27 de novembro de 2014

Piketty em defesa da Educação

27 de novembro de 2014
Em palestra na USP, economista francês destaca a importância de aplicar recursos de uma taxação sobre riqueza na ampliação do acesso ao ensino de qualidade

Fonte: O Globo (RJ)



Para diminuir a desigualdade, é preciso apostar em políticas de valorização do salário mínimo e de inclusão. E uma Educação de qualidade é o principal caminho, já que jovens mais pobres vão para universidades de má qualidade, perpetuando a situação de pobreza, afirmou ontem o economista francês Thomas Piketty a uma plateia de estudantes, durante palestra na Universidade de São Paulo.
- A diminuição de desigualdade de renda depende de políticas de valorização do salário mínimo e de políticas inclusivas. A difusão de Educação de qualidade é o mais importante mecanismo para diminuir a desigualdade de renda - afirmou o autor de "O Capital no século XXI", recém-lançado no Brasil (Intrínseca).
O francês ganhou fama mundial ao mostrar em seu livro o aumento da concentração de renda, uma vez que os ricos, especialmente os herdeiros de grandes fortunas, estão cada vez mais ricos, e os assalariados têm mais dificuldade de ascender socialmente. A solução defendida por ele é uma taxação progressiva da renda e a criação de um imposto sobre grandes fortunas.
Piketty destaca que o uso adequado do dinheiro dessa taxação é essencial, especialmente na Educação. Isso não significa criar Escolas elitistas, mas oferecer boa Educação de forma generalizada.
- Se olharmos a breve história de taxação, veremos que é preciso criar taxações progressivas de renda, fortalecer movimentos trabalhistas, investir em Educação para mudar essa trajetória.
Ao relatar uma conversa recente com Bill Gates, um dos fundadores da gigante Microsoft, o francês arrancou risos da plateia:
- Tive uma discussão muito interessante com Bill Gates. Ele disse: "OK, concordo com tudo o que você diz, mas não quero pagar mais impostos".
Já o economista André Lara Resende, também presente ao evento, sugeriu que a taxação do consumo seria melhor que taxar renda e riqueza. Segundo o francês, esta foi a saída dada por Gates.
- Não tenho problema de que discordem de mim, mas acho muito importante ter esse debate - disse Piketty. - Se nenhuma medida for tomada pelos governos, os países desenvolvidos tendem a ter uma concentração de riqueza semelhante à das oligarquias do século XIX.  

Piketty: "A Educação, sozinha, não reduz a desigualdade"

26 de novembro de 2014
O economista francês disse ontem na USP que são necessários impostos progressivos e boas política salariais para evitar a concentração excessiva

