26 de dezembro de 2011

Brasil: Escola pública do país entra na onda dos tablets



Mais de 50 milhões de tablets deverão ser vendidos até o fim do ano em todo o mundo, segundo projeções dos fabricantes. A fatia do Brasil nesse bolo é de 100 mil unidades vendidas apenas no varejo. E a onda dos pequenos computadores em forma de prancheta já avança sobre as escolas públicas do país. O Ministério da Educação (MEC) estuda há um ano a possibilidade de usar o equipamento em sala de aula e está com um edital pronto para a aquisição de 300 mil unidades.
As empresas de tecnologia vão precisar adaptar seus modelos às exigências do governo federal: os tablets educacionais deverão ter maior resistência do que os produtos oferecidos hoje no mercado, telas de dois tamanhos (entre 7 e 11 polegadas) e diferentes características em relação à capacidade de armazenamento de dados e funções de interatividade, como softwares gráficos e de animação, áudio, vídeo e internet.
O preço unitário do tablet no edital, que pode ser publicado ainda este ano, é um mistério, mas o diretor de tecnologia do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), José Guilherme Moreira Ribeiro, contou ao Valor que o poder de compra em escala do governo pode reduzir o custo em até 40%.
Não posso falar em valores sob o risco de ancorar o preço da disputa. Os tablets vendidos hoje no varejo brasileiro variam de R$ 500 a R$ 2,3 mil. Todas as empresas de tablets vieram ao FNDE, todas estão interessadas, e dissemos que os preços que elas praticam não são os preços que o MEC quer pagar, relata Moreira Ribeiro.
O governo de Pernambuco, sozinho, está licitando 170 mil tablets para serem usados por estudantes do ensino médio a partir de 2012. O projeto Aluno Conectado prevê investimentos de cerca de R$ 170 milhões, o que levaria o custo unitário do equipamento a ser cotado a R$ 1 mil. É um valor alto, mas com a concorrência o preço cai. Nosso orçamento inclui a distribuição e a organização da infraestrutura das 400 escolas beneficiadas, explica Anderson Gomes, secretário Estadual de Educação de Pernambuco.
No setor privado, onde o uso de tablets na educação é mais difundido, os preços estão bem abaixo de R$ 1 mil. A Universidade Estácio de Sá paga até R$ 450 por equipamento. Este ano, a instituição distribuiu 5 mil tablets para estudantes de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Para 2012, planeja entregar 18 mil unidades para os novos alunos dos cursos de engenharia, arquitetura, direito, gastronomia, hotelaria e administração. A expectativa é que, nos próximos cinco anos, todos os seus alunos - presentes em 17 Estados e 36 cidades - tenham o aparelho.
O diretor de marketing da universidade, Pedro Graça, explica que os tablets, gratuitos para os alunos, se pagam com a economia feita com o fim da necessidade de impressão e distribuição do material didático fornecido pela Estácio. [O conteúdo] Fica tudo dentro do dispositivo, que vem com biblioteca virtual, com mais de 1.600 obras, vídeo-aulas, projeto pedagógico do curso, planos de aulas, rede social e secretaria virtual.
Formuladores e gestores de políticas educacionais avaliam que o tablet pode trazer importantes mudanças na dinâmica do processo pedagógico nas escolas e avanços de aprendizagem. Eles contam que o aparelho possibilita de forma ilimitada acessar, criar e compartilhar conteúdos, fotos, gráficos e vídeos. Também ajuda a construir um ambiente de interatividade, com conexão à internet.
Já temos um bom arsenal de conteúdo didático disponível para os tablets. São cerca de 15 mil objetos educacionais à disposição do professor, que podem transformar a maneira de dar aula e deixar o aluno mais motivado, avalia o diretor de formulação de conteúdos educacionais da Secretaria de Educação Básica do MEC, Sérgio Gotti, para quem o maior desafio para que o dispositivo tenha eficácia é a preparação e o envolvimento do professor com a nova tecnologia, além de condições apropriadas para o uso do aparelho na escola.
Embora não existam certezas sobre a contribuição desse tipo de tecnologia com a melhora do aprendizado, a inserção dos tablets no universo educacional mobiliza especialistas no mundo inteiro. Um recente levantamento feito nos Estados Unidos revelou que até 2016 as escolas do país terão mais tablets por alunos do que laptops ou computadores desktop.
Longe de ser uma panaceia para os problemas de qualidade no ensino, considera-se que as principais vantagens do uso do dispositivo são mobilidade, interação de conteúdos e ambiente convidativo para a leitura. O tablet educacional deve vir recheado de conteúdo e serve não só para ser usado em sala de aula. No ônibus ou em casa, o aluno pode rever um assunto antes da aula. Além disso, tem a interface com áudio, vídeo, internet, um universo ilimitado de informação, diz Pedro Graça, da Estácio.
Independentemente da febre dos tablets, a professora Roseli de Deus Lopes, do Laboratório de Sistemas Integráveis da Universidade de São Paulo (USP), lembra que todas as ferramentas tecnológicas deixaram de ser elementos externos do processo de aprendizagem. Mas o aproveitamento desses meios na sala de aula ainda não é satisfatório.
As crianças estão com celular na mão, não importa a classe social. O computador, seja tablet, laptop, é um meio, como a caneta, o quadro negro, o livro. A questão é que a tecnologia evolui mais rapidamente do que a educação é capaz de absorver, por isso ainda não conseguimos adotar essas tecnologias adequadamente nas escolas. Segundo Roseli, há muito imediatismo na execução dessas políticas por parte do poder público e ausência de estratégia pedagógica.
A opinião é compartilhada por Luciana Allan, diretora técnica do Instituto Crescer. Agora a moda é tablet; eles dizem 'vamos investir' e despejam os aparelhos. Faltam projetos mais bem definidos, com metas, acompanhamento, monitoramento. Um projeto que não fique somente focado na aquisição de equipamentos, argumenta Luciana.

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