» CRISTOVAM BUARQUE Professor emérito da UNB e senador pelo PDT-DF., Correio Brasiliense, 11/5/2015
Nos últimos anos, o Brasil tem assistido a greves de professores nos mais diversos estados e cidades. Pode-se estimar em milhares o número de aulas perdidas e em milhões o número de alunos sem aulas ao longo de anos. Não é necessário ter imaginação para perceber as consequências da falta das aulas na formação dos estudantes e as consequências dessa má formação para o futuro do país.
Apesar disso, o país não percebe o risco. Ainda mais grave é o fato de pais e professores dizerem que as escolas são tão ruins que a ausência de aulas não faz falta. Muitos pais lamentam as greves apenas porque seus filhos não têm onde ser deixados. Outros lamentam apenas porque os filhos ficam sem merenda.
A população brasileira indignou-se com a violência contra professores nas ruas de Curitiba, na tarde do último 29 de abril. Ver policiais correndo em perseguição a professores, espancando e ferindo dezenas deles, indignou e envergonhou os brasileiros e causou repercussão negativa aos olhos do mundo. Mas há séculos o futuro do Brasil vem sendo espancado pela má qualidade das nossas escolas.
Nossos professores são agredidos silenciosamente pelos contracheques jogados sobre eles. O Brasil foi espancado visivelmente em uma tarde em Curitiba, mas tem sido vítima de maneira não percebida pelos maus-tratos diários aos professores, às escolas e aos alunos. Igualmente grave é o fato de que as greves só ocorrem nas escolas públicas, onde estão os filhos das camadas mais pobres, ampliando assim a desigualdade na qualidade da educação conforme a renda das famílias. Cada greve aumenta a brecha na qualidade da educação das crianças filhas de pobres em relação às filhas de ricos.
Sem bons salários é impossível atrair para o magistério os mais preparados jovens da sociedade; e sem boas condições de trabalho para o professor - conforto e equipamentos nas escolas - é impossível atrair o interesse dos alunos.
Mesmo assim, como pedir aos professores que não façam greves, se os salários estão entre os mais baixos do mundo e entre menores no universo dos profissionais com a mesma qualificação no Brasil? Como pedir aos docentes que não façam greve, quando as aposentadorias são modificadas em prejuízo de seus direitos?
A saída não é impedir as greves; é fazê-las desnecessárias. Precisamos desarmar a necessidade de os professores serem obrigados a recorrer à greve. Embora seja sabido que os sindicatos muitas vezes têm interesses políticos na declaração de greves, seja para fortalecer uma corrente interna, seja por enfrentamentos partidários na política nacional e local, as greves deixariam de ser instrumento indispensável se os professores estivessem satisfeitos com os benefícios pessoais e com as condições de trabalho ao redor. Greves de professores têm características perversas quando comparadas às paralisações nos demais setores por, pelo menos, dois motivos. Primeiro: enquanto a greve do operário penaliza o patrão, a greve do professor pune as famílias. Segundo: ao voltar da greve e retomar o trabalho de onde parou, o operário encontra a matéria-prima e as máquinas esperando nas mesmas condições anteriores; os professores encontram alunos que perderam a motivação e que até mesmo regrediram. É como se nas greves de operários, além de parar a construção, eles destruíssem casas prontas.
Para oferecer um salário que permita atrair os melhores quadros da sociedade e oferecer-lhes as necessárias boas condições de trabalho, seria preciso investir ao redor de R$ 9.500 por aluno a cada ano. Raras cidades teriam condições de reservar recursos de tal porte para a educação. A única forma de parar as greves é por meio de um esforço nacional que adote as escolas e as crianças de cada cidade por meio da federalização da educação de base. E federalizar significa termos uma carreira nacional do magistério e, ainda, que o equipamento das escolas tenha padrão de qualidade elevado e equivalente em todo o território nacional.
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