A soberania e a crise na ciência: o começo do fim (Artigo)
A institucionalização da ciência no Brasil foi feita na década de 1950, com a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento do Ensino Superior (Capes). A partir da década de 1960, bem-sucedido sistema de pós-graduação foi implantado no Brasil. Atualmente, mais de 16 mil doutores são formados por ano.
A criação, em 1985, do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), depois MCTI, foi também marco importante. Nos últimos 20 anos, a ciência brasileira se consolidou com secretarias de C&T nos estados e suas fundações de amparo à pesquisa. Nesse período, nossa produção científica tem crescido com taxas superiores à média mundial. Uma rede de institutos nacionais de ciência e tecnologia (INCT) foi criada e políticas de integração academia-empresa foram implantadas. Tudo apontava para um desenvolvimento científico como base da era do conhecimento. Ledo engano.
O primeiro sinal da crise da ciência brasileira foi a fusão do MCTI com o Ministério de Comunicação, no início de 2016, com um argumento não convincente de que o governo necessitava enxugar a máquina administrativa. Daí para a frente, testemunhamos grandes cortes em bolsas e em projetos. Uma emenda constitucional limitou os gastos federais a aumentos no nível da inflação por 20 anos. Em março de 2017, o governo anunciou redução de 44% no orçamento federal de ciência.
O orçamento do MCTIC será o mais baixo em pelo menos 12 anos, com apenas R$ 2,8 bilhões. A redução de investimentos alcançou também as fundações estaduais de fomento à pesquisa. A Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj) apresenta calote de R$ 470 milhões, que está interrompendo as atividades de pesquisas, principalmente nas universidades estaduais do Rio de Janeiro. As universidades federais, entre elas a Universidade de Brasília, estão à beira do colapso. O CNPq anuncia a suspensão de bolsas de estudos. É o início do caos.
A fragilização do nosso sistema nacional de ciência e tecnologia terá implicações graves para o desenvolvimento social e econômico brasileiro. Estamos formando um exército de doutores para ficarem desempregados. Os investimentos na formação de recursos humanos, nas últimas décadas, serão desperdiçados. O desperdício da inteligência é atitude de burrice plena. Se o processo de desmonte não for interrompido, teremos um êxodo de cientistas brasileiros para países avançados, onde a ciência é valorizada.
A inserção do Brasil na era do conhecimento é questão de soberania. A reversão do presente quadro deve ser rápida, pois grupos de pesquisas que levaram anos para serem construídos serão desativados. É pertinente que nossos governantes lembrem o pensamento de Winston Churchill: "Construir pode ser a tarefa lenta e difícil de anos. Destruir pode ser o ato impulsivo de um único dia".
A restauração do MCTI deve ser imediata. Os investimentos em ciência e tecnologia devem ser incrementados. A burocracia para a aquisição de insumos e equipamentos deve ser simplificada. Projetos de parceria com o setor privado devem ser estimulados para obtenção de novas patentes e produtos. As pesquisas que visam à solução de problemas demandados pela sociedade devem ser valorizadas.
O Brasil precisa, urgentemente, tratar a educação e a ciência e tecnologia com seriedade, pois são pilares fundamentais para nosso desenvolvimento como nação. Caso contrário, continuaremos à mercê de tecnologia externa, comprometendo a nossa soberania e o fracasso da nossa missão geracional de legarmos para as próximas gerações um país soberano sem injustiças sociais, onde todos poderão conquistar a felicidade.
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