4 de março de 2016

Acesso a creches aumenta mais entre ricos que entre pobres, mostra levantamento


  • 03/03/2016 19h08
  • São Paulo
Mariana Tokarnia - Enviada Especial*
O acesso a creches cresceu mais entre os mais ricos que entre os mais pobres, aumentando a diferença entre os dois segmentos da sociedade entre 2001 e 2014. Os dados estão em levantamento feito pelo movimento Todos pela Educação, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os números mostram que a diferença de acesso a esse serviço entre ricos e pobres cresceu 6,6 pontos percentuais.
Em 2001, 10,4% dos estudantes pertencentes à parcela dos 25% mais pobres da população tinham acesso á educação até os 3 anos de idade. Entre os 25% mais ricos, 32,6% tinham acesso a creches. A diferença entre os dois grupos era de 22,2 pontos percentuais. Em 2014, o acesso melhorou, mas aumentou também a desigualdade entre essas camadas. Entre os mais pobres, 22,4% tinham acesso a creches, enquanto, entre os mais ricos, 51,2% frequentavam a escola. A diferença subiu para 28,8 pontos percentuais.
"O acesso é muito mais facilitado para as famílias [ricas], tanto nas creches públicas quanto nas particulares", diz a superintendente do Todos Pela Educação, Alejandra Meraz Velasco. Ela explica que as creches estão mais concentradas nos centros urbanos do que nas periferias.

De acordo com Alejandra, o acesso cresce tanto entre os mais ricos quanto entre os mais pobres, mas a brecha entre eles está aumentando, e isso pode resultar em maior desigualdade. "Se pensarmos que, além disso, temos uma maior qualidade em escolas mais centrais ou na rede privada, há a tendência de piorarem inclusive outros indicadores mais adiante."
O acesso à creche está previsto no Plano Nacional de Educação (PNE), lei que estabelece metas para melhorar a educação brasileira até 2024. De acordo com a lei, até 2024, 50% das crianças com idade até 3 anos devem ter acesso a esse tipo de serviço. Atualmente, são atendidos em creches 29,6% das crianças nessa faixa etária.
Papel da família
Alejandra apresentou hoje (3) os dados do debate Educação em Pauta sobre Primeira Infância, promovido pelo Todos Pela Educação e pela Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. Para Alejandra, é preciso   destacar ainda o papel das famílias na formação das crianças e a necessidade de se capacitar os pais e responsáveis para que estimulem o aprendizado e a curiosidade dos filhos pequenos em casa. De acordo com a superintendente do movimento, políticas assim não existem hoje no Brasil.
"O investimento nessa criança é o que dá mais retorno para o país", afirmou Eduardo Queiroz, diretor-presidente da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal. Queiroz lembrou o trabalho do ganhador do Prêmio Nobel de Economia, James Heckman, que mostra que o retorno econômico é maior quanto mais cedo é o investimento no capital humano. "Não se fala em família, emcuidadores. Temos milhares de crianças em fila de espera de creches públicas. Quem está olhando essas crianças? Essas pessoas sabem a importância dessa fase da vida?", questionou.
A construção de creches e pré-escolas tem sido tratada como prioridade pelo Ministério da Educação (MEC). O país tem, de acordo com o PNE, até este ano para universalizar o acesso a crianças de 4 e 5 anos. O MEC passou a oferecer este ano a estados e municípios a opção de construir espaçosvoltados para atender a essas crianças nas escolas.
Segundo o presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Alessio Costa Lima, a educação infantil é a etapa mais cara da educação básica. "É preciso assegurar investimento para a educação infantil. Não dá para tratar como subeducação", diz. Segundo Lima, é necessário um maior aporte, principalmente da União, para que os municípios, responsáveis pelas matrículas, consigam arcar com as despesas.
*A repórter viajou a convite do Todos pela Educação
Edição: Nádia Franco

