Dois anos e meio de guerra é tempo mais que suficiente para que se inventasse uma saída
Todo o mundo sabe a sensibilidade com que os judeus lidam com a palavra holocausto. Relutam muito em usá-la para outra tragédia que não seja a sua própria, de meados do século passado.
Por isso, ganha especial significado o fato de um judeu ter tratado a guerra civil em curso na Síria como "um holocausto". E não foi um judeu qualquer, mas um membro do Parlamento, o trabalhista Binyamin Ben-Eliezer. Ainda por cima, ex-ministro de Defesa, o que significa que tem experiência em avaliar conflitos, de vez que a história de Israel é uma história de conflitos.
Em entrevista à rádio do Exército, Ben-Eliezer acrescentou que, "se fosse um cidadão sírio, estaria chocado com o silêncio internacional e da Europa". "Não o entendo", completou.
De fato, é incompreensível a passividade da chamada comunidade internacional ante o que ocorre na Síria. O presidente Barack Obama, por exemplo, disse meses atrás que o uso de armas químicas seria ultrapassar o sinal vermelho, o que, em tese, forçaria uma reação.
Ora, 100 mil mortos por armas convencionais já não deveriam bastar como sinal vermelho?
Já não deveria bastar o fato de que agências da ONU anunciaram, na sexta-feira, que o número de crianças forçadas a deixar a Síria alcançou 1 milhão, "um marco vergonhoso", segundo a Unicef? As crianças desalojadas no interior da própria Síria são o dobro, 2 milhões.
Em um país de 23 milhões de habitantes, é muito mais que "um marco vergonhoso". É de fato um holocausto infantil.
O único argumento para que o mundo assista passivamente a um massacre de tais proporções é a dificuldade notória de adotar qualquer ação.
Como escreve Avi Issacharoff, analista de Oriente Médio para o sítio "The Times of Israel", "na Síria não há uma escolha entre bom' e ruim'. O regime de Assad é ruim, mas a oposição aparente é também ruim --talvez até pior no que diz respeito ao Ocidente. Gangues estilo Al Qaeda estão tomando o controle de mais e mais territórios, inclusive de áreas nas grandes cidades do país."
Digamos que seja assim mesmo. Mas já são dois anos e meio de guerra, tempo mais que suficiente para que diplomatas pusessem de pé alguma ideia, uma que fosse, capaz de permitir acabar com a carnificina, sem necessariamente provocar a vitória de um bando ou outro.
Com o "holocausto" infantil em marcha, o ódio marcará mais de uma geração síria, o que torna improvável, para dizer o mínimo, que se possa estabelecer no futuro uma convivência democrática.
Por fim, se razões humanitárias não comovem a comunidade internacional para uma intervenção, que seja pelo menos sensibilizada pela seguinte pregação de Patricia Lewis, diretora de pesquisas sobre segurança internacional da Chatham House, centro britânico de pesquisas:
"Qualquer que seja a verdade sobre quem usou ou não armas químicas no conflito sírio, a grande questão é prevenir o uso maciço e, adicionalmente, tornar seguro o estoque de armas químicas em uma Síria pós-conflito."
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