7 de novembro de 2016

Antonio Gois: O xadrez das ocupações

POR ANTÔNIO GOIS
Ao enviar sua proposta de reforma do ensino médio via medida provisória, o MEC assumiu um alto risco. Num ambiente tão polarizado, era previsível que a reação por parte dos grupos que discordam da MP e fazem oposição ao governo levaria a reações como a ocupação de escolas. O ministério e os governadores aliados de Temer apostam no desgaste do movimento, ainda mais depois que o próprio MEC adiou a realização do Enem em colégios ocupados. Mas o gesto pode também ter efeito oposto, caso as ocupações aumentem após o exame.
Como sempre, qualquer movimento mais agressivo de um lado ou de outro pode inflamar ou matar a mobilização. Reagir às ocupações com truculência policial ou mesmo autorizar, como fez um juiz de Brasília, uso de técnicas que se assemelham à tortura para forçar a desocupação são atos que repetem o script de junho de 2013, quando a polícia paulista fez um favor à causa dos manifestantes e incentivou uma multidão a ir às ruas em todo o país. Mas também de junho de 2013 há a lembrança do quanto pode ser autodestrutiva para qualquer movimento social a ação de Blackblocs e afins.
Ocupar reitorias é uma tática já bastante conhecida do movimento estudantil universitário. No caso dos secundaristas, porém, o movimento, inspirado no Chile, surpreendeu por sua escala e organização quando o governo de São Paulo tentou impor no ano passado, de forma desastrosa, uma política de reorganização de escolas, prevendo inclusive o fechamento de algumas delas. Achar que era possível fazer uma mudança tão estrutural no sistema sem ouvir os estudantes foi uma atitude típica de quem ainda guarda na memória um modelo de ensino em que aos alunos cabe apenas o papel de ouvintes. O governo paulista teve que recuar, o secretário de educação caiu, e os estudantes saíram vitoriosos pouco mais de um mês após terem iniciado o movimento.   
No caso das ocupações atuais, porém, por enquanto nada indica que os estudantes secundaristas vão conseguir derrubar seus dois alvos principais: a MP do ensino médio e a PEC que limita gastos públicos. O movimento terá que dar mostras de que consegue evitar o desgaste de uma mobilização mais longa. Não é uma tarefa fácil. Basta lembrar dos resultados de greves de professores que se arrastaram por muito tempo recentemente, caso, por exemplo, da paralisação na rede estadual do Rio.
Um sinal de trégua poderia ter aparecido na semana passada, se prosperassem as negociações no Congresso para que o MEC retirasse de tramitação sua MP, e voltasse a debater a reforma do ensino médio vai projeto de lei, um instrumento mais lento, mas sem dúvida muito mais democrático e compatível com uma mudança tão estrutural na Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Mas nada avançou.
O MEC, ao criticar as ocupações, argumenta que está defendendo o direito dos alunos que estão perdendo aulas ou provas. Os jovens secundaristas que ocupam as escolas também argumentam lutar por uma educação pública de qualidade, em favor de milhões de estudantes de escolas públicas. Certo apenas é que esses últimos serão, como sempre, os maiores prejudicados se não houver mais diálogo e o impasse persistir por muito tempo.

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