28 de outubro de 2014

Hora de ler X hora de jogar: livros o e-books interactivos


Especialistas questionam se e-books interativos valem como estímulo ao desenvolvimento da linguagem como os livros comuns
DOUGLAS QUENQUADO "NEW YORK TIMES", 28/10/2014
Clifford, o Gigante Cão Vermelho, fica fabuloso num iPad. Basta tocar a tela para ouvi-lo ofegar enquanto aparece um caminhão azul em alta velocidade. "Vai lá, caminhão, vai!", diz o narrador.
Mas isso vale como tempo de contar histórias para seu filho? Ou é simplesmente um jeito de manter seu bebê distraído diante de uma telinha?
Em junho, a Academia Americana de Pediatria aconselhou médicos a lembrar aos pais, em cada consulta, que devem ler para seus filhos desde que eles nascem.
Por outro lado, a academia recomenda que crianças com menos de dois anos não devem passar tempo nenhum vendo TV ou outras telas.
Hoje, quando a leitura cada vez mais envolve "folhear" páginas eletrônicas, que conselho os pais deveriam ouvir?
Para os pesquisadores, a resposta não é clara. E-books não são usados há tempo suficiente para permitir estudos abrangentes sobre seus efeitos sobre a aprendizagem.
Mas trabalhos recentes já sugerem que ler para uma criança com um aparelho eletrônico prejudica a dinâmica que impulsiona o desenvolvimento da linguagem.
"Há muitas interações quando você lê um livro com seu filho. Vocês viram as páginas, apontam para ilustrações, conversam. Tudo isso se perde um pouco quando se usa um e-book", disse a pediatra Pamela High, que redigiu a recomendação da associação de médicos.
Num estudo de 2013, pesquisadores constataram que crianças de três a cinco anos cujos pais liam histórias em e-books tiveram compreensão de leitura menor do que as que usaram livros, talvez porque passaram mais tempo focados sobre o aparelho do que sobre a história.
"Os pais estavam pondo as mãos sobre as mãos de seus filhos e dizendo espere, não aperte o botão ainda, termine isto primeiro'", diz Julia Parish-Morris, psicóloga do Hospital Infantil de Filadélfia, autora do estudo. Já os que usavam livro convencional tinham mais chance de discutir a história e sua relação com a vida da criança, crucial para o desenvolvimento linguístico.
Mas há cada vez menos e-books infantis que podem ser descritos só como livros. A tecnologia evolui, e editoras acrescentam elementos que incentivam desvios.
"Se o livro tem elementos que atrapalham a conversa, como um jogo no meio da história, ele não oferece as mesmas vantagens", diz Kathy Hirsh-Pasek, psicóloga.
Editores de e-books consideram a interatividade uma vantagem educativa. Muitos dos elementos oferecidos por e-books, como o latido do cão Clifford, ajudam a aprender linguagem, segundo eles.
Mas, segundo Kyle Snow, da Associação Nacional para a Educação de Crianças Pequenas, e-books podem induzir os pais a abdicarem de sua responsabilidade educacional. "O e-book pode virar a babá eletrônica' desta geração. Não queremos que os pais digam não preciso virar páginas e dizer a meu filho como ler a palavra, porque meu iPad pode fazer isso'."
Mas pais podem achar difícil deixar de usar os tablets.
Claudia Raleigh tem três filhos com menos de seis anos, e precisa distrair Teddy, 2, durante as aulas de natação de sua irmã. "É difícil ficar esperando com uma criança de dois anos. Por isso o apresentei ao iPad. É o jeito de impedir que ele se jogue na piscina. Para mim, o iPad é um salva-vidas", ri. "Leio para meus filhos desde eles nasceram. Não vou me culpar porque eles passam um pouco de tempo olhando para a tela."
Embora as telinhas tenham chegado para ficar, é pouco provável que livros à moda antiga desapareçam. Os pais notam que os livros de papel carregam um componente emocional que não parece existir nos e-books.
"Lilly tem um iPad e usa apps educativos", contou Amy Reid, publicitária, falando de sua filha de quatro anos. "Mas, para ela, nada se compara à emoção de escolher seu próprio livro na biblioteca e trazê-lo para casa."

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