17 de novembro de 2014

O ônus da violência


EDITORIAIS
editoriais@uol.com.br, Folha de S.Paulo,17/11/2014

Homicídios não só destroem famílias e levam ansiedade à população mas também causam prejuízos bilionários à economia e ao país

Um engano frequente entre estrangeiros que visitam o Brasil está em confundir com mansidão a proverbial cordialidade dos nacionais. Um país com índice de homicídios no patamar de 25,2 casos por grupo de 100 mil habitantes só pode ser classificado como violento --e paga caro por isso.
Surge agora uma cifra para emprestar a objetividade fria dos números ao descalabro no setor de segurança: R$ 258 bilhões, ou 5,4% do PIB brasileiro. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, tal é o custo imposto à nação pelos mais de 50 mil assassinatos praticados a cada ano.
A maior fatia do ônus, R$ 114 bilhões, corresponde à perda de capital humano. As vítimas mais comuns de homicídios são jovens, cuja vida produtiva se vê interrompida logo ao começar, com consequências financeiras graves para os familiares remanescentes.
No cômputo da parcela complementar entram gastos com segurança privada, seguros, sistema hospitalar, prisões e investimentos nas corporações policiais.
Considerados só os investimentos governamentais na área, aplica-se 1,26% do PIB brasileiro. Um percentual semelhante ao despendido nos EUA (1%) e na União Europeia (1,3%), que no entanto ostentam taxas de homicídio muito mais baixas, respectivamente 4,7 e 1,1 casos por 100 mil habitantes.
A conclusão parece inescapável: nosso gasto é ineficiente. Na América do Sul, o Chile destina 0,8% do PIB e tem taxa de 3,1 por 100 mil.
Suscita ainda mais consternação verificar que, no ano passado, 2.212 mortes se deram pelas mãos de policiais. No último quinquênio, conforme o anuário, houve 11.197 vítimas da letalidade das forças de segurança, mais do que mataram em três décadas todas as polícias dos Estados Unidos, com população 60% maior.
Não há como se orgulhar desses indicadores. Nem mesmo quando se observam as diferenças entre as realidades do crime aqui e lá e a violência epidêmica em redutos brasileiros do crime organizado.
Só uma sociedade acossada por décadas de insegurança permite vicejar em seu meio a noção distorcida de que a eficácia policial possa ser mensurada pela quantidade de suspeitos que mata, e não pelo número de investigações que levam à correta identificação dos autores e à condenação pela Justiça.
Nesses quesitos, nossos indicadores são indecentes de tão baixos. E todos pagamos por eles --em vidas, ansiedade e, agora se sabe, centenas de bilhões que teriam muito melhor emprego como investimentos em saúde e educação, cruciais para o desenvolvimento do país pelo que lhe acrescentam, e não pelo que subtraem.

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