RIO DE JANEIRO - "Cadeia não conserta ninguém", disse anteontem Marco Aurélio Mello. Proferida por um ministro do Supremo Tribunal Federal, a frase deveria balizar o debate sobre redução da maioridade penal. Mas não vai por um simples motivo: boa parte dos que apoiam a proposta não quer mesmo consertar ninguém.
Se quisessem, poderiam estar nas ruas protestando contra o permanente massacre de adolescentes brasileiros. De acordo com dados do Unicef destacados por Eliane Brum no site do jornal "El País", o Brasil é o segundo país em número de homicídios de adolescentes, atrás apenas da Nigéria: de 2006 a 2012, foram assassinadas mais de 33 mil pessoas que tinham entre 12 e 18 anos.
Tentemos imaginar a cena: 33 mil garotos sendo mortos. Em apenas seis anos. E ninguém acha isso estranho. Mas querem mudar as leis. Alegam que assim vão reduzir a criminalidade no país.
Pois vejamos mais dois dados do Unicef: dos 21 milhões de adolescentes do país, menos de 0,1% já matou alguém; e dos cerca de 50 mil homicídios que são cometidos anualmente no Brasil (outra informação que não leva ninguém a protestar), 1% tem autores com menos de 18 anos --ou seja, cerca de 500.
Querem transformar exceção em regra. Acham que, encarcerando mais, maior segurança terão. Porém, o Brasil já tem a quarta população carcerária do mundo, com mais de 500 mil pessoas. E 70% dos que saem da prisão reincidem no crime, até para pagar a proteção que receberam de organizações como o PCC e o Comando Vermelho --que surgiram nas penitenciárias, não nas ruas.
A taxa de reincidência dos "menores infratores" é em torno de 20%. E as instituições em que vivem já são, na prática, presídios. Mas os marmanjos querem lhes dar penas de adultos. Conseguirão aumentar a reincidência. E o ódio.
Folha de S.Paulo, 3/4/2015
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