Educação infantil é hoje um amplificador de desigualdade, diz professor da USP


  • 03/03/2016 17h14
  • São Paulo
Mariana Tokarnia - Enviada Especial da Agência Brasil*
Não basta oferecer uma vaga em creche, é preciso ofertar educação de qualidade. É o que defende o professor da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto Daniel Santos. Levantamento feito por ele mostra que crianças em situação de maior vulnerabilidade que frequentaram creches têm desempenho pior em avaliações feitas anos depois do que aquelas na mesma situação que não frequentaram a escola até os 3 anos de idade.
Santos utilizou dados do teste de matemática da Prova Brasil, aplicada aos alunos do 5º ano do ensino fundamental, e verificou se os alunos tinham ou não frequentado a creche e a pré-escola, e qual a escolaridade da mãe desses estudantes.
Alunos que frequentaram a creche e que estão em situação de maior de vulnerabilidade, ou seja, que têm mães nunca estudaram ou possuem o ensino fundamental incompleto, têm notas menores na avaliação, em relação a alunos na mesma situação, que não frequentaram creches. A situação é inversa quando se trata de alunos com mães que chegaram a acessar o ensino superior. As notas dos que frequentaram a creche é maior. Já na pré-escola, que atende alunos de 4 e 5 anos, o fato da criança ter frequentado a etapa ou não, não faz diferença entre os alunos em situação de maior vulnerabilidade.
"Nosso sistema [de educação infantil] funciona como um amplificador de desigualdade, ao invés de um redutor de desigualdade", diz Santos. As creches que atendem as crianças até os 3 anos de idade são cada vez mais procuradas por pais ou responsáveis, seja porque precisam conciliar o cuidado dos filhos com o trabalho, seja porque querem que as crianças sejam estimuladas desde cedo. Em várias cidades, há filas para conseguir uma vagas nas creches.
Na opinião de Santos, na educação infantil a escola deve oferecer para a criança o que a família não oferece. Dessa forma, os alunos em situação de maior vulnerabilidade deveriam se beneficiar mais estando na escola do que fora dela. "Não estamos falando em ensinar gramática, mas ensinar afeto e outras noções. São estímulos que todos deveriam ter e, se não têm em casa, deveriam ser supridos na escola", diz. "No ensino fundamental, eu concordo, melhor uma escola ruim que não estar na escola, mas eu não tenho certeza disso na educação infantil", acrescenta Santos.
O professor participou hoje (3) do debate Educação em Pauta sobre Primeira Infância, promovido pelo movimento Todos Pela Educação e Fundação Maria Cecília Souto Vidigal.
O presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Alessio Costa Lima, presente no evento, admitiu que muitas vezes a educação infantil "oferece condições bastante precárias". Ele acredita, no entanto, que é necessário garantir o acesso da criança à escola para, a partir dai, demandar melhoras. "Acesso e qualidade caminham juntos, na medida em que, trazendo a criança para dentro da escola, vão surgindo novas demandas, profissionais mais qualificados, ambientes melhores", disse.
A coordenadora geral de Educação Infantil da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação, Rita Coelho, destacou que a creche não é obrigatória. "Nenhum país universalizou e não se deve universalizar essa etapa, que é de transmissão de valores, de hábitos culturais. Há famílias que fazem questão que isso seja feito no âmbito privado", diz. Ela reconhece, no entanto, que a população mais vulnerável é que a menos tem acesso a serviços de qualidade, seja na educação, saúde ou outro setor.
O acesso à creche e pré-escola está determinado no Plano Nacional de Educação (PNE), lei que estabelece metas para melhorar a educação brasileira até 2024. De acordo com a lei, todas as crianças de 4 e 5 anos devem frequentar a pré-escola até este ano e, até 2024, 50% das crianças até os 3 anos devem ter acesso à creches. Atualmente, 89,1% das crianças estão na pré-escola e 29,6%, nas creches.
*A repórter viajou a convite do movimento Todos pela Educação
Edição: Maria Claudia

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