A Funag, órgão vinculado ao Itamaraty que estuda a memória diplomática, pode ser mais bem aproveitada
Em tese, esse material ajuda o governo brasileiro a montar seu cardápio de opções. Por exemplo, qual a chance de Nicolás Maduro ser derrubado por um golpe do próprio chavismo? Se algo assim ocorrer, qual a melhor reação brasileira?
Hoje, precisamos dessas análises mais que nunca porque nossa trajetória é declinante. Há menos espaço de manobra para erros ou para uma política externa caprichosa.
Um instrumento ainda subaproveitado para aglutinar esse conhecimento é a Fundação Alexandre de Gusmão (Funag), órgão vinculado ao Itamaraty.
Ela promove estudos e preserva a memória diplomática. Conta para isso com um atributo especial: graus de flexibilidade administrativa que o Itamaraty desconhece.
Em 45 anos de história, a Funag teve altos e baixos. Seus melhores momentos são sempre quando o chanceler de plantão faz dela um instrumento para dar agilidade à política externa.
No governo Lula, a Funag foi central na tarefa de comunicar e defender as iniciativas internacionais do presidente. Publicaram-se milhares de textos, patrocinaram-se conferências públicas e fizeram-se cursos para diplomatas estrangeiros.
Em tempos de vacas gordas, porém, há excessos. Publicou-se com dinheiro público literatura de cordel, assim como manuais para concursos públicos que deveriam ser custeados por quem os consome. Na hora de publicar teses de diplomatas, seguiram-se critérios personalistas. E eventos que custaram fortunas produziram resultados modestos. Nesta época de vacas magras, isso precisa mudar.
A Funag tem recursos para fazer excelente trabalho. No primeiro mandato de Dilma, sua média orçamentária anual foi de R$ 16 milhões, com mais de 60 funcionários.
Além de ser mais rica que o mais rico dos departamentos de Relações Internacionais do país, a Funag possui melhor estrutura que alguns dos centros de pensamento mais ativos do planeta. Quase nenhuma chancelaria tem algo assim.
É hora de ajustar o foco de seu trabalho. Não se trata mais de legitimar as escolhas de um presidente hiperativo. Agora, a prioridade é identificar áreas de risco e explorar as melhores opções disponíveis. Precisamos disso para lidar com as dificuldades que vêm pela frente. Ginástica na cela. Nos próximos meses, a Funag deveria concentrar recursos em identificar e estudar os cinco desafios mais complexos com que depara a diplomacia brasileira.
Ela encomendaria dos melhores especialistas do mundo parte dos insumos. Facilitaria o debate entre diplomatas especializados em cada área, independentemente de sua lotação ou antiguidade. Convidaria funcionários-chave da alta administração federal para consultas. Tudo seria feito de modo reservado, pois sem isso ninguém participa.
A diplomacia brasileira nunca fez algo assim. A conjuntura para começar é esta.
Folha de S.Paulo, 4/2/2015
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