Fonte: Revista Época


Thomas Piketty, o economista mais comentado da atualidade, disse esta tarde, durante um debate na Faculdade de Economia e Administração da USP, que o investimento em educação sozinho não é suficiente para reduzir a desigualdade de renda. "É preciso a ação combinada de um conjunto de fatores", disse o acadêmico francês, autor do livro O capital no século XXI, lançado no Brasil pela editora Intrínseca. "Além do acesso à educação, é importante ter um sistema de impostos progressivos e boas políticas salariais."
Ele usou o exemplo do Brasil para pedir mais transparências dos governos e acesso aos dados sobre os impostos. Mostrou que os estudos da PNAD, realizados com entrevistas a domicílio, mostram uma forte queda da desigualdade, mas que outros estudos, realizados com dados da receita federal, sugerem que os 10% mais ricos concentram mais de 50% da renda nacional - e que esse percentual está subindo acentuadamente, ao contráriodo que diz a PNDA. "Qual é a verdade?", disse Piketty. "A única maneira de descobrir é tendo acesso aos dados dos impostos coletados pelo governo".
Piketty, que chegou ao Brasil na manhã desta quarta-feira, vindo do França, falou em inglês - com forte sotaque francês, pelo qual se desculpou - para um auditório lotado de estudantes, acadêmicos e jornalistas. Ao seu lado, como mediadores, estavam os economistas André Lara Rezende e Paulo Guedes. O encontro, promovido pela editora Intrínseca e por ÉPOCA, foi coordenado pela professora Fernanda Estevan, da Faculdade de Economia e Administração.
Durante 45 minutos, Piketty explicou a essência do seu livro: um estudo sobre o crescimento, renda e propriedade, que envolve 20 países e recua, em alguns casos, até 300 anos. Desse vasto e inédito painel, ele e seu grupo extraíram algumas conclusões.
A primeira é que a distribuição de riqueza e de renda, que havia melhorado acentuadamente entre o fim da Segunda Guerra até o final dos anos 1970, voltou a piorar no mundo inteiro depois disso. Atualmente, ela se encontra nos Estados Unidos em patamares semelhantes aos do final do século XIX, quando os 10% mais ricos da população detinham cerca de 50% da renda.
"Nessa situação, dois terços dos ganhos do crescimento econômico vão para os 10% mais ricos da população", afirma Piketty. "Isso contribui para a fragilidade do sistema social e financeiro."
A segunda conclusão do livro é que o movimento de concentração não será revertido espontaneamente. Piketty afirma que nos EUA as deficiência educacionais (que excluem os mais, pobres das melhores universidades) e desvios nas formas de remuneração das empresas (que, nos altos escalões, são muitos elevados, sem guardar relação com o desempenho) expplicamo aumento da desigualdade de renda.
A grande preocupação dele, entretanto, é com a concentração de riqueza, que está se acentuando por causa dos mecanismos financeiros de remuneração (que permitem que a fortuna de um bilionário cresce 3 ou 4 vezes mais rápido que o crescimento da economia) e da ausência de impostos progressivos sobre o capital financeiro e imobiliário. "Uma pessoa que tenha um apartamento em hipoteca paga o mesmo tipo de imposto que uma pessoa que tenha uma fortuna pessoal de centenas de milhões de dólares", diz Piketty.
Para evitar o retorno ao que ele chama de "sociedades patrimonialistas" do século XIX, que gozavam de baixo crescimento e ofereciam poucas oportunidades de ascensão pessoal, ele propõe a aplicação de impostos progressivos sobre a propriedade, a fortuna e as heranças em todos os países. Isso ajudaria, segundo ele, a evitar a concentração excessiva de privilégios, sem prejudicar o crescimento. "Não precisamos da concentração de renda do século XIX para obter o crescimento no século XXI", diz Piketty.
Paulo Guedes, depois de fazer uma longa defesa da globalização e da redistribuição mundial de riqueza que ela provocou, sugeriu a Piketty que olhasse para a situação mundial do ponto de vista de um novo equilíbrio, e não apenas da perda de renda para a maior parte da população da Europa e dos Estados Unidos. Piketty, depois de elogiar os efeitos positivos da globalização, disse que eles "não justificam qualquer nível de desigualdade". Citou os exemplos da China e da Rússia, onde a desigualdade atingiu níveis alarmantes e pode transformar-se numa grave questão crucial, sobretudo para os jovens.
Quando Lara Resende sugeriu que deveriam ser cobrados impostos sobre o consumo, e não sobre a fortuna, Piketty contou que Bill Gates, o fundador da Microsoft, disse a ele que gostou muito do seu livro, mas que não queria pagar mais impostos. Depois de uma gargalhada no auditório, ele prosseguiu. "Não se pode perguntar aos milionários de que forma eles querem contribuir", diz Piketty. Doar dinheiro a partidos políticos ou a fundações dirigidas por sua própria mulher não é o mesmo que consumo, mas talvez não sejam a melhor aplicação social da riqueza.
Piketty repetiu o que havia dito a ÉPOCA - que nada tem, filosoficamente, contra a desigualdade, desde que ela contribua para o bem comum, sobretudo melhorando a vida da parcela menos favorecida da sociedade. "Não queremos voltar a ser sociedades pobres e igualitárias, como a China dos anos 1970", diz ele. Piketty contou que se dedicou a estudar a desigualdade não por inclinação ideológica ou política, mas por ser uma área vital da economia desde o século XIX, à qual faltavam dados históricos confiáveis.
"Minha conclusão, depois de escrever o livro, é que tanto Marx, que previa a acumulação de riqueza infinita nas mãos de poucos, quanto Simon Kuznet, que previa a distribuição automática de renda pela evolução da economia, estavam errados", diz ele. "Há forças puxando na direção da acumulação e da distribuição. As instituições a nossas escolhas vão determinar qual delas prevalecerá" 

