O Povo, Fabio Campos, 21/7/2013
O CONFLITO NOSSO DE CADA DIA
Veio a público o mais novo "Mapa da Violência", o rigoroso trabalho coordenado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz. Os dados ainda são relativos ao ano de 2011. As notícias não são boas e sabemos que as de 2012 e 2013 serão ainda piores. A seguir, alguns pontos (literais) ressaltados no trabalho.
1 - Não só o Ceará, também Alagoas, Goiás, Acre, Paraná, Amazonas, Pará, Paraíba, Bahia, Rio Grande do Norte e Maranhão, observam suas taxas de homicídios subirem de forma acentuada e descontrolada, afetando decididamente as condições da seguridade cidadã.
2 - A evolução histórica da mortalidade violenta no Brasil impressiona pelos quantitativos implicados. Entre os anos 1980 e 2011, morreram no país: 1.145.908 vítimas de homicídio; 995.284 vítimas de acidentes de transporte; 205.890 pessoas suicidaram-se. As três causas somadas totalizam 2.347.082 vítimas.
3 - São números tão altos que tornam difícil, ou quase impossível, elaborar uma imagem mental, uma representação de sua magnitude e significação. Para isso, recorre-se a outros indicadores para dar uma ideia, uma aproximação do que esses números representam.
4 - Recentemente foi publicado o Relatório sobre o Peso Mundial da Violência Armada. Tomando como base fontes consideradas altamente confiáveis, o Relatório elabora um quadro de mortes diretas em um total de 62 conflitos armados no mundo, acontecidos entre os anos 2004 e 2007. Os 12 maiores conflitos — que ocasionaram 81,4% do total de mortes diretas no total dos 62 conflitos — vitimaram 169.574 pessoas nos quatro anos computados.
5 - No Brasil, país sem disputas territoriais, movimentos emancipatórios, guerras civis, enfrentamentos religiosos, raciais ou étnicos, conflitos de fronteira ou atos terroristas, foram contabilizados, nos últimos quatro anos disponíveis (2008 a 2011) um total de 206.005 vítimas de homicídios, número bem superior aos 12 maiores conflitos armados acontecidos no mundo entre 2004 e 2007.
6 - Esse número de homicídios resulta quase idêntico ao total de mortes diretas nos 62 conflitos armados desse período, que foi de 208.349. E essas magnitudes não podem ser atribuídas ao gigantismo, às dimensões continentais do Brasil. Países com número de habitantes semelhante ao do Brasil, como o Paquistão, com 185 milhões de habitantes, têm números e taxas bem menores que os nossos. E sem falar da Índia, que possui 1,2 milhões de habitantes e taxas de homicídio muito inferiores às do Brasil.
Pois é. Não tenhamos dúvidas: esses números absurdos, a ineficiência do sistema que não consegue oferecer ao cidadão a mais básica de suas necessidades (a manutenção da vida), foram itens que certamente ajudaram a empurrou para as ruas as multidões do mês de junho.
O que mudou no Ceará ou em Fortaleza após a ira das ruas se manifestar em junho passado? Nada. Até aqui, nenhuma medida que fosse ao encontro dos anseios populares. Nenhum ato de contenção de despesas ou corte de gastos. Nenhum ato de transparência ou de enxugamento da paquidérmica estrutura de cargos. Pelo contrário. O Estado até virou proprietário de uma usina de álcool falida. O melhor que um governante poderia fazer agora era levar adiante um conjunto de ações capazes de sinalizar que o clamor do asfalto estava sendo assimilado de alguma forma. Fica a questão: com que cara (e coragem) os nossos diletos governantes vão pedir votos para si e para seus candidatos em 2014?
E se as ruas ainda estiverem acesas no ano da sucessão?
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