23 de março de 2013

Aborto sem crime


Proposta do Conselho Federal de Medicina enfatiza necessidade de encarar o procedimento como grave questão de saúde pública
Foi oportuna e corajosa a iniciativa do CFM (Conselho Federal de Medicina) de recomendar a ampliação das situações previstas para o aborto na legislação brasileira.
A interrupção voluntária da gravidez já é permitida em casos de estupro ou de risco para a vida da mãe. Decisão do Supremo Tribunal Federal admitiu, recentemente, que o mesmo ocorra quando se verifica a anencefalia do feto.
Propõe-se que a permissão seja estendida até a 12ª semana de gestação, se a mãe assim o desejar. Contemplam-se também outras situações de teor menos polêmico: uso não consentido de técnicas de reprodução assistida e diagnósticos de vida inviável fora do útero.
Como é notório, não existe consenso na sociedade a respeito do tema. Segundo afirma João Batista Soares, do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, cerca de um terço dos representantes da categoria se opõe à medida.
Equiparar o aborto ao assassinato de um ser humano soa excessivo. Neurologistas dizem que o feto é incapaz de sentir dor antes das 12 semanas de vida. Ainda assim, não há como negar que se trata de vida -vida humana- o que o aborto vai interromper.
Vida humana em potencial, no mínimo. Não ainda uma pessoa humana, entretanto. Compreendem-se as dúvidas filosóficas que o assunto suscita e as certezas que a religião, neste e em outros casos, pode apresentar como resposta.
Um fato, de qualquer modo, desvincula-se de todas essas polêmicas. Calcula-se em cerca de 1 milhão o número de abortos realizados anualmente no Brasil. Realizados ilegalmente, no mais das vezes em condições precárias, respondem por quase duas centenas de óbitos maternos por ano.
Se faltam critérios para definir em que medida o feto de três meses é uma pessoa humana, são pessoas, fora de qualquer questão, as mulheres que morrem em clínicas clandestinas ou mesmo em casa, no desespero de tentar, pelos próprios meios, interromper uma gravidez indesejada.
É nesse sentido que não falta razão aos que consideram o aborto como, primordialmente, um problema de saúde pública. Problema que poderia ser muito minimizado, por certo, caso houvesse campanhas de maior informação e de acesso a métodos bem menos traumáticos, como a chamada pílula do dia seguinte.
Nos países em que isso ocorre, também é menor o número de abortos -recurso que, por certo, ninguém encara como a primeira opção contraceptiva. Aos médicos e mulheres que, por razões de consciência, se opõem à medida ninguém nega o direito de não se envolverem em procedimentos tão extremos e traumáticos.
Já a possibilidade de que sejam feitos em condições médicas adequadas, na segurança da lei, deve ser discutida com maturidade -e, se persistir a falta de consenso, como parece provável, submeter a questão a um plebiscito.

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