aprecia é a de Peter Jarvis, que o considera uma combinação de processos que envolve a pessoa como um todo: tanto os aspectos genéticos, físicos e biológicos do corpo quanto os aspectos mentais, como capacidade de cognição, atitudes, valores, emoções, crenças e percepções. “Esse ser inteiro experimenta situações sociais e transforma – de forma cognitiva, emotiva ou prática – o conteúdo percebido nessas experiências. Isso é aprendizado”, defende.
E para que esse aprendizado aconteça, é preciso um ambiente adequado. Brito aponta a necessidade de se criar um espaço que estimule um melhor entendimento entre as pessoas diariamente, de forma dinâmica. “A interconectividade está em tudo que estamos vivendo. O estudante tem que saber como cresce uma árvore e também quais são as raízes da pobreza. O cidadão tem que ser capaz de compreender e de abordar as questões sociais, que são interconectadas. Instituições de excelência tem que ter uma natureza intrínseca de aprendizagem e não de ensino”, arrematou a palestrante.
(Elisa Oswaldo-Cruz para Notícias da ABC)
(ABC)

Nenhum comentário:

Postar um comentário