20 de janeiro de 2013

Armas: Tiroteios tomam a temporada de lançamentos em Hollywood


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RIO - O ator e diretor Robert Redford acaba de se juntar às vozes críticas a um possível excesso de armas — e, como consequência, violência — no cinema. Na quinta-feira à noite, ao abrir o Festival de Sundance, uma mostra criada por ele próprio em 1978 e realizada anualmente em Salt Lake City, Utah, Redford politizou o que deveria ser apenas uma festa cinematográfica, ao sugerir que o cinema pode, sim, contribuir para a obsessão americana por armas. “Minha indústria acha que armas vendem filmes? Acredito que é uma pergunta que vale a pena ser feita”, disse o artista.
O comentário de Redford, um astro que também já teve sua cota de tiros na tela, como quando viveu um fora da lei em “Butch Cassidy” (1969), foi feito um dia após o presidente americano, Barack Obama, anunciar que vai mandar para o Congresso um novo sistema de controle para a compra de armas nos Estados Unidos. Mas, na verdade, o comentário tem como alvo uma situação que vem se repetindo há anos, com uma onda crescente de violência tanto na sociedade quanto no cinema.
O último caso grave ocorreu em dezembro, quando um atirador matou 26 pessoas numa escola em Connecticut, nos EUA. Na sequência, dois grandes eventos de cinema que ocorreriam naquela semana foram cancelados, em parte em solidariedade às vítimas, mas também para evitar comparações entre a realidade e a ficção. Um deles foi uma pré-estreia de “Django livre”, de Quentin Tarantino, faroeste que concorre a cinco Oscars e no qual, como ocorre nos filmes do diretor, é difícil encontrar uma sequência de mais de dez minutos sem um tiro.
Também marcada para aquela semana, uma exibição para arrecadar fundos para “Jack Reacher: o último tiro”, thriller com Tom Cruise, foi adiada. A megaprodução já começa com um atirador usando um rifle de distância para matar cinco pessoas, e há boatos em Hollywood de que a Paramount, estúdio de “Jack Reacher”, cortou algumas cenas mais fortes antes do lançamento do filme, justamente para evitar qualquer relação com as mortes de Connecticut.
Desde então, qualquer filme que tenha um número maior de mortes — o que tem sido comum nesta temporada — é alvo de discussão sobre um possível exagero de violência.
— Eu discordo desse debate. Pessoalmente, acho que há uma distância entre realidade e fantasia — afirma Lorenzo di Bonaventura, produtor de filmes de ação como “Transformers”, “Red — Aposentados e perigosos” e “G.I. Joe — A origem de Cobra”. — O que fazemos é fantasia. É claro que essas coisas que vêm ocorrendo em nosso país são uma insanidade, tanto que sou a favor do controle de armas. Mas eu acho que pessoas sãs que assistem a qualquer forma de entretenimento, sejam livros ou filmes, não vão tomar atitudes violentas por causa disso.
O mais recente filme produzido por Di Bonaventura é “O último desafio”, uma produção que tem o chamariz de ser o retorno de Arnold Schwarzenegger como protagonista. Nela, o ator grandalhão é um xerife que usa todo tipo de armamento pesado para evitar que um traficante atravesse a fronteira dos EUA para o México. Numa cena, o personagem de Schwarzenegger chega a atirar com metralhadora giratória em direção a outros personagens — o que não seria nada de muito diferente dos outros filmes em que o ator já trabalhou, se ele não fizesse isso de dentro de um ônibus escolar.
Estudo conta 185 vítimas em cinco longas
O próprio Schwarzenegger, ex-governador da Califórnia por dois mandatos, comentou o tema em entrevista ao GLOBO, semana passada, dizendo que não acha que “alguém vá perder tempo debatendo se ‘O último desafio’ ou qualquer filme de ação pode influenciar um ato de violência”. Só que, num país como os EUA, onde a indústria de cinema movimenta mais de US$ 10 bilhões por ano só em venda de ingressos, o debate vem, sim, ocorrendo.
— Tarantino esteve no programa de TV do Jay Leno, duas semanas após o que aconteceu em Connecticut, e foi perguntado sobre o que achava dessa relação entre cinema e violência na realidade. Ele disse que estava fazendo uma ficção, um filme, uma arte, e que não estava incentivando ninguém a comprar uma arma — lembra o gaúcho Rodrigo Teixeira, produtor de efeitos visuais que mora em Los Angeles e trabalhou em filmes como “O espetacular Homem-Aranha”, “A invenção de Hugo Cabret” e “Sin City”. — O problema é que agora tudo que é filme as pessoas fazem virar um incentivo à violência. O que mais as pessoas comentam aqui é: “Pô, quer dizer que a culpa de essas coisas acontecerem é nossa?” É claro que falo de dentro, mas acho que todos esses comentários de apontar o dedo na direção dos estúdios, acusando-os pela violência, são cinismo. O debate precisa ser mais profundo. Tem a ver com educação e muitos outros fatores da sociedade.
O que mais tem se feito, porém, é apontar o dedo para os filmes. Redford foi apenas um dos últimos a tratar do assunto. Mas instituições americanas começaram a fazer estudos procurando conexões entre a arte e a realidade. O Media Research Center, um centro da Filadélfia que analisa relações de mídia e entretenimento nos EUA, divulgou na terça-feira um estudo em que contabilizou 185 vítimas em apenas cinco filmes líderes de bilheteria nos EUA neste início de 2012: “Django livre”, “Os miseráveis”, “A hora mais escura”, “Caça aos gângsteres” e “Inatividade paranormal”, sendo que os três primeiros foram indicados ao Oscar de melhor filme.

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