Autocrítica marca discurso de brasileiros no maior evento literário do mundo, encerrado ontem
Vendas de direitos de autorais para o exterior cresce de R$ 1,1 milhão para cerca de R$ 2,6 milhões em dois anos
O Brasil que encerrou ontem sua participação como país convidado da Feira do Livro de Frankfurt deixou uma imagem bem diferente da sugerida pelo semanário alemão "Die Zeit". Na capa de sua edição de setembro, a revista estampou um papagaio verde, amarelo e azul bicando um marcador de livro.
"Nos últimos dias, foram destruídos muitos clichês e quebrados estereótipos sobre o Brasil, que se mostrou um país angustiado, mas que segue em frente", disse, na cerimônia de encerramento, o diretor da feira, Juergen Boos.
Com investimento total de R$ 18,46 milhões do governo federal, o país organizou dezenas de eventos culturais na cidade e levou ao maior evento editorial do mundo um time de 65 autores, sob curadoria de Manuel da Costa Pinto e Antonio Martinelli.
A delegação brasileira incluiu nomes conhecidos há décadas pelo público alemão, como João Ubaldo Ribeiro e Ignácio de Loyola Brandão, e gerações mais jovens, cujos títulos recentes tiveram destaque nas livrarias locais, como Paulo Lins e Daniel Galera.
Mas os escritores que fizeram mais eco foram os que aproveitaram o palanque literário para desabafos políticos. Na terça, o discurso de abertura de Luiz Ruffato, que dividiu a honra com Ana Maria Machado, tirou o foco da desistência de Paulo Coelho, que ameaçava se tornar um tema central.
Ao descrever problemas do país, do assassinato de índios à atual superlotação carcerária, a fala foi lembrada em diversas mesas da programação brasileira e na imprensa local.
"O que estamos tentando não é falar mal, é falar mais", disse a antropóloga Lilia Moritz Schwarcz, questionada se não era negativo um escritor criticar o país no exterior.
Outros debates tiveram pouca ressonância na Alemanha, mas repercutiram no Brasil, como as críticas de Laurentino Gomes e de Ruy Castro ao grupo de músicos brasileiros que defende a necessidade de autorização prévia para biografias.
Só nos dois últimos dias, quando a feira voltada a editores foi aberta ao público, as conversas no pavilhão brasileiro ficaram superlotadas, com gente sentada no chão.
Todo em papelão, em homenagem ao livro impresso, o espaço, que custou R$ 4,9 milhões, com cenografia de Daniela Thomas e Felipe Tassara, serviu de ponto de encontro com suas redes e almofadas, mas também recebeu críticas. O "Frankfurter Allgemeine Zeitung", maior jornal da cidade, o considerou "nada espetacular ou surpreendente".
No estande de 700 m² das editoras brasileiras predominaram pequenos editores, com poucas reuniões. Das 168 editoras presentes no estande, 57 ganharam o espaço expositivo da Fundação Biblioteca Nacional, em programa que buscava estimular a "bibliodiversidade".
Na entrevista de encerramento, a presidente da Câmara Brasileira do Livro, Karine Pansa, comemorava o aumento de vendas de direitos autorais para o exterior, de R$ 1,1 milhão, em 2010, para R$ 2,6 milhões, em 2012.
A programação paralela foi elogiada pelo presidente da feira. "Nunca um país homenageado havia mobilizado todas as instituições culturais da cidade, de cinema, música, arquitetura, design", disse Boos. No total foram realizados 651 eventos ligados ao Brasil, dos quais 226 foram promovidos pelo governo.
O diretor, no entanto, lamentou dificuldades impostas por três mudanças de ministros da Cultura desde o anúncio do Brasil como homenageado, em 2010.
Folha de S.Paulo, 14/10/2013
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