Muitos dos que acompanham, com interesse, a produção cinematográfica recente se perguntam sobre o que acontece com o cinema nacional.
Alguns de nossos vizinhos, como a Argentina e o Chile, conseguiram estabelecer uma produção constante de qualidade, capaz de aliar força dramática e reflexão sociopolítica -como o recente "No", de Pablo Larraín, ou o mais antigo "O Segredo dos seus Olhos", de Juan José Campanella.
Em certos momentos, tal produção soube, inclusive, explorar, de maneira audaciosa, modificações na forma narrativa cinematográfica tradicional (como o imperdível "Pompeya", de Tamae Garateguy). Já a produção nacional se caracteriza pela intermitência.
Nos últimos dez anos, o Brasil conheceu alguns filmes que nos fizeram acreditar no possível aparecimento de um novo patamar na produção nacional. Eles vieram principalmente do Nordeste, como "O Céu de Suely", de Karim Aïnouz, e "Cinema, Aspirinas e Urubus", de Marcelo Gomes. No entanto, salvo honrosas exceções, a constância de boas produções acabou por não se confirmar, mesmo que, do Nordeste, ainda venham filmes capazes de fornecer bons retratos sociais, como o recente "O Som ao Redor", de Kleber Mendonça Filho.
Ao que tudo indica, o cinema nacional escolheu duas vias principais. De um lado, uma associação com a televisão e com diretores vindos majoritariamente da publicidade, com suas narrativas unidimensionais e estética espetacular. Daí vêm as produções nacionais com maior bilheteria, normalmente comédias de costumes, retratos de heróis da cultura de massa ou filmes cuja maior função é estilizar os fantasmas tradicionais da classe média assustada, como o já muito comentado "Tropa de Elite".
Desde a época da Vera Cruz e da Atlântida, o cinema brasileiro parece lutar para construir um polo de indústria cultural que abasteça o mercado nacional, como se estivéssemos no interior de uma espécie de lógica retardatária de substituição de importações.
Mas a via mais criativa do cinema brasileiro recente foi o documentário, como mostra a tese "Jogos de Cena - Ensaios sobre o Documentário Brasileiro Contemporâneo", de Ilana Feldman. O que não é de estranhar em um país onde mesmo sua tradição literária do século 20 teve um forte peso realista. Realismo que não deixa de cobrar seu preço quando se trata de explorar a linguagem cinematográfica.
Diante dessas duas vias, preso entre sua tradição realista e a lógica da indústria cultural, o cinema brasileiro recente ainda não conseguiu abrir uma terceira via.
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