Em reunião, dirigente defendeu contrapartidas de graduados ao ensino gratuito recebido na universidade
FÁBIO TAKAHASHI
Um tema tabu no meio acadêmico brasileiro foi colocado em discussão pelo reitor da USP, Marco Antonio Zago: a imposição de um "serviço à sociedade" aos formados na universidade, como contrapartida pelo ensino recebido em instituição pública.
Zago apresentou a proposta em reunião do Conselho Universitário da USP em novembro, mas a ata só foi divulgada recentemente.
Neste momento, a universidade recebe propostas de seus membros para alterar seu estatuto.
Para o reitor, essa é a oportunidade de analisar aspectos de financiamento e de gestão, "que exigem mudanças e novo pacto da universidade com a sociedade".
"Não faz parte das propostas da atual reitoria considerar o pagamento por parte dos alunos mais abastados, mas a compensação pela oportunidade de estudar em uma universidade pública, garantindo uma vantagem competitiva na vida profissional, poderia ser considerada para todos os ex-alunos da USP na forma de serviços à sociedade", afirmou Zago durante a reunião.
Ele não detalhou como a medida poderia ser aplicada --se, por exemplo, será exigido que um médico trabalhe por um período no SUS ou que um advogado defenda pessoas de baixa renda.
A Folha questionou o reitor sobre a ideia desde terça (13), mas não obteve resposta até a conclusão desta edição.
'FAZER O MELHOR'
No Brasil, os formados em universidades públicas não são obrigados a dar contrapartida por terem estudado gratuitamente.
Durante a reunião, o reitor afirmou que "a mais bem-sucedida universidade da América Latina não pode promover uma mudança de estrutura olhando apenas para suas congêneres nacionais".
Anualmente, cerca de 7.500 estudantes se formam na graduação da USP. Em 2013, foram 428 em direito (Largo São Francisco); 218 em administração (FEA); e 164 na medicina (Pinheiros).
Zago destacou que a universidade recebe do Estado o equivalente a R$ 47 mil por ano por aluno --e que precisa discutir se está fazendo "o máximo e o melhor para atender a sociedade".
Aspectos como serviço social obrigatório aos formados em universidades públicas (que impõe o trabalho por prazo determinado) ou pagamento de imposto mais alto a esses egressos têm sido discutidos fora da universidade.
Há no Congresso, por exemplo, projetos em tramitação com esse teor.
DIFICULDADE
Três ex-dirigentes de universidades públicas paulistas que conversaram com aFolha se disseram surpresos com o fato de o tema ter sido levantado pelo próprio reitor.
Para eles, a chance de a proposta prosperar é pequena, tanto pelo perfil dos acadêmicos, tido como "conservador", como pela dificuldades na execução da ideia.
Também há dúvidas jurídicas sobre a mudança.
"Não vejo nada de mais em se pedir um retorno em alguma ação social daqueles que estudam ou estudaram em instituições de ensino superior públicas e gratuitas", afirma o ex-reitor da USP Roberto Lobo.
"O problema é como verificar a atividade e o que aconteceria com quem se recusar [a fazê-la] ou abandoná-la."
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