3 de abril de 2015

MARCOS TROYJO, Educação e poder global


Imaginação e capacidade de inovar são os vetores de uma nova era, e não armas, recursos naturais ou capital
Ao longo dos séculos, o soldado e o diplomata foram protagonistas das relações internacionais. Hoje parecem acompanhados na definição do poder global pelos estrategistas da educação.
Os sistemas educacionais das grandes potências lançaram-se numa disputa cabeça-a-cabeça (literalmente) por proeminência mundial. Klaus Schwab, fundador do Fórum de Davos, identifica no "talentismo" o sucessor do capitalismo. Imaginação e capacidade de inovar --não armas, recursos naturais ou capital-- seriam os vetores do que chama de "Era da Adaptação".
Universidades americanas e europeias abrem campi no Oriente Médio e na Ásia-Pacífico. Chineses e indianos abarrotam programas de pós-graduação nas escolas da Ivy League. De volta a seus países, "clonam" o que lhes interessa da educação de ponta em ciências exatas a que tiveram acesso no Ocidente.
Nessa linha, a educação também seria um dos grandes divisores de água entre o dinamismo da Ásia e o resto do mundo em desenvolvimento. De acordo com o ranking 'Times Higher Education' de 2015, das cem melhores universidades dos BRICS e economias emergentes 74 estão na Ásia (28 na China e 11 na Índia) e apenas 9 na América Latina (4 no Brasil).
Para muitos, a vigorosa migração de atividade produtiva do Atlântico para o Pacífico é causa e consequência de uma abordagem educacional que privilegia o ensino de "STEM" (sigla em inglês para ciências, tecnologia, engenharia e matemática) em detrimento de disciplinas como arte, história ou sociologia.
Fareed Zakaria, que acaba de lançar o livro "Em Defesa da Educação Liberal", argumenta que a inegável capacidade de inovação dos EUA se deve tanto ao conhecimento das humanidades quanto ao das ciências exatas. Lembra que Mark Zuckerberg, criador do Facebook e, claro, apaixonado por computação, era um estudante de humanas em Harvard.
Esse embate "liberal-ocidental x asiático" nos enfoques de ensino camufla, no entanto, uma realidade que vai além da competição entre modelos educacionais.
Numa visita que fez a Seul no ano passado, o presidente do Banco Mundial perguntou à presidente sul-coreana qual deveria ser a prioridade estratégica de seu país para as próximas décadas. O chefe da agência multilateral espantou-se com a resposta: transformar radicalmente as estruturas de educação de meu país de modo a prepará-lo para os desafios da inovação e da economia criativa. Nesses novos paradigmas, a educação tem de interagir com ambiente pró-mercado, amplo acesso a capital de risco e valorização do empreendedor.
A postura absolutamente proativa dos coreanos numa área em que dominam --ocupam o topo do ranking do Pisa no mundo, investem 4% do PIB em P&D e são o quarto maior depositante de novas patentes-- não deixa dúvidas.
A disputa vai além do conhecimento e se dá no âmbito de "ecossistemas institucionais" mais ou menos aptos a prover inovação --e, portanto, prosperidade e poder.


São importantes lições para candidatos a "pátria educadora".

Folha de S.Paulo, 3/4/2015

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