31 de julho de 2012

Universidade: Missão superior


Editorial, Folha de S.Paulo, 31/7/2012
Universidades federais perdem o foco com greves e cotas, quando deveriam dedicar-se a forjar uma elite de docentes para o país
Sérias ameaças rondam as universidade federais no Brasil. Além de uma greve abusiva, que há mais de dois meses prejudica meio milhão de estudantes, paira sobre elas um projeto autoritário sobre cotas raciais que está para ser aprovado no Senado Federal -e essas são só as ameaças mais urgentes.
O projeto de lei 180/2008 tem origem na Câmara dos Deputados. Reserva metade das vagas das instituições federais de ensino superior para quem tenha cursado todo o ensino médio na rede pública e prescreve que sejam atribuídas a "autodeclarados negros, pardos e indígenas" no mínimo na proporção recenseada pelo IBGE.
Levantamento desta Folha mostrou que mais de 52 mil vagas nas federais já se destinam a cotistas, de um total de cerca de 240 mil ingressantes a cada ano. Para atingir a metade, portanto, esse contingente de vagas reservadas precisaria mais que dobrar.
A proposta tem boa chance de aprovação, pois conta com a simpatia do governo federal; se não sofrer emendas no Senado, segue direto para sanção presidencial. Seria um enrijecimento adicional das já esclerosadas universidades federais, que veriam assim mais um naco de sua autonomia acadêmica sacrificado no altar dos modismos politicamente corretos.
O problema não é o recurso a cotas, que, usadas com parcimônia, podem ser instrumento legítimo de inclusão social na universidade (a Folha defende apenas o critério socioeconômico e recusa o componente racial). Errado é destinar número tão grande de vagas com base em algo diverso da capacidade acadêmica do candidato.
Isso decerto não contribuirá para estancar a perda progressiva de qualidade do ensino superior, que passa no Brasil por um processo acelerado de expansão.
As federais, além disso, sofrem o assédio de grupos sindicais e partidários mais interessados em impor-lhes a agenda corporativa de funcionários e docentes e as fantasias ideológicas de estudantes. Perdem prestígio para as poucas universidades brasileiras, como as estaduais paulistas, que conseguem manter alguma qualidade e frequentar listas internacionais de excelência em ensino e pesquisa, e algumas privadas.
Não fossem essas distrações e a falta de um projeto claro para elas da parte do governo federal, as federais poderiam dedicar-se a construir para si um papel de maior relevância no sistema universitário nacional. Na impossibilidade de todas brilharem no ramo ultracompetitivo da pesquisa de ponta, deveriam escolher a missão -não menos nobre- de formar o exército de excelentes professores universitários de que o país tanto necessita.

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