Na ciência, um objeto pode estar em dois lugares ao mesmo tempo, atravessar obstáculos, ter dois estados incompatíveis
A realidade pode ser mais estranha do que a ficção. Na ciência, os efeitos quânticos, que aparecem quando estudamos objetos muito pequenos, certamente são mais estranhos do que podemos imaginar. Um objeto pode estar em dois lugares ao mesmo tempo, atravessar obstáculos, ter dois estados incompatíveis, como o gato de Schrödinger, morto e vivo ao mesmo tempo.
Mas como sabemos que esses efeitos de fato ocorrem? E por que não vemos isso normalmente? Qual a fronteira entre a realidade quântica, com seus efeitos bizarros, e a nossa realidade comum?
Essas respostas só podem ser dadas através de experimentos. Foi assim que ficou determinada a mais estranha das propriedades quânticas, que está por trás de todo esse mistério: a dualidade partícula-onda. Desde os atomistas gregos, costumamos visualizar a matéria como feita de partículas, objetos minúsculos e indivisíveis. O elétron, que gira em torno do núcleo atômico, é um exemplo popular. Mas em 1924, Louis de Broglie propôs algo inusitado: o elétron é também uma onda. E não só ele, como todas as outras partículas; as entidades fundamentais da matéria têm dupla identidade, a dualidade partícula-onda.
O estranho disso é que partículas e ondas têm propriedades muito diferentes: partícula são localizadas, ocupam pouco volume no espaço; ondas se espalham. Em 1927, Clinton Davisson e Lester Germer observaram a difração de elétrons ao passarem por um cristal de níquel, um efeito típico de ondas. A difração ocorre, por exemplo, quando ondas passam por duas fendas. Imagine ondas de água passando por uma barragem com apenas duas portinholas, ou ondas de luz passando por uma parede com duas fendas. Elas interferem e criam um padrão de estrias claras e escuras num anteparo. Se repetíssemos o experimento atirando balas (partículas) através das fendas, elas iriam se amontoar no anteparo bem atrás das fendas: balas não interferem entre si, não sofrem difração.
No experimento de Davisson-Germer, o cristal de níquel fazia o papel da parede com fendas. Em 1989, Akira Tonomura, do Japão, conseguiu fazer o experimento de elétrons passando por fendas. Os resultados foram bizarros. Ele mostrou que um elétron, passando sozinho pelas fendas, interfere com ele mesmo: ou seja, o elétron se comporta como uma onda passando pelas duas fendas ao mesmo tempo!
O que ocorre com "partículas" maiores? Qual o limite de tamanho em que as características de onda são "perdidas"? Devido a incríveis avanços tecnológicos, experimentos de difração foram feitos com nêutrons, átomos, e até moléculas, centenas de vezes maiores do que átomos. Um exemplo é o experimento de Anton Zeilinger e seu grupo da Universidade de Viena, que em 1999 demonstrou a interferência de moléculas com 60 átomos de carbono, as "bolas de Bucky", que parecem bolas de futebol.
Quanto maior o objeto, mais sutil é sua interferência, que fica difícil de demonstrar. Imagine uma bola de futebol fazendo dois gols ao mesmo tempo. Isso ocorre no mundo quântico. A próxima etapa é tentar experimentos com vírus. O que ocorre quando seres (quase) vivos passam por duas fendas ao mesmo tempo? E seres vivos?
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