É possível ficar chocado sem ficar surpreso -foi esse o sentimento de muitos espanhóis ao descobrir que o partido do governo poderia estar envolvido em mais um espetacular caso de corrupção.
Foi um choque porque, se as acusações forem verdadeiras, quase todos os líderes da principal organização política da Espanha, incluindo o premiê, podem ter recebido por duas décadas substanciais recursos não contabilizados de origem obscura.
A novidade aqui, porém, não é o caixa dois ou a troca de dinheiro por favores políticos, práticas rotineiras há muitos anos: está na raiva ou, mais precisamente, na transformação da raiva em algo mais sólido, a amargura.
Naturalmente, a crise econômica na Espanha é o catalisador -mas, além disso, ela fez a política passar de um documentário chato a uma espécie de reality show, vulgaridade e ganância incluídas.
Uma recessão não é só o modo pelo qual Deus ensina economia; também faz o público se interessar por aquilo que acontece no governo.
Se as suspeitas se confirmarem, mesmo que seja em seu menor grau, o primeiro-ministro terá de sair. Você não pode exigir que as pessoas paguem seus impostos se não pagou os seus por anos. Propinas têm de resultar em pontapés -simples assim.
Raiva passa, amargura não. Mas, sozinha, a segunda não constitui um plano de ação. O que fazer? Alguns depositam esperanças numa eleição antecipada (na ingênua esperança de que os partidos menores sejam melhores que os grandes), outros na revolta pacífica das ruas.
Ceticismo sobre os nossos líderes não é suficiente, mas ao menos agora há clima para mudança -antes, nós nem nos importávamos o suficiente. E isso já é alguma coisa.
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