24 de julho de 2013

Ideia de filtro on-line do Reino Unido esbarra em questões práticas

ANÁLISE PORNOGRAFIA NA WEB
Proposta de premiê britânico para bloquear sites com pornografia afetaria, por exemplo, '50 Tons de Cinza'
Dificultar o acesso a conteúdos não significa que eles deixem de existir, mas que se fará caminhos mais longos
MÔNICA STEFFEN GUISE ROSINAALEXANDRE PACHECOESPECIAL PARA A FOLHA, 24/7/2013
Nesta semana, o primeiro-ministro britânico anunciou a criação de um conjunto de regras no país que visa limitar o acesso à pornografia on-line. Empunhando a bandeira da defesa das crianças, o governo almeja estabelecer obrigações de filtragem prévia, na navegação dos usuários britânicos, de conteúdos que possam remeter a material pornográfico.
Provedores de conexão, como British Telecom, Sky e Virgin, já disponibilizam o serviço de filtragem prévia para novos clientes. A proposta do governo é tornar a filtragem, que hoje é facultativa, obrigatória. Aqueles que desejarem ter acesso a conteúdo pornográfico deverão informar essa escolha ao provedor de conexão --e, consequentemente, ao governo.
A gestão de conteúdos na internet nos remete a algumas reflexões diretamente aplicáveis ao caso britânico.
Não existe filtro ideal; o que não se imaginava filtrar acaba sendo filtrado. A palavra "sexo", por exemplo, está inserida não apenas nos sites de pornografia, mas também na literatura, na medicina, no cinema e em tantos outros espaços que representam as dimensões da vida social.
Trechos do best-seller "Cinquenta Tons de Cinza" certamente seriam objeto desse tipo de filtragem.
O Estado não deve ter acesso a todas as informações que compõem a vida privada do indivíduo. Esse é um valor tão caro que a defesa da intimidade pode ser encontrada em diversas Constituições ao redor do mundo, incluindo a brasileira.
O que pode ser mais privado que nossa opção por consumir ou não pornografia? Faz sentido que o governo de um país seja capaz de formar um banco de dados com as informações de acesso de seus cidadãos a todo e qualquer conteúdo pornográfico?
Por fim, sempre há caminhos alternativos. Tornar o acesso a determinados conteúdos mais difícil não significa que eles deixem de existir. Significa que o indivíduo apenas fará o caminho mais longo para chegar até eles.
Hoje, é tecnicamente possível navegar de forma criptografada e ter acesso a material não indexado, seja legal, como sadomasoquismo, ou ilegal, como pedofilia.
Em uma sociedade democrática, existe uma natural pluralidade de concepções do que seja a pornografia. É desejável que essa pluralidade se mantenha no espaço virtual e permita que o usuário de internet faça, por si mesmo, as escolhas do que deve ou não estar acessível a ele. Caso contrário, o que é filtro passa a ser censura.

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