Queda da desigualdade não virá do crescimento, diz Piketty

27 de novembro de 2014
Sistema tributário progressivo, que incida sobre as grandes riquezas, e igualdade de oportunidades de acesso à Educação são mais decisivos para reverter a concentração da renda

Fonte: Valor Econômico (SP)


A redução da desigualdade não virá do crescimento econômico. Um sistema tributário progressivo, que incida sobre as grandes riquezas, e a igualdade de oportunidades de acesso à Educação são mais decisivos para reverter a trajetória de aumento da concentração da renda observada entre os 20 países mais ricos desde a década de 80. Essas ideias são do economista francês Thomas Piketty e marcaram o início, ontem em São Paulo, da etapa brasileira da turnê mundial do livro "O Capital no Século XXI".
No auditório da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), os 310 lugares estavam preenchidos - 150 convidados, entre Professores, economistas de bancos e consultorias, e muitos estudantes. Boa parte dos 800 inscritos não compareceu. Outras cinco salas com projetores, que não foram utilizadas, estavam reservadas para acomodar aqueles que não coubessem no auditório.
Ainda assim, Piketty entrou na sala rodeado de pedidos de dedicatória e câmeras de telefone celular e, pouco antes do início de sua fala, foi deslocado para um lugar reservado para ser "preservado do assédio".
Ao lado dos economistas André Lara Resende e Paulo Guedes, Piketty usou seus 45 minutos - em um inglês marcado pelo sotaque francês - para desenvolver os temas da obra ligados à dinâmica da renda do trabalho e a da renda do capital - que inclui bens, investimentos em propriedade, em ações - nas nações ricas, especialmente nos Estados Unidos, Reino Unido, França e Alemanha.
No caso específico dos EUA, Piketty creditou principalmente à dificuldade de acesso de grande parte da população ao Ensino superior de qualidade o avanço expressivo da desigualdade nos últimos 30 anos.
O economista avaliou como "preocupante" o descompasso entre o ritmo de avanço da renda real das grandes riquezas - entre 6% e 7% ao ano em termos reais, de acordo com dados retirados de rankings da revista "Forbes" - e da renda do trabalho, entre 1% e 2% ao ano. Para ele, a desconcentração de renda não passa necessariamente pelo crescimento econômico. Políticas ativas de redução da desigualdade, que priorizem o acesso universal a uma Educação de qualidade, um sistema tributário progressivo e o desenvolvimento do mercado de trabalho, conseguem desempenhar melhor esse papel.
Em relação ao sistema tributário, Piketty lembrou que países como EUA e Reino Unido taxam atualmente as grandes riquezas em patamares que variam entre 30% e 40%. Os níveis são bastante modestos se comparados àqueles que vigoraram entre os anos 30 e 80 - quando esses países experimentaram uma redução expressiva dos níveis de desigualdade de renda -, em torno de 80%. "E isso não destruiu o capitalismo americano ou britânico", provocou.
O Brasil, afirmou, poderia ser "mais transparente" na divulgação das estatísticas relacionadas ao imposto de renda. A informalidade e a ausência de séries históricas mais longas ainda atrapalham o desenho preciso da realidade brasileira feita sobre as análises estatísticas, mas muitas vezes os pesquisadores esbarram em dificuldades de acessar os dados oficiais, disse o economista.
Com as informações disponíveis atualmente, observou, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostra um nível de concentração e o imposto de renda, outro. "As pesquisas domiciliares são importantes, mas elas precisam ser complementares aos dados dos órgãos de fisco."
 

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