15 de janeiro de 2015
"Somos um país desigual também em Educação, entre outros motivos, porque não tivemos a coragem ainda de definir um currículo nacional.", afirma Claudia Costin
Fonte: O Estado de S. Paulo (SP)
Findo o processo eleitoral e definido o ministro da Educação, o Brasil precisa agora pisar no acelerador. Estamos atrasados na agenda educacional e, embora passos importantes tenham sido dados, há correções de rumo a se fazer e temos de, certamente, enfrentar sem medo a necessidade de transformar mais rapidamente a nossa ainda precária Educação.
Nunca é demais lembrar: somos a sétima economia do mundo e estamos em 57.º lugar no ranking do Pisa, teste internacional da Educação aplicado a jovens de 15 anos, em 2012, entre 65 países participantes. Assim, para dar um sentido de urgência vale a pena refletir sobre os desafios não para a década, e sim para 2015, para começar. Não por isso, é bom lembrar que 2015 é, emblematicamente, um ano em que teremos uma nova edição do Pisa.
O novo ministro apresenta credenciais relevantes. Desenvolveu com sucesso em seu Estado uma proposta séria de Alfabetização, a Alfabetização na Idade Certa, que inspirou iniciativa nacional equivalente. Melhorou, de forma importante, o Índice de Desenvolvimento da Educação básica (Ideb) de seu Estado, tanto no 5.º quanto no 9.º anos. Abordou em seu discurso de posse, ao definir prioridades, a urgente reforma do Ensino médio, o que faz muito sentido.
Mas há certamente muito ainda a fazer.
Em primeiro lugar, há a questão do acesso à Escola. Finalmente revolvemos a questão da entrada das crianças na Escola, mas muitas não permanecem. A taxa de abandono, especialmente a partir do 6.º ano, é alta para um país no estágio de desenvolvimento em que nos encontramos. Além disso, a aprendizagem, como vimos acima, deixa a desejar. Na última Prova Brasil os resultados mostraram uma piora tanto no 9.º ano do Ensino fundamental quanto no 3.º ano do Ensino médio.
Para mudar esse quadro muita coisa pode ser feita. Repensar a formação inicial do Professor é certamente uma delas. Nos países com bons sistemas educacionais, a prática de sala de aula e as didáticas específicas são valorizadas no currículo das universidades e a observação de aulas de colegas mais experientes e mentoria são estratégias importantes na formação continuada. O Pibid, um programa de iniciação à docência, que oferece bolsas para que Alunos de licenciatura exerçam atividades pedagógicas em Escolas públicas, é um bom começo, mas aí também precisamos avançar mais.
É preciso definir um currículo nacional. Como podemos assegurar uma melhora de qualidade e equidade na aprendizagem dos Alunos se não definimos o que eles devem aprender? Não há no Brasil uma especificação clara das expectativas de aprendizagem, apesar de isso estar prescrito no artigo 210 da Constituição da República. "Como consequência", diz Francisco Soares, presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e uma das melhores cabeças em avaliação educacional do País, "cada rede, cada Escola escolhe o que seus Alunos irão aprender. Infelizmente essas escolhas, muito frequentemente, contemplam apenas parte dos conhecimentos e habilidades esperados. Esta é uma grande explicação para as diferenças educacionais".
Somos um país desigual também em Educação, entre outros motivos, porque não tivemos a coragem ainda de definir um currículo nacional. Com isso prejudicamos o acesso ao direito à Educação. Todos os países que garantem o direito à Educação têm uma especificação clara do que se espera que os Alunos aprendam, o que é fundamental para garantir equidade e uma definição mais precisa da qualidade que se quer alcançar. Há dois anos começaram as primeiras conversas sobre a chamada Base Curricular Nacional, mas os avanços ainda são lentos. Esperemos que em 2015 se conclua a sua elaboração. O Brasil não pode mais esperar.
No Ensino médio é preciso definir trajetórias alternativas, aos moldes do que fizeram alguns países, como a Alemanha ou a Polônia. Todos os caminhos hoje levam à universidade, numa formação frágil e enciclopédica. Tenta-se cobrir disciplinas demais com carga horária de menos, muitas vezes com aulas noturnas (e jornadas menores ainda) para jovens de apenas 14 a 16 anos.
É importante também reforçar o Ensino médio profissionalizante, em associação com o Pronatec ou os institutos técnicos estaduais e federais, e definir um currículo mais centrado em competências e menos em disciplinas estanques, algo que vem sendo tentado, mas precisa ser acelerado e não ser restrito a algumas Escolas piloto.
Finalmente, quando se fala de Ensino médio e mesmo do chamado fundamental II, é importante combinar excelência acadêmica com uma proposta de Escola pensada para adolescentes, onde eles podem ser tratados como protagonistas do seu processo Escolar - como o que ocorre na Finlândia e em alguns outros países - e da sua vida futura.
Um dos grandes avanços verificados no País é o da Educação infantil. Pouco se tem falado nisso, mas nos últimos anos conseguimos colocar um grande número de crianças na Pré-Escola pública e ampliamos de forma importante as vagas em Creches. Ainda falta dar prioridade, nessa modalidade, às crianças que mais podem beneficiar-se dessa atenção, que são as que estão abaixo da linha da pobreza e entras elas, as crianças com deficiência. Contar com Professores qualificados para a Educação infantil integra a agenda das urgências educacionais.
Há muito o que fazer e a consolidação dessas tarefas levará, é claro, bem mais do que um ano, mas há que ter a coragem, a ousadia e a liderança para começar. O ministro mostrou coragem para fazê-lo em seu Estado, como mostram os avanços logrados na Alfabetização e no Ideb, agora cumpre fazê-lo no País, tarefa bem mais ampla e complexa. Mas o Brasil certamente merece!
*Claudia Costin é diretora global de Educação do Banco Mundial
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