15 de março de 2013

Jorge Gerdau: Burrice de criar ministérios já chegou ao limite


ENTREVISTA - JORGE GERDAU, 76

PARA EMPRESÁRIO, SEM REFORMA É DIFÍCIL CONTER AVANÇO DOS POLÍTICOS NA GESTÃO; DEZ ANOS É POUCO PARA O PAÍS SE TORNAR COMPETITIVO, DIZ
FERNANDO RODRIGUESDE BRASÍLIAARMANDO PEREIRA FILHOEDITOR DE ECONOMIA DO UOL, 15/3/2013
O empresário Jorge Gerdau acha que o Brasil precisa "trabalhar com meia dúzia de ministérios" e não com as 39 pastas da administração de Dilma Rousseff -no fim do governo do tucano Fernando Henrique Cardoso eram 24.
O inchaço se dá por contingências políticas, mas "tudo tem o seu limite", diz o presidente da Câmara de Políticas de Gestão da Presidência. Em entrevista à Folha e ao UOL na terça-feira, ele completou: "Quando a burrice, ou a loucura, ou a irresponsabilidade vai muito longe, de repente, sai um saneamento. Nós provavelmente estamos no limite desse período".
Em uma de suas raras entrevistas, Gerdau disse conversar sobre esse assunto com a presidente da República, a quem elogia. "Eu já dei um toque na presidenta."
Embora enxergue avanços na gestão do país, suas previsões são de longo prazo. "Para deixar o país com planejamento competitivo em todas as frentes", um prazo de "dez anos é pouco".
A seguir, trechos da entrevista com Gerdau.
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Folha/UOL - Há quase dois anos à frente da Câmara de Políticas de Gestão, o que foi possível avançar?
Jorge Gerdau - O trabalho mais pesado que nós fizemos foi na Casa Civil. Com o PAC, que era uma estrutura que trabalhava dentro da Casa Civil. Foi para o Ministério do Planejamento. Foi necessário fazer uma reorganização para dar condições de administração para que a presidente pudesse acompanhar todos os projetos. Fez-se toda uma estrutura de informática. Avançamos em várias coisas. No Ministério da Saúde, na área de logística, compra de remédios etc. Trabalhamos na pasta dos Transportes.
Algum resultado objetivo?
Na área de logística. [O Ministério da Saúde] Tinha capacidade de atendimento de 40% da demanda. Até junho, nós vamos atingir um ritmo de atendimento de 80%.
Outro exemplo foi em Guarulhos. O aeroporto tinha uma capacidade de atendimento de 900 pessoas por hora. De 2011 para 2012, nós conseguimos atingir um número próximo a 1.500. O que foi? Pequenas coisas. Ampliar o número de balcões, o atendimento dos passaportes e do controle da bagagem. Pequenas mudanças no layout.
O sr. diria que a política atrapalha a gestão?
[Longa pausa] Dentro da estrutura brasileira, o conceito de política atrapalha bastante a gestão. Mas... [pausa] A gente tem que encontrar os caminhos dentro das realidades que cada país tem.
Você tem que separar os três níveis: as funções e interesses de Estado, as de governo e as de administração. País civilizado troca de ministro e muda duas, três pessoas de relação pessoal. A administração não muda. A estrutura de governança pode ter modificações de decisão política. Muda o partido, a cabeça do líder. No Brasil, só tem quatro ou cinco instituições em que a estrutura de meritocracia e profissionalismo funcionam.
Quais são elas?
Banco do Brasil, Banco Central, Itamaraty e Exército. Tem ainda o BNDES.
O Brasil acaba de ganhar, agora, o seu 39º ministério. O Brasil precisa ter 39 ministérios?
Não. Deveria trabalhar com meia dúzia.
O número de partidos vai aumentar. A gente vai ter cada vez mais ministérios?
Diria o seguinte: tudo tem o seu limite. Quando a burrice, ou a loucura, ou a irresponsabilidade vai muito longe, de repente, sai um saneamento. Nós provavelmente estamos no limite desse período.
Do jeito que está, a presidente teria poder para reduzir o número de ministérios?
Poder, tem. Mas como o número de partidos vai crescendo cada vez mais, é quase impossível. O que a presidente faz? Ela trabalha com meia dúzia de ministérios realmente chave. O resto é um processo que anda com delegações de menos peso.
A administração pública federal tem uns 20 mil cargos de confiança. É excessivo?
Absolutamente excessivo. No esquema que eu falei: funções de Estado, de governo e o resto seriam administrações com meritocracia. Você deveria ter meia dúzia de cargos de confiança por pasta. O resto tem que ser de carreira.
O sr. fala isso para a presidente? Como ela reage?
Eu já dei um toque na presidenta. Ela me deu a explicação que dei para você.
Causa angústia?
Lógico. Mas eu tenho convicções de que esse processo de maturação tecnológica é um trabalho de anos. O trabalho talvez mais interessante que estamos fazendo é estruturar em todos os ministérios o mapa estratégico.
O que seria isso?
Um processo desenvolvido em Harvard. Definir as metas principais sobre a visão estratégica. Depois, uma visão financeira. E depois uma visão de processo e de recursos humanos. Você faz uma definição clara da missão daquela organização. É um instrumento para que todo mundo que trabalha naquele ministério entenda para que esse ministério existe, quais são as metas.
O Brasil está com o mercado de trabalho superaquecido. Os salários pressionam. Como o país achará uma saída para esse quadro?
Buscar soluções de produtividade. No Brasil, há um tema que é a não competitividade do produto brasileiro e outro que é a análise da produtividade. São duas coisas que deveriam ser analisadas separadamente.
Tenho áreas na Gerdau com patamares de produtividade homem/hora semelhantes aos melhores do mundo. Agora, se eu tomar o que um operário no Brasil tem sobre o que ele leva líquido para a casa... Ele tem mais de 100% de baixo para cima. Outros países não. No Chile, por exemplo, um operário leva quase 85% para a casa daquilo que ele custa.
Custa para a empresa?
Para a empresa. Nos EUA, os custos adicionais são extremamente pequenos. Poucos países usam a folha de pagamento como instrumento arrecadatório. O certo seria que a relação contratual entre a empresa e empregado se vinculasse apenas naquilo que é a relação de trabalho.
O sr. está dizendo que sem reforma trabalhista o país não sai desse labirinto?
Desse labirinto da não competitividade.
A presidente Dilma é ciente desses problemas?
Totalmente ciente.
A presidente e o PT já estão há dez anos no poder. Não foi tempo suficiente para mudar esse cenário?
São perfis diferentes da visão de liderança.
Mas ela foi chefe da Casa Civil do governo anterior...
Como chefe de Casa Civil ela procurou organizar o PAC. Um instrumento para botar controle no que se investe no país. Mas isso não quer dizer que você conseguisse eficiência operacional em todos os ministérios.
Quanto tempo o sr. acha que nesse ritmo a presidente colherá resultados concretos?
Para deixar o país com planejamento competitivo em todas as frentes, eu acho que dez anos é pouco.
Vinte anos?
Vinte talvez seja muito